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Felipe Moura Brasil

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O maior contraste do fatídico 8/1

Colunista do UOL

09/01/2023 13h40

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"Fomos somente adversários, jamais rivais, inimigos."

Foi o que escreveu Zico após a morte de Roberto Dinamite, ocorrida no mesmo domingo da invasão bolsonarista dos Três Poderes, que instaurou o terror em Brasília com depredação de patrimônio público transmitida ao vivo em redes nacionais de TV.

O maior ídolo da história do Flamengo publicou no Instagram dez fotos em que aparece com o maior ídolo da história do Vasco da Gama, abraçando, rindo, confraternizando, representando lado a lado o Brasil e até vestindo em 1993 a camisa cruzmaltina, na despedida do ainda recordista de gols em campeonatos brasileiros.

"São mais de 50 anos de amizade que começou nos juvenis. Nossas mães assistiam juntas aos jogos", escreveu o camisa 10 da Gávea sobre o 10 de São Januário. "Nossa relação se estreitou na seleção brasileira e aliás nunca perdemos jogando juntos. Respeito, carinho, admiração e muito profissionalismo."

O dia propício para relembrar a artilharia do "garoto Dinamite" que tanto "explodiu" o Maracanã virou a crônica do golpismo anunciado no Congresso Nacional, no Palácio do Planalto e no STF. O contraste entre a grandeza construtiva da dupla de adversários amigos e a pequenez destrutiva de uma horda de maus perdedores ilustra um quadro de decadência cultural brasileira, agravada por ídolos de araque, como Jair Bolsonaro.

Seu reacionarismo aloprado e militarista produziu um fetiche coletivo por intervenção das Forças Armadas; sua aversão ao exame das próprias responsabilidades turbinou a reação histérica contra alegados inimigos e o resultado das urnas; sua apropriação das forças de segurança rendeu corpo mole das polícias na contenção de terroristas da seita.

Bolsonaro desvirtuou as críticas legítimas à corrupção ocorrida nos governos do PT, à impunidade promovida por tribunais superiores e à imposição esquerdista do "politicamente correto", colocando no lugar delas o ódio contra todas as pessoas e instituições que não aderiram aos seus desmandos e desvarios.

O bolsonarismo foi um acidente de percurso na formação nacional de uma direita democrática, à medida que usurpou tradições liberais e conservadoras, dinamitou as pontes com a realidade e implodiu a construção de uma alternativa política ao petismo. (Relembre, por exemplo, meus artigos: aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.) Não que a família Bolsonaro tenha feito isso sozinha.

Mercadores do caos, que faturaram alto em microfones tradicionais com pregação de golpe militar e guerra civil, agora buscam se descolar do resultado prático da legitimação moral da delinquência, assim como tentam se descolar das omissões policiais o secretário de férias em Orlando e agora exonerado Anderson Torres ("Fui surpreendido… ataques inimagináveis…") e o governador depois afastado Ibaneis Rocha ("Não acreditávamos em momento nenhum que essas manifestações tomariam as proporções que tomaram..."). Filho feio não tem pai, mas o terror bolsonarista é produto da bolha irracional que a claque mercenária moldou, com aval de empresários e parlamentares, e da complacência de autoridades públicas.

Se forem presos todos os responsáveis morais, políticos e eventualmente criminais pelo terrorismo contra os três Poderes, o avião da extradição vai chegar lotado dos Estados Unidos, trazendo um bando de fujões e golpistas de home office. Eles só conseguem "explodir" (e depois abandonar) suas fiéis torcidas pela malícia e pelo oportunismo, nunca pelo brilho singular e perene dos ídolos de verdade.