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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Brasil rebate ONU e diz que reprime ações ilegais em reservas indígenas

Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para Direitos Humanos - Jamil Chade
Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para Direitos Humanos Imagem: Jamil Chade

Colunista do UOL

14/06/2022 12h33

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Resumo da notícia

  • Brasil eleva o tom e insinua que não aceitará interferência da ONU em eleição no país
  • Na segunda-feira, Bachelet soou um alerta sobre a eleição no Brasil e criticou a violência contra indígenas, ambientalistas e jornalistas

Contrariando os fatos relatados por indígenas, entidades da sociedade civil e até pela Igreja, o Itamaraty declarou nesta terça-feira na ONU que o governo atua para "reprimir ações ilegais em terras indígenas" e insistiu que programas de proteção incluem ambientalistas e jornalistas. Num discurso duro, o governo brasileiro ainda garantiu no Conselho de Direitos Humanos das Nações que está comprometido com a realização de eleições democráticas. Mas elevou o tom e insinuou que não aceita a interferência no processo eleitoral no país, depois de a entidade ter soado o alerta sobre o pleito no país em outubro.

A declaração do Brasil foi dada um dia depois que a alta comissária da ONU, Michelle Bachelet, ter pedido que não houvesse "interferência" no pleito, além de criticar a violência contra indígenas, ambientalistas e jornalistas.

Como de costume, países podem responder às críticas e comentários, o que foi feito nesta terça-feira. A fala foi feita pelo embaixador do Brasil na ONU, Tovar Nunes.

"Lamentamos que seu último informe não reconheça os esforços do Brasil para promover e promover os direitos humanos e a democracia", disse o diplomata.

Tovar Nunes não citou em nenhum momento de sua intervenção os nomes dos dois desaparecidos na Amazônia, Dom Phillips e Bruno .Pereira. Mas a mensagem ocorre diante de uma grande pressão internacional contra o governo de Jair Bolsonaro para que esclareça o que ocorreu com os dois homens.

Bachelet não havia poupado críticas sobre a questão da violência. "No Brasil, estou alarmada com as ameaças contra os defensores dos direitos humanos ambientais e os povos indígenas, incluindo a exposição à contaminação por mineração ilegal de ouro", declarou a chilena na segunda-feira. Na semana passada, seu escritório já havia criticado o governo por ter sido "extremamente lento" nos primeiros dias das buscas na Amazônia.

Como resposta, o governo agora afirmou:

"Instituições de Justiça investigam com rigor e independência situações de ameaça e violência contra defensores de direitos humanos. Também atuam para reprimir ações ilegais em terras indígenas", disse Tovas Nunes.

"Nosso programa nacional de proteção foi fortalecido em 2019 para também incluir jornalistas e ambientalistas", garantiu o diplomata. Ele também insistiu que o Brasil "luta contra o racismo" e que as forças de ordem têm passado por formação, num novo programa lançado em 2021. Bachelet havia criticado a violência policial, como vem fazendo desde 2019.

O presidente, há três anos, rebateu a chilena fazendo um elogio ao ditador Augusto Pinochet. O pai de Bachelet havia sido assassinado quando o general tomou o poder e a própria representante da ONU foi torturada.

Governo insinua que não aceita interferência da ONU nas eleições

O governo também insistiu em rebater as preocupações internacionais sobre a eleição no país. "Reafirmamos o compromisso mais firme com a organização de eleições livres, justas, transparentes e seguras para todos, conforme prevê nossa Constituição e nossas obrigações internacionais", afirmou o embaixador.

Mas ele elevou o tom, num gesto que foi interpretado como uma mensagem para a ONU de que o governo se recusa a aceitar os comentários tecidos sobre a eleição.

"Agora, se há algo que estamos de acordo é que não exista espaço para inferência de nenhum lugar. Nesse importante momento para a democracia no Brasil, estamos amparados pela independência e autonomia de nossas instituições e no marco constitucional da separação dos poderes", completou o embaixador.

Na segunda-feira, num ato poucas vezes visto em relação ao Brasil, a ONU cobrou independência das instituições nacionais em um ano de eleição, faz um apelo por um processo "democrático", "sem interferência" e alerta para a violência contra mulheres, negros e representantes do movimento LGBTI+ que concorram ao pleito, em outubro.

Bachelet incluiu o Brasil em seu informe sobre situações que preocupam a entidade e que foi apresentado ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, em Genebra.

Duas horas depois de fazer seu discurso, em uma coletiva de imprensa, Bachelet aumentou o tom da cobrança ao ser questionada sobre o Brasil. "Em outubro vocês têm eleições. E peço a todas as partes do mundo que as eleições sejam justas, transparentes e que as pessoas possam participar livremente", disse. "Será um momento democrático muito importante e não deve haver interferência de nenhuma parte para que o processo democrático possa ser atingido", insistiu.

Bachelet, ex-presidente do Chile e que se chocou com o presidente Jair Bolsonaro desde 2019, escolheu fazer o alerta sobre as eleições em seu último discurso diante do órgão internacional. Ela anunciou na mesma reunião que não continuará no cargo máximo de direitos humanos da ONU, depois de quatro anos no posto.

"Os casos recentes de violência policial e racismo estrutural são preocupantes, assim como os ataques contra legisladores e candidatos, particularmente os de origem africana, mulheres e pessoas LGBTI+, antes das eleições gerais de outubro", disse Bachelet.

Num raro gesto, ela também fez uma cobrança sobre as instituições, ainda que não tenha citado textualmente o nome de Jair Bolsonaro e seus ataques contra o Judiciário e as instâncias responsáveis pelas eleições. "Apelo às autoridades para que garantam o respeito aos direitos fundamentais e instituições independentes", completou Bachelet.

Brasil incluído em locais com "situações críticas" no mundo

Ao citar o Brasil, Bachelet ainda incluiu o país numa lista de cerca de 30 locais pelo mundo considerados como preocupantes em relação às violações de direitos humanos. Ao longo dos últimos três anos, o governo de Jair Bolsonaro foi criticado em diversas ocasiões por parte de organismos internacionais, ampliando a pressão sobre a diplomacia brasileira.

O Brasil foi citado entre locais que, segundo Bachelet, vivem "situações críticas e que exigem ações urgentes".

No caso específico do Brasil, ela mencionou o país ao falar de "tendência perturbadora de redução do espaço cívico, incluindo ataques a defensores dos direitos humanos e jornalistas, e restrições indevidas à liberdade de expressão e da mídia".

A lista de países mencionados ainda inclui a Rússia, Estados Unidos, Turquia, Haiti, México, Guatemala, Mali, China e vários outros. Bachelet deixou claro que relatórios separados ainda serão apresentados como Síria, Venezuela, Iêmen e outros.