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Jamil Chade

OMS: Reabertura pode ser um dos momentos mais "perigosos" no Brasil

Colunista do UOL

05/07/2020 04h00

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A Organização Mundial da Saúde acompanha com preocupação os passos dados no Brasil para a reabertura de sua economia e sociedade. O temor na cúpula da entidade é de que a nova fase leve o país a registrar um novo salto no número de casos, repetindo o cenário de crise que voltou a se instalar nos EUA nos últimos dias.

Em relatos à coluna, membros da equipe que se ocupa da pandemia na OMS apontam que o momento é considerado como "crítico" no Brasil. "Talvez esse seja um dos momentos mais perigosos da epidemia no país", disse um deles, na condição de anonimato.

Na semana passada, o Rio de Janeiro decretou a reabertura de bares e restaurantes. Na segunda-feira, será a vez de São Paulo iniciar algumas das medidas de relaxamento. Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro continua pressionando por um processo mais acelerado de reabertura.

O momento no Brasil coincide com um número recorde de casos diários no mundo, com o fracasso de dois dos tratamentos sob avaliação e com a constatação da entidade mundial de que, se governos não mudarem de postura, "o pior está por vir".

Para especialistas da OMS, a experiência mostrou que países com níveis de transmissão como as do Brasil não conseguiram fazer a reabertura com êxito. A opção brasileira, portanto, é considerada como um "risco" e apelam para que decisões sejam tomadas com base em cada cidade do país e levando em consideração cada uma das realidades.

Ainda assim, os técnicos acreditam que o Brasil precisa garantir que essa reabertura seja acompanhado por três medidas. Uma delas é o aumento de testes. Hoje, o país continua sendo um dos que menos testa entre os principais locais da crise.

Um segundo elemento é o de garantir investimento nos serviços públicos de saúde, justamente para garantir que haja espaço nas UTIs caso o número de infectados volte a dar um salto.

Para OMS, um terceiro elemento é garantir uma conscientização da sociedade sobre a necessidade de se manter a distância, lavar as mãos e usar máscaras.

Sem isso, alertam os técnicos, o resultado será uma nova onda de forte de transmissão, repetindo os números de maio e começo de junho. O exemplo americano, com mais de 50 mil casos por dia, é um outro sinal que deveria ser considerado como um alerta ao Brasil, dizem os técnicos na agência.

Até o sábado, o Brasil somava mais de 63 mil mortes e 1,5 milhão de casos, de acordo com os números do consórcio de veículos de imprensa.

A avaliação da OMS é de que a "pressão" sobre o vírus precisa continuar. "Não adianta segurar por apenas algum tempo uma hemorragia", explicou um dos técnicos. "A pressão precisa ser consistente" , disse.

A entidade aponta que os estudos revelaram que, quando políticas são estabelecidas de forma consistente, os resultados surgem, mesmo que não haja perfeição em cada um de seus componentes, como rastrear os contatos, testar ou distanciamento social. "Mais que a perfeição, o que faz a diferença é a consistência", disse um dos principais nomes da equipe da OMS, na condição de anonimato.

Desconfiança

Para os técnicos em Genebra, uma reabertura precoce ou que gere um descontrole ainda ameaça "desfazer" o que foi obtido até agora no país, levando a uma crise ainda maior de confiança nas autoridades públicas. A entidade também considera que é um "desrespeito" a quem se sacrificou e ficou em casa por meses, já que a reabertura poderia anular esses esforços em uma questão de poucos dias.

Na sexta-feira, de fato, o diretor de operações da OMS, Mike Ryan, afirmou que existem alguns sinais iniciais de estabilização da curva de pessoas contaminadas no Brasil pelo coronavírus. Mas alertou que o governo terá de intensificar a resposta se quiser controlar a pandemia. Ryan aponta que não há garantia de que os números começarão a cair e que continuam elevados. Mas insiste que o momento é o de tentar assegurar que não haja uma nova aceleração de casos.

"Os números se estabilizaram nos últimos dias", afirmou. "A esperança é de que não recomece a aumentar", insistiu.

Para ele, "nunca é tarde demais para ter controle" sobre a doença. "A questão é se governos assumem o controle", insistiu.

De acordo com o chefe da OMS, o sistema de saúde no Brasil e as UTIs continuam capazes de lidar com a crise. "Em muitos países, o sistema está saturado. Não chegamos a esse ponto ainda (no Brasil)", disse. Para ele, é o momento de dar crédito aos profissionais de saúde no país.

Mas ele deixou claro que não há qualquer garantia de solução por enquanto. "Queremos ver mais progresso e uma resposta mais intensa", afirmou.