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Diogo Schelp

Alta de contágio em SP coincidiu com relaxamento de cuidados e com eleições

 Movimentação intensa de consumidores no entorno da Rua 25 de Março, na região central da cidade de São Paulo, neste sábado (12), em meio ao aumento massivo de casos de coronavírus em todo o país. - ROBERTO COSTA/CÓDIGO19/ESTADÃO CONTEÚDO
Movimentação intensa de consumidores no entorno da Rua 25 de Março, na região central da cidade de São Paulo, neste sábado (12), em meio ao aumento massivo de casos de coronavírus em todo o país. Imagem: ROBERTO COSTA/CÓDIGO19/ESTADÃO CONTEÚDO

Colunista do UOL

17/12/2020 04h00

Nos últimos três meses, o município de São Paulo registrou um aumento significativo na taxa de transmissão do novo coronavírus, indica um gráfico produzido com exclusividade para a coluna.

O período coincide com a campanha eleitoral municipal deste ano — contando a partir do dia 27 de setembro, quando começou a propaganda gratuita, até os dias seguintes ao primeiro turno, em 15 de novembro — e com o relaxamento da população em relação aos protocolos sanitários (uso de máscaras, por exemplo) e ao retorno das atividades sociais.

O gráfico, elaborado pelo físico Fernando Nascimento, consultor da Fundação Instituto de Administração (FIA) e professor de métodos quantitativos do ESE - Escola Superior de Empreendedorismo do Sebrae-SP, demonstra a evolução dos registros de pacientes com covid-19 e a estimativa da data em que as ocorreram as contaminações.

A partir desses dados, Nascimento obteve a taxa de contágio, que indica o número de pessoas para as quais cada paciente contaminado, em média, transmite o vírus.

Quando a taxa média de transmissão (Rt), expressa pela linha vermelha, é igual a 1, por exemplo, significa que cada paciente com covid-19 contamina, em média, uma nova pessoa. Quando a curva da taxa de contágio cai abaixo de 1, portanto, tem-se uma desaceleração da epidemia.

Gráfico taxa de contágio - Fernando Nascimento/Divulgação/UOL - Fernando Nascimento/Divulgação/UOL
Imagem: Fernando Nascimento/Divulgação/UOL

A análise do gráfico permite observar que entre o início de agosto até final de setembro a taxa de contágio permaneceu quase sempre abaixo de 1. Essa foi a fase de maior desaceleração da pandemia em São Paulo. A partir daí, a taxa de transmissão volta a oscilar com maior frequência e com picos mais altos acima de 1, o que indica uma aceleração no número de novos casos.

Os pequenos círculos amarelos no gráfico indicam as datas do primeiro e do segundo turno das eleições (a estimativa de contágio para o segundo turno ainda não está disponível). No dia 15 de novembro, portanto, quando os paulistas compareceram pela primeira vez nas urnas, este ano, a média de transmissão era de um novo infectado para cada pessoa já contaminada.

A coincidência de datas não significa, porém, que os atos de campanha — muitos dos quais foram marcados por aglomerações e descuidos com os protocolos sanitários — ou a mobilização para a votação foram os únicos ou mesmo os principais fatores da alta nos índices de contágio. Outras variáveis tiveram peso ainda maior.

Segundo o infectologista Alexandre Naime Barbosa, da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e da Sociedade Brasileira de Infectologia, o que mais impactou no aumento na taxa de transmissão da doença foi o comportamento geral da população.

"As campanhas eleitorais podem ter contribuído pontualmente em alguns locais ou momentos, mas o principal motivo foi que nesse período as pessoas passaram a viajar mais, a socializar em encontros presenciais e a deixar de evitar aglomerações", diz Barbosa.

Ou seja, uma parcela significativa da população foi além do que permitia a retomada de algumas atividades econômicas e sociais e abandonou regras básicas, como usar máscara, evitar aglomerações e dispensar encontros com muitas pessoas.

"Esse fenômeno reflete uma cultura de baixa aderência a regras", diz o infectologista.