Movimento negro brasileiro apoia inquérito na ONU sobre violência policial
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Mais de cem organizações do movimento negro brasileiro anunciam seu apoio ao projeto apresentado na ONU para se criar uma comissão de inquérito para investigar a brutalidade policial nos EUA e em outros países e o racismo.
O texto foi submetido às Nações Unidas pelos países africanos, como reação à morte de George Floyd, nos EUA. O governo brasileiro ainda não tomou uma decisão sobre como votará. Mas uma ala dentro do Itamaraty defende que o Brasil seja contrário ao projeto. Pelo menos dois motivos estariam pesando.
O primeiro deles se refere à aliança entre Brasília e a Casa Branca. Washington vem pressionando governos a barrar o projeto no Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Mas o governo brasileiro também teme que, se aprovada, a comissão de inquérito também poderia analisar o comportamento da polícia brasileira. No texto, a resolução aponta que não apenas a situação americana deveria ser avaliada, mas também em "outras partes do mundo" onde o fenômeno tenha sido registrado nos últimos anos.
Numa declaração feita na ONU nesta terça-feira, a entidade que reúne as ONGs nacionais, Coalizão Negra por Direitos, indicou que apoia "a proposta de resolução sobre os Africanos e dos Povos de Ascendência Africana e a brutalidade policial".
"Em 2017, tivemos mais de 65.000 homicídios no Brasil - o mais alto nível histórico. 49.500 eram afro-brasileiros - homens e mulheres", disse. "Entre 2007 e 2017, mais de 400.000 afro-brasileiros foram mortos sob violência policial, disputas entre gangues, mas acima de tudo, vítimas de discriminação racial histórica e racismo estrutural no Brasil", denunciaram.
"O brutal assassinato de George Floyd demonstra isso através das revoltas e manifestações nas ruas, e a demanda por justiça racial é global", afirmam. "No Brasil, apoiamos essa luta e esses protestos, e exigimos justiça para todos os nossos jovens e para a população negra", disseram.
"O Brasil é um país em dívida histórica com sua população negra. Não há democracia, cidadania ou justiça social sem o compromisso público de reconhecer o movimento negro como detentor de direitos e lutar contra a brutalidade policial", alertaram.
"Além disso, centenas de quilombolas estão ameaçados de expulsão de suas terras devido a projetos econômicos, especialmente na Amazônia brasileira", completaram.
Disputa
Em reuniões nesta terça-feira na ONU, porém, o projeto de resolução revelou o racha na sociedade internacional em relação ao tema do racismo e da violência policial. Se a China e Rússia demonstram seu apoio à iniciativa dos africanos, como um claro instrumento de pressão contra os EUA, diversos governos ocidentais insistiram que tal inquérito não seria necessários.
Um dos maiores defensores dos americanos foi a Austrália. "Não apoiaremos o texto da forma que está", disse. Para o aliado de Washington, não são apenas negros que sofrem discriminação ou violência policial. Na avaliação dos australianos, tal iniciativa "dividiria" o mundo. O governo do Japão, também aliado de Washington, deixou claro que é contra a investigação.
Já a UE preferiu insistir que o racismo é um problema global e que, portanto, a resolução deveria ser "mais ampla", sem selecionar países.
A Human Rights Watch, porém, pediu que as delegações no encontro tivessem a coragem de olhar para o vídeo da morte de Floyd.
Representantes africanos ironizaram as propostas dos países ocidentais, que pediram que a resolução seja "o mais amplo possível". A manobra é uma tentativa de evitar responsabilizar diretamente o governo dos EUA.
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