Às vésperas de eleição, Brasil assinará declaração antiaborto com Trump
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O governo brasileiro irá co-patrocinar uma declaração com o governo norte-americano para a defesa da "família" e da "vida", num texto com um forte componente antiaborto. O evento está marcado para ocorrer no dia 22 de outubro, poucos dias antes das eleições nos EUA. O gesto está sendo interpretado como uma sinalização de Donald Trump a sua ala mais conservadora e numa indicação que os esforços da Casa Branca neste sentido contam com o apoio de diferentes países.
Além do Brasil, patrocinam a declaração alguns dos principais aliados populistas dos americanos, como a Hungria. Mas o grupo também conta com governos de países com maioria muçulmana, como Egito e Indonésia. A aliança entre islâmicos e cristãos ultraconservadores já vinha sendo registrado nos últimos meses em diferentes temas relacionados à situação das mulheres, na ONU.
Agora, o que está sendo chamado de Consenso de Genebra promete focar em quatro pilares de ação conjunta entre os países: melhor saúde para a mulher, preservar a vida humana, fortalecer a família como unidade fundacional da sociedade e proteger a soberania de todos os países na política global.
O evento será liderado pelo secretário de Saúde dos EUA, Alex Azar, e pelo secretário de Estado norte-americano, Mike Pompeo.
Antiaborto e soberania
No texto da declaração, porém, é onde se encontra a substância da mensagem que o grupo quer passar e a tradução da "preservação da vida".
Os países, ao assinarem a proposta, enfatizam que "em nenhum caso o aborto deve ser promovido como método de planejamento familiar " e que "quaisquer medidas ou mudanças relacionadas ao aborto dentro do sistema de saúde só podem ser determinadas em nível nacional ou local de acordo com o processo legislativo nacional".
Num dos trechos, os governos "expressam a prioridade essencial de proteger o direito à vida, comprometendo-nos a esforços coordenados em fóruns multilaterais". Ou seja, se comprometem em agir na ONU (Organização das Nações Unidas), OMS (Organização Mundial da Saúde) e outras entidades para estabelecer isso como princípio.
Mas, ao citar a soberania, fica claro no documento que governos irão rejeitar qualquer postura das entidades internacionais num caminho que possa abrir supostas brechas para o aborto.
A aliança reafirma que "não há direito internacional ao aborto, nem qualquer obrigação internacional por parte dos Estados de financiar ou facilitar o aborto, consistente com o consenso internacional de longa data de que cada nação tem o direito soberano de implementar programas e atividades consistentes com suas leis e políticas".
Em uma audiência no Senado, no dia 24 de setembro, o chanceler Ernesto Araújo confirmou que um dos objetivos do governo é de evitar que haja qualquer tipo de imposição por parte das entidades internacionais sobre qual rumo deve ser tomado no Brasil quando o debate é o aborto.
"Nós sempre nos posicionamos para que não haja, em textos de organismos internacionais, algum tipo de direito universal como método anticonceptivo, anti-concepção ou método de controle de natalidade", disse o ministro.
"No dia em que isso tiver que ser mudado ou se quiser se mudar, tem que ser objeto de apreciação pelo Legislativo Brasileiro e não vir de contrabando em textos internacionais de organismos internacionais. Essa é a nossa posição", explicou.
Também se estabelece que "a criança precisa de salvaguardas e cuidados especiais, antes e depois do nascimento" e que "medidas especiais de proteção e assistência devem ser tomadas".
Há um compromisso que se estabelece para "melhorar e assegurar o acesso das mulheres à saúde e ao desenvolvimento". Mas o mesmo parágrafo completa: "sem incluir o aborto".
O "papel crítico" da mulher na família
Ao longo da declaração, o termo "família" vem sempre acompanhando a situação da mulher. Em nenhum lugar do trecho o termo "igualdade de gênero" aparece. Os autores preferem falar que a "partilha igualitária de responsabilidades para a família por homens e mulheres e uma parceria harmoniosa entre eles são críticos para seu bem-estar e o de suas famílias".
A declaração também é um reforço ao papel da família, considerada pelos governos como "o grupo natural e fundamental da sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado". Nessa família, as "mulheres desempenham um papel crítico".
Um requerimento foi apresentado pela entidade Conectas Direitos Humanos à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e à Comissão de Direitos Humanos do Senado "para que convoquem o Ministro de Estado de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, para prestar esclarecimento sobre iniciativa copatrocinada pelo Brasil e Estados Unidos da América".
O projeto surge depois de uma polêmica em relação ao papel do governo diante do caso de uma garota de dez anos que, depois de abusada sexualmente, teve dificuldades para conseguir realizar um aborto legal. O Ministério da Saúde, segundo reportagem de Maria Carolina Trevisan, publicou uma portaria que dificulta o acesso ao aborto legal.
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