Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
O despachante do sistema contra Moro
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"Disparar mentiras, distorções e injustiças contra alguém e depois acusar quem as refuta de torcedor ou ideólogo é apenas dobrar a vigarice."
Foi o que escrevi no Twitter em 11 de outubro de 2017.
O método praticado por porta-vozes do sistema contra jornalistas independentes, que refutam seus ataques a rivais temidos, é o mesmo usado por Lucas Furtado contra Júlio Marcelo de Oliveira, que refuta seus ataques a Sergio Moro.
O subprocurador confessou a O Globo que o pedido de arquivamento da investigação do Tribunal de Contas da União sobre o contrato entre o ex-juiz e a consultoria Alvarez & Marsal foi uma "estratégia" para tirar do caso o procurador do Ministério Público de Contas, porque Oliveira "queria entrar para blindar o Moro e toda a Lava Jato". O objetivo de Furtado é que o ministro Bruno Dantas use seu pedido para dar origem a um novo inquérito, no qual o procurador, sorteado pelo tribunal, não poderia mais atuar.
Com isso, o subprocurador ficaria mais à vontade para invadir competências, como fez ao pedir o bloqueio de bens do ex-juiz com base em mera e anacrônica hipótese de sonegação fiscal, esta que caberia à Receita Federal investigar, mas que ele aventou antes não só da investigação, mas do decurso do prazo para a declaração de rendimentos de Moro, tanto nos EUA quanto no Brasil. O apreço de Oliveira por esclarecer fatos reais passados atrapalha o de Furtado por vislumbrar crimes imaginários futuros. O subprocurador deveria ver mais "Questão de honra" e menos "Minority Report".
A defesa do ex-juiz, feita pelo escritório do advogado Gustavo Guedes, apontou as "tentativas de constrangimento públicas patrocinadas" por Furtado e a falta de competência do TCU para "imiscuir-se em relações contratuais privadas", identificar eventual sonegação e fazer pedido de medida cautelar "lastreado em uma possibilidade não comprovada e sequer vislumbrada de modo indiciário, pois não há nos autos a evidência de qualquer irregularidade", "tampouco um indicativo mínimo de valor".
Os advogados de Moro ainda citaram decisão do STF "julgando inconstitucional a previsão da decretação de indisponibilidade de bens pelo Poder Público contra os devedores da Fazenda Pública" e também parecer da SeinfraOperações do próprio TCU, que já havia sido endossado por Oliveira: "Em relação à conduta da Alvarez & Marsal Administração Judicial, não compete a esta Corte de Contas analisar o cumprimento dos deveres de fidúcia, lealdade e diligência por parte da empresa. Considerando que não foi demonstrado o ato irregular ou dano ao erário nem o respectivo nexo causal, a Administradora Judicial não está sujeita à jurisdição desta Corte."
Assim como jornalistas independentes têm sua cabeça pedida, sobretudo em rádio e TV, quando se aproxima o período eleitoral, as verdades incômodas trazidas à luz por procuradores livres geram reação não por meio de contestação argumentativa, mas por manobras de censura velada, amparadas pelo expediente de acusar os alvos daquilo que o próprio sistema pratica contra eles, como uma atuação política sem base na realidade.
Como se não bastasse a presença de Dantas em recente jantar pró-Lula, Furtado ainda disse ao Estadão que foi Oliveira quem agiu de modo político ao chamar de "pedaladas fiscais" as irregularidades praticadas durante o governo da também petista Dilma Rousseff. Na verdade, Oliveira distinguiu tecnicamente "pequenos saldos devedores" deixados por governos anteriores junto a bancos públicos federais, sem a finalidade de obtenção de um financiamento forçado, e a omissão sistemática do governo Dilma no envio de bilhões de reais a esses bancos, que suportavam obrigações do Tesouro Nacional com seus próprios recursos, usados como cheque especial.
"Com esse artifício, inédito, ela direcionou esses bilhões para outras despesas com forte impacto eleitoral, como o FIES, que teve sua dotação ampliada de 5 bilhões de reais em 2013 para mais de 12 bilhões em 2014, ano eleitoral, voltando a cair para menos da metade em 2015", disse-me Oliveira em entrevista de abril de 2016, à qual acrescentei, na ocasião, explicações e exemplos didáticos. "As pedaladas de 2015 resultaram do imenso rombo produzido em 2014, com direito a algum agravamento."
No Brasil, o impeachment se dá quando qualquer presidente não tem (mais) uma base de sustentação política disposta a fazer vista grossa a seus crimes de responsabilidade ou comuns, mas não é porque eventualmente permanecem no poder presidentes que incorreram em crimes até piores que presidentes "impichados" não violaram as leis. O procurador do MP de Contas, independentemente do resultado do processo no Congresso Nacional, fez o seu papel de identificar a violação de normas orçamentárias por Dilma, assim como faz agora, atendo-se aos fatos sobre o ex-juiz e a consultoria.
Furtado, ao contrário, sentiu de tal modo a acusação de abuso de poder feita por Moro que precisou recorrer a uma carteirada: "Sou doutor pela Universidade de Salamanca e pós-doutor pela Universidade de Coimbra", disse o subprocurador ao site Metrópoles. "Se fazem tanto barulho é porque têm medo de que esteja no caminho certo." É um reconhecimento involuntário de que não chegou a lugar algum.
Sedento de vingança, o sistema simplesmente aplica contra Moro tudo que o acusa cinicamente de ter feito contra os quadrilheiros da Petrobras, para que ninguém nunca mais ouse enfrentar a corrupção no Brasil. Nessa hora, os amigos inconfessos dos corruptos na imprensa e nos tribunais superiores, que passam pano para roubalheira e impunidade em nome do garantismo e do Estado Democrático de Direito, mostram-se defensores tão somente do garantismo de ocasião e do Estado Seletivo de Direito.
Já não se dobra a vigarice como antigamente. Agora se triplica, se quadruplica.
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