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Jamil Chade

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Com intolerância religiosa, Michelle expõe ao ridículo a diplomacia do país

Presidente Jair Bolsonaro (PL) ao lado da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e de do general Braga Netto, vice na chapa do PL à reeleição, durante convenção do partido - Reprodução/Youtube Flávio Bolsonaro
Presidente Jair Bolsonaro (PL) ao lado da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e de do general Braga Netto, vice na chapa do PL à reeleição, durante convenção do partido Imagem: Reprodução/Youtube Flávio Bolsonaro

Colunista do UOL

10/08/2022 13h31

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Uma das principais bandeiras do governo de Jair Bolsonaro no mundo acaba de ser rasgada pela primeira-dama e seus apoiadores. Ao compartilhar em suas redes sociais um vídeo com ataques contra religiões de matriz africana, Michelle Bolsonaro escancarou a mentira que é a política externa de seu marido que passou os últimos três anos defendendo a "liberdade religiosa" nos órgãos internacionais.

Nesta semana, a primeira-dama compartilhou no story do Instagram um vídeo no qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva aparece numa cerimônia com lideranças de religiões de matriz africanas. Em sua publicação, ela escreveu: "Isso pode, né. Falar de Deus, não".

O problema é que publicação original ainda tinha mensagens de cunho discriminatório feito por aliados de Bolsonaro contra essas práticas religiosas e as associavam às trevas. "Lula já entregou sua alma para vencer essa eleição", afirmava o texto original.

A questão é que tal atitude desmascara a estratégia do governo que, ao longo dos últimos anos, insistia que seu objetivo era defender a liberdade de culto de todos os movimentos.

Desde os primeiros dias de seu governo, Bolsonaro sequestrou o Itamaraty para atender a um grupo específico de brasileiros: os ultraconservadores. Usando a rede de embaixadas pelo mundo e com Damares Alves e Ernesto Araújo como comandantes, o Executivo se lançou em uma ofensiva para fortalecer uma rede mundial reacionária.

Para dar uma justificativa à iniciativa, a estratégia foi a de transformar a ofensiva em um ato "em defesa da liberdade de religião". Nos meses que se seguiram, o Brasil passou a ser um dos principais arautos das alianças criadas entre países e que defendiam a liberdade de culto pelo mundo.

Nesses eventos, porém, o governo não mencionava os ataques constantes que casas de reza e terreiros eram vítimas no Brasil. Araújo, por exemplo, afirmou num desses encontros em novembro de 2020 que "nenhuma fé está a salvo da intolerância e da perseguição, e os cristãos estão entre suas principais vítimas". "Infelizmente, temos visto episódios contínuos de ódio e violência contra os cristãos em todos os hemisférios e continentes", disse.

A pauta religiosa dialogava com outros interesses. O principal deles: rever o arcabouço de direitos humanos no mundo e frear reivindicações do movimento gay e de mulheres. Assim, questões como educação sexual, direitos reprodutivos e mesmo o termo gênero eram combatidos pelos diplomatas.

Agora, ao atacar as religiões de matriz africana, a máscara caiu. Os bolsonaristas, na busca por votos, trazem provas de que o objetivo internacional jamais foi o de defender todas as práticas religiosas. Mostram que tudo não passava de um sequestro de conceitos para, no fundo, promover uma agenda racista, xenófoba e que viola a própria Constituição do país.

Ao atacar as religiões de matriz africana, a base bolsonarista expõe ao ridículo a diplomacia nacional e aprofundam a falta de credibilidade do país no mundo. Uma vez mais.