Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Além do óbvio, apoiar Maduro atrapalha interesses estratégicos do Brasil
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Como todos pudemos acompanhar, a política externa brasileira capturou novamente os holofotes ao longa da última semana, dessa vez em função do encontro promovido pelo governo Lula entre líderes sul-americanos.
Se, em teoria, a ideia parecia boa, na prática, verteu-se em uma sequência de constrangimentos diplomáticos. Lula tem razão em fazer da política regional uma prioridade. O Brasil isolou-se nos últimos anos e perdeu protagonismo, ao mesmo tempo em que novos desafios se abateram sobre o subcontinente e que as instituições internacionais voltadas a integração perderam força e relevância.
Manter o diálogo com os vizinhos não somente é uma prerrogativa constitucional do Brasil, como atende também às nossas tradições de política externa, aos nossos interesses nacionais e às nossas ambições globais. Ao exaltar a legitimidade democrática de Nicolás Maduro, no entanto, Lula parece ter-se perdido no personagem. Ao relativizar a crise venezuelana, ele abriu espaço para que se alimente a percepção de que ou o presidente está mal-informado, ou está disposto a fazer malabarismos retóricos para defender aliados políticos a qualquer custo. Em nenhum dos dois casos, o cenário parece bom, tanto para sua própria liderança quanto para o Brasil que ele representa.
A crise política, econômica e humanitária na Venezuela está amplamente documentada. Tentar reduzi-la a construção de uma narrativa é impreciso e desonesto. Revela um olhar anacrônico sobre o país e a insistência em produzir uma política externa de retrovisor para o Brasil.
Como tantos analistas têm insistido em dizer, Lula está certo em manter-se aberto ao diálogo com todos os países e interlocutores, assim como tem razão em defender o fim do isolamento da Venezuela, política que não logrou êxito nos últimos anos. Isso não significa, no entanto, fechar os olhos para os excessos de Maduro. Perseguir uma política de não-alinhamento com o Ocidente e criticar a forma de exercer poder das lideranças do Norte, nada tem nada a ver com sustentar duplipensar.
Para além da óbvia incoerência com nossos valores que isso representa, dois outros problemas também se agravam com esse comportamento:
1) depois da Ucrânia, o Brasil perde mais uma chance de ser visto como mediador razoável de uma crise repleta de sensibilidades, já que Lula passa a ser identificado pelos demais players sul-americanos como um ator excessivamente comprometido com Maduro e não como um negociador isento, apto a transitar por diferentes realidades e acomodar necessidades mútuas;
2) o discurso de Lula, além de acentuar animosidades desnecessárias entre os países da região, cria uma nuvem de fumaça que dispersa a discussão sobre problemas urgentes da América Latina, como os efeitos da crescente presença chinesa na região, a falta de infraestrutura, a necessidade de aumentar a competitividade dos países e os mecanismos a serem trabalhados para melhorar a qualidade de vida das populações.
Quanto mais inconstância e imprevisibilidade temos, mais oportunidades desperdiçamos.
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