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Jamil Chade

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

COP26: ministro faz promessas ao mundo, mas silencia sobre "boiada"

O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, durante pronunciamento da nova meta climática do Brasil para a COP26 - Reprodução
O ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, durante pronunciamento da nova meta climática do Brasil para a COP26 Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

09/11/2021 17h50

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Num ambiente que apenas imita uma floresta, o "tico-tico no fubá" que se escutava como música ambiente mais fazia o local parecer um pavilhão de promoção de turismo. O espaço foi erguido pelo governo brasileiro na Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, em Glasgow, e nesta terça-feira foi uma espécie de quartel-general do ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite.

Ao mundo, o governo brasileiro fez promessas: corte de emissões e redução de desmatamento. Mas quando foi questionado por jornalistas sobre a "boiada" no Congresso, silenciou, se esquivou, repetiu frases vazias e não respondeu.

A "boiada" foi o termo usado pelo ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles ao sugerir ao governo de Jair Bolsonaro que se aproveitasse que a imprensa estava focada na pandemia da covid-19 para acelerar a aprovação de leis que, na avaliação de ambientalistas, acelerariam o desmatamento.

Nesta terça-feira, Leite recebeu um grupo de jornalistas em uma sala apertada, no espaço reservado pelo Brasil. O governo optou por ignorar as enormes salas de conferências de imprensa, alegando que não realizaria a conversa com os jornalistas no local para evitar protestos. Horas antes, a americana Nancy Pelosi usou a sala principal para coletivas de imprensa. Antes, o enviado americano ao Clima, John Kerry, também ocupou o pódio, além dos senadores Rodrigo Pacheco e Katia Abreu.

Mas, para o chefe da delegação brasileira, a opção foi limitar o número de profissionais de imprensa, em um ambiente "mais controlado". Por exatos 34 minutos, Leite insistiu em frases sobre a "necessidade de se criar uma nova economia", sobre a importância de se gerar empregos, dar incentivos e sobre o fato de o desafio ambiental ser "global".

O que ele não fez, porém, foi responder a perguntas simples: como seria a reação do governo diante dos projetos de lei que regulariza a invasão ilegal de terra, a mineração em terra indígena e que estabelece o Marco Temporal.

Em cada vez que a pergunta era feita, ele apenas repetia a mesma ladainha sobre a necessidade de garantir renda para a população local e combinar economia com a preservação, sem explicar como o governo atuaria. Os jornalistas insistiam em obter uma resposta, apenas para ouvir as mesmas frases.

Na primeira vez que foi perguntado sobre a boiada, ele respondeu: "o governo mantém apoio a atividades que conservem florestas. Qual o desafio? Que projetos verdes sejam acelerados dentro da política do governo federal".

Na segunda vez que os jornalistas fizeram a mesma pergunta, ele insistiu: "Eu apoio qualquer lei que? Eu apoio especificamente criar mercado de serviços ambientais para você remunerar quem cuida de florestas", respondeu.

Numa terceira tentativa, ele ele manteve o caráter enigmático e não respondeu.

As perguntas, porém, não eram apenas dos jornalistas. Deputados europeus que estiveram com o ministro também colocaram as mesmas questões, enquanto em Parlamentos pelo mundo o avanço dessas leis é considerado como um dos principais elementos de destruição da credibilidade do Brasil no mundo.

Quando um repórter estrangeirou questionou sobre a ausência de Jair Bolsonaro no evento, Leite respondeu que o presidente havia "participado de uma forma mais moderna". Bolsonaro enviou um vídeo pré-gravado, mas ao não estar em Glasgow não pôde dialogar com os mais de cem chefes-de-estado e de governo.

No final do encontro com a imprensa, a reportagem do UOL questionou se ele concordava com a postura do senador Rodrigo Pacheco de que o Brasil deveria fazer "mea culpa" sobre o desmatamento.

Leite se levantou e deixou a sala, alegando que o tempo tinha terminado. E o tico-tico no fubá continuava tocando.