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Felipe Moura Brasil

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Sem margem de erro na corrida presidencial

Colunista do UOL

14/03/2022 12h17

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Há três momentos cruciais na corrida presidencial de 2022, como apontei em dezembro de 2021 no Instagram:

1) "Jair Bolsonaro pode conter a queda com auxílios e benesses. Mas pode cair depois, quando a inflação corroer o poder de compra."

2) "A terceira via pode ficar fragmentada no começo, com vários candidatos travando a subida uns dos outros. Mas o líder do grupo pode subir quando outros desistirem."

3) "Na reta final, o desempenho melhor em projeções de segundo turno também pode catapultar o voto útil na terceira via. Isto sem falar do desempenho em debates na TV."

Em março de 2022, estamos na primeira parte do momento 1.

Jair Bolsonaro e sua turma do Centrão festejaram a leve melhora do presidente nas pesquisas, atribuindo-a ao Auxílio Brasil, programa de transferência de renda implementado no lugar do Bolsa Família que ele chamava de "Bolsa Farelo".

O PT também celebrou por um lado a recuperação do adversário que Lula deseja enfrentar e abater no segundo turno, mas, por outro, com medo da redução da vantagem e de perder eleitores no Nordeste, antecipou o lançamento de sua pré-candidatura para a primeira semana de abril, uma depois da de Bolsonaro, a ser lançada em 26 de março.

Agora o governo, que deixou o dólar nas alturas e abandonou a pauta de reformas como a tributária, teme a segunda parte do momento 1.

Muito antes da guerra de Putin na Ucrânia, os preços dos combustíveis já vinham em alta, desagradando os caminhoneiros, o que havia resultado em interferência de Bolsonaro na Petrobras para trocar o presidente da empresa, sem que disso resultasse qualquer mudança significativa; e em seus ataques à política de preços da Petrobras, que resultaram em investigação do TCU para apurar "possível ingerência indevida".

Após a sequência de sanções do Ocidente contra a Rússia culminar no embargo dos EUA ao petróleo russo, a disparada dos preços acendeu o alerta máximo do bolsonarismo para os riscos de desabastecimento e inflação, cuja projeção já saltou de 5,65% para 6,45%. Com a nona alta consecutiva, a estimativa do IPCA para 2022 já está 1,45 ponto porcentual acima do teto da meta estabelecida para este ano, de 5%.

Então se discute no Congresso qual é o puxadinho legislativo mais prático para aliviar temporariamente o sufoco de quem precisa de gasolina, diesel e gás de cozinha, enquanto a máquina de propaganda bolsonarista que passa pano para Putin terceiriza toda a responsabilidade pelo aumento para a guerra provocada pelo tirano russo.

Sergio Moro, porém, apontou responsabilidades de Bolsonaro e dos petistas pela crise dos combustíveis. Primeiro, respondeu a Lula que a Petrobras ainda existe "porque a Lava Jato impediu que o governo do PT continuasse saqueando e desviando recursos da maior estatal do Brasil", mas lembrou que, até hoje, a empresa "sente o efeito devastador dos desvios na Abreu e Lima e Comperj". "O custo da Abreu e Lima foi de US$ 2,3 para US$ 18,5 bi. Comperj: prejuízo de US$ 12,5 bi. Se o Brasil não tivesse sido saqueado no governo do PT, haveria mais refinarias. E combustíveis mais baratos."

Considerando "inaceitável" o aumento, o ex-juiz da Lava Jato afirmou que o governo Bolsonaro "deixou o dólar descontrolado no ano passado e agora, no momento de uma guerra, está paralisado". "Tudo falta: refinarias, fertilizantes... Não tem ninguém pensando o país a longo prazo?", questionou ele (um dia antes de pesquisadores do Insper Agro Global, em artigo na Folha, alertarem para a forte dependência do agronegócio brasileiro em relação a fertilizantes importados e mostrarem como a falta de planejamento levou o Brasil a uma situação crítica).

"Se tudo é transportado em cima de mais de 2 milhões de caminhões, em um país continental, como se explica não ter uma política específica para o setor? Mais uma vez: falta visão de longo prazo", sentenciou o ex-juiz. Moro defende o estímulo à "produção de energias renováveis, com foco em energia eólica, solar, etanol e hidrogênio verde". "Com maiores investimentos no setor, podemos criar mais de 40 milhões de empregos até 2050."

Em relação ao momento 2, a terceira via continua fragmentada e, se depender de Gilberto Kassab, vai ficar ainda mais.

O presidente do PSD quer lançar a candidatura de Eduardo Leite, que perdeu as prévias tucanas para João Doria e terá de descumprir uma série de promessas para entrar na corrida presidencial em outro partido. Lula agradece pela fragmentação, enquanto negocia nos bastidores os apoios velados e oficiais de Kassab.

Não é muito diferente o MDB da pré-candidata Simone Tebet, já que emedebistas de Norte e Nordeste são mais próximos de Lula e outros membros já investigados do partido fazem parte da mesma frente ampla pela impunidade encabeçada pelo petista.

A baixa rejeição a Tebet e Leite, porém, é usada para legitimar ambas as iniciativas, mesmo que as pontuações sejam ainda mais baixas e o eleitorado pouco conheça cada um, ao contrário de Doria, por exemplo, tão conhecido e rejeitado que a pressão pela retirada de sua candidatura cresce no próprio PSDB.

"Não quero viver com o sentimento de que poderia ter feito algo e não fiz", disse Leite, ensaiando seu novo discurso, "então eu vou usar a pista toda que eu tenho pela frente até eu sentir que a tomada de decisão se imponha."

Já o verão de Moro foi uma espécie de batismo de fogo na corrida eleitoral. Ficou meses sob ataque de bolsonaristas e lulistas (inclusive do TCU) no episódio da Alvarez & Marsal, viu as portas da União Brasil se fecharem para o Podemos e precisou repudiar a sequência de erros do MBL, que, apesar do áudio indefensável de Arthur do Val, parece não ter digerido muito bem o distanciamento inevitável do ex-juiz.

Dadas as circunstâncias, a campanha de Moro viu até com otimismo a mera oscilação para baixo do pré-candidato em algumas pesquisas, geralmente dentro da margem de erro, apesar de Ciro Gomes ter-se aproximado da casa dos 8 pontos. Ainda se crê que o ex-juiz manteve sua base e tem mais potencial de crescimento no campo de centro-direita, onde Bolsonaro vacila, que Ciro no campo da esquerda, ocupado por Lula.

Para chegar ao momento 2 como líder da terceira via e ao 3 com projeções melhores para o segundo turno que Bolsonaro, o certo é que Moro já não tem margem para errar.