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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Haia pede prisão de Putin por crimes na Ucrânia

Colunista do UOL

17/03/2023 12h25Atualizada em 17/03/2023 15h37

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O Tribunal Penal Internacional em Haia, na Holanda, pediu hoje a prisão do presidente da Rússia, Vladimir Putin. O anúncio foi feito um dia após a divulgação das investigações que concluíram que o russo cometeu crimes de guerra durante a invasão da Ucrânia, em específico diante da deportação de crianças.

Putin não será preso na Rússia, já que o país não reconhece a jurisdição da Corte. Mas autoridades como a do Brasil e de qualquer outro país membro do tribunal teriam a obrigação de prendê-lo se ele pisar em território nacional, segundo um ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro.

A medida é a ação mais dramática num processo de transformação do chefe do Kremlin em um pária internacional. A Rússia já havia sido suspensa de dezenas de organismos internacionais e até mesmo de competições de futebol. Agora, com o pedido de prisão decretado contra Putin, o isolamento será ainda maior.

Diplomatas brasileiros apontaram ao UOL que a medida ameaça aprofundar a crise, já que as possibilidades de diálogo ou mediação seriam ainda mais restritas. Para experientes negociadores, a ordem de prisão torna uma mediação ainda mais difícil.

Como vamos convencer Putin a negociar, com ele sabendo que pode ser entregue depois ao tribunal?
Diplomata estrangeiro, em condição de anonimato

Mas, para juristas, o tribunal existe justamente para examinar casos em que a impunidade diante de crimes é evidente. Governos que fazem parte da corte não teriam a autoridade sequer de julgar ou rejeitar o pedido dos juízes internacionais, sob o risco de afundar a corte em uma crise de credibilidade sem precedentes.

Num informe produzido nesta semana por uma comissão de inquérito estabelecida pela ONU, as conclusões também apontavam para crimes de guerra e possíveis crimes contra a humanidade cometidas por tropas russas.

Agora, segundo a corte, o presidente é "supostamente responsável pelo crime de guerra de deportação ilegal de população [crianças] e de transferência ilegal de população [crianças] de áreas ocupadas da Ucrânia para a Federação Russa".

Os crimes foram cometidos em território ucraniano ocupado pelo menos a partir de 24 de fevereiro de 2022.

Existem motivos razoáveis para acreditar que Putin tem responsabilidade criminal individual pelos crimes acima mencionados
Tribunal Penal Internacional em Haia

Entre os motivos:

  1. por ter cometido os atos diretamente, juntamente com outros e/ou através de outros (artigo 25(3)(a) do Estatuto de Roma), e
  2. por não ter exercido adequadamente o controle sobre os subordinados civis e militares que cometeram os atos, ou permitiram que os cometessem, e que estavam sob sua autoridade e controle efetivo, de acordo com sua responsabilidade superior (artigo 28(b) do Estatuto de Roma).

Rússia não reconhece tribunal de Haia

A Rússia não reconhece a jurisdição da corte e, portanto, a medida não garante a entrega do presidente aos juízes internacionais.

A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia, Maria Zakharova, afirmou que "as decisões do Tribunal Penal Internacional não têm nenhum significado para o nosso país, inclusive do ponto de vista jurídico".

Maria Zakharova, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia - Maxim Shipenkov/Reuters - Maxim Shipenkov/Reuters
Maria Zakharova, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Rússia
Imagem: Maxim Shipenkov/Reuters

A Rússia não é parte do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional e não tem nenhuma obrigação sob ele
Maria Zakharova

Mas Putin pode ser preso se pisar em algum país que seja membro do Estatuto de Roma. Na prática, governos como o do Brasil teriam a obrigação de deter o russo, caso ele faça uma visita, e deveriam entregá-lo às autoridades em Haia.

Se não prender o russo, o país seria obrigado a abandonar o tratado.

O histórico do tribunal, porém, revela a dificuldade em fazer cumprir seu mandato. A corte também emitiu uma ordem de prisão contra o então presidente do Sudão, Omar al Bashir. Ele, porém, não foi detido nem mesmo quando viajou ao exterior e recebia garantias de outros chefes de estado que não seria importunado.

Mesmo assim, o governo da Ucrânia comemorou a ordem de prisão. "As rodas da Justiça estão girando", disse o ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba. "Os criminosos internacionais serão responsabilizados por roubar crianças e outros crimes internacionais", disse.

Além do presidente, a corte pediu a prisão de Maria Alekseyevna Lvova-Belova, comissária para os Direitos da Criança no Gabinete do Presidente da Federação Russa.

"Ela é alegadamente responsável pelo crime de guerra de deportação ilegal de população [crianças] e de transferência ilegal de população [crianças] de áreas ocupadas da Ucrânia para a Federação Russa", disse o tribunal.

"Os crimes foram alegadamente cometidos em território ucraniano ocupado pelo menos a partir de 24 de fevereiro de 2022. Há motivos razoáveis para acreditar que a Sra. Lvova-Belova tem responsabilidade criminal individual pelos crimes acima mencionados, por ter cometido os atos diretamente", destaca.

"A Câmara de Pré-Julgamento II considerou, com base nos pedidos da Acusação de 22 de fevereiro de 2023, que existem motivos razoáveis para acreditar que cada suspeito tem responsabilidade pelo crime de guerra de deportação ilegal da população e de transferência ilegal da população das áreas ocupadas da Ucrânia para a Federação Russa, em prejuízo das crianças ucranianas", afirmou.

"A Câmara considerou que os mandados são secretos a fim de proteger as vítimas e testemunhas e também para salvaguardar a investigação. Entretanto, consciente de que a conduta abordada na presente situação é alegadamente contínua, e que o conhecimento público dos mandados pode contribuir para a prevenção da prática de crimes, a Câmara considerou que é do interesse da justiça autorizar o Registro a revelar publicamente a existência dos mandados, o nome dos suspeitos, os crimes para os quais os mandados são emitidos, e as modalidades de responsabilidade estabelecidas pela Câmara", completou.