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Macron articula "cúpula da paz", e Brasil vê plano de forma positiva
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Não há data marcada, nem local, nem agenda. Não existe nem sequer um consenso entre as potências ocidentais sobre o tema. Mas o presidente da França, Emmanuel Macron, tenta articular uma "cúpula da paz", na esperança de iniciar um diálogo para colocar fim à guerra na Ucrânia. O projeto, segundo diplomatas, é visto de forma positiva pelo Brasil, que também defende o estabelecimento de uma espécie de G20 com a meta de buscar soluções para o conflito.
Por meses, Macron foi considerado dentro do Palácio do Planalto como um "aliado secreto" dentro do bloco europeu. De fato, no dia seguinte à recepção fria que o projeto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) recebeu na Casa Branca por Joe Biden, ainda em março, o francês foi às redes sociais saudar a insistência do Brasil em falar de paz.
Agora, a ideia da cúpula foi revelada pelo jornal Le Monde, que indica que Macron iniciou um processo de consultas com líderes internacionais, justamente para evitar que seu projeto seja alvo de ruídos ou entendido com uma ameaça contra a soberania ucraniana.
O UOL confirmou que as autoridades brasileiras estão cientes do projeto. Do lado do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, há uma disposição de debater "qualquer ideia que leve à paz". Também é visto como positivo por parte de Brasília a ideia de que Macron não quer um evento que represente a derrota da Rússia, repetindo os erros do Tratado de Versalhes.
Paris, porém, tem conduzido o processo com cuidado. Macron não quer convocar o encontro e nem ter uma data para o evento, sem que antes o projeto não esteja costurado com seus principais parceiros e, principalmente, com os ucranianos.
O temor da diplomacia francesa é a de que sejam alvos de uma sabotagem do próprio campo ocidental. Por isso, a primeira etapa está sendo a de construir um grupo favorável ao caminho proposto.
Dentro do governo brasileiro, a disposição de Macron e suas últimas intervenções deixaram negociadores moderadamente entusiasmados com a possibilidade de que haja uma voz entre os europeus que fale abertamente na busca de um outro caminho que não seja a derrota militar e política de Putin.
A notícia chega num momento em que mais de 50 aliados ucranianos se reuniram na Alemanha nesta sexta-feira para conseguir um compromisso de que esses governos continuarão a oferecer assistência militar às autoridades de Kiev. Depois de superar o inverno em uma atitude de resistência, o governo ucraniano prepara uma ofensiva militar para recuperar uma parcela do território invadido pelos russos.
Mesmo os franceses consideram que, neste momento, o tempo é ainda o do conflito militar. Mas, segundo o jornal Le Monde, Macron já mencionou a ideia de inicial um processo de dialogo ao conversar com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, no último dia 15 de abril.
O processo seria conduzido por "etapas", enquanto os ucranianos insistem que uma paz apenas pode começar a ser desenhada com a retirada - por força ou negociada - das tropas russas.
Para os negociadores de Paris, o projeto de uma cúpula de paz teria maior chance de prosperar entre os aliados ocidentais se Kiev estiver em uma posição de força, algo que as capitais ocidentais esperam que possa ocorrer nas próximas semanas.
Nesta sexta-feira, na reunião em uma base militar alemã, os aliados de Kiev sinalizaram com o envio de mais armas. A Polônia, por exemplo, criará um centro para atender os tanques de batalha Leopard que estão sendo enviados para a Ucrânia, disse o Ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksiy Reznikov.
"Hoje, assinamos a Carta de Intenções para o estabelecimento de um Centro de Manutenção e Serviço na Polônia para os principais tanques de batalha do Leopard 2 da Ucrânia. Ela contribuirá para o fortalecimento de nossa cooperação e das capacidades dos defensores ucranianos", disse Reznikov.
Já os Estados Unidos começarão a treinar as forças ucranianas sobre como usar e manter os tanques de Abrams nas próximas semanas.
Papel do Brasil
Diplomatas brasileiros estimam que o Brasil pode ter um papel, principalmente diante da capacidade que manteve de continuar a manter um canal de diálogo com o Kremlin. Fontes do mais alto escalão revelaram ao UOL que Moscou sinalizou que existe espaço para a diplomacia. Mas europeus e americanos terão de fazer "sua parte".
A última conversa entre Macron e Putin ocorreu em setembro de 2022, e Paris sabe que fazer chegar mensagens ao Kremlin hoje depende de vozes como a de Xi Jinping, do turco Recep Erdogan e do governo Lula. Não por acaso, os três governos foram contatados por parte de Paris.
A questão que ainda preocupa os emergentes é a persistência dos europeus e americanos e não considerar que, num plano de paz, as considerações russas terão de ser incorporadas, até mesmo para que haja um diálogo.
Também preocupa Pequim, Brasília e Ancara o fato de que americanos têm minado os esforços do secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, para negociar possíveis espaços para um cessar-fogo.
Ainda no ano passado, o UOL revelou que mediadores das Nações Unidas propuseram o seguinte plano:
- Transformar a Ucrânia num país armado, mas neutro. Ou seja, Kiev poderia ter seu exército, mas sem formar parte da OTAN.
- A região de Donbass permaneceria na Ucrânia, mas um grau mais elevado de autonomia seria garantido.
- Um congelamento da crise na Crimeia, anexada por Moscou em 2014. Ou seja, não haveria um reconhecimento internacional de que a região passa a fazer parte da Rússia. Mas não haveria um questionamento sobre o fato de que, na prática, a região está controlada e administrada por Moscou.
Entre os ocidentais, porém, uma das insistências em relação ao governo Lula é de que haja uma posição clara de que não existe como equiparar a responsabilidade de ucranianos e russos na guerra, como sugeriu o presidente brasileiro.
O Itamaraty nega que esteja minimizando a dimensão da agressão russa. Mas, para as capitais europeias, o Brasil precisa ser "consistente" nesse aspecto.
Desde que assumiu, Lula tentou construir seu espaço no debate fazendo gestos a ambos os lados.
- Votou ao lado de americanos numa resolução na ONU condenando a agressão dos russos contra a Ucrânia.
- Assinou uma declaração com Biden na qual condenava a agressão russa.
- Assinou declaração conjunta com o alemão Olaf Scholz apoiando a perspectiva da Europa na guerra.
- Disse que a Rússia fez erro histórico ao invadir a Ucrânia.
- Aceitou dialogar com Zelensky
- Amorim visitará Kiev.
Mas Lula deu sinalizações aos russos quando:
Votou ao lado de Moscou numa resolução no Conselho de Segurança pedindo uma investigação sobre a explosão do gasoduto no Mar do Norte.
Recebeu o chanceler Serguei Lavrov e não rebateu a declaração do russo de que os dois países têm a mesma perspectiva sobre a guerra.
Sinalizou apoio ao plano de paz chinês
Equiparou Ucrânia e Rússia na responsabilidade pela continuação do conflito
Disse que europeus e americanos prolongam a guerra.
Sugeriu que a retomada da Crimeia fosse abandonada pelos ucranianos.
Criticou as sanções impostas contra Moscou.
Segundo o jornal Le Monde, o "caminho para a paz" foi alvo dos debates entre Macron e Xi, numa viagem que ocorreu dias antes da chegada de Lula em Pequim e que foi considerada pelo Itamaraty como positiva para os objetivos do Brasil.
Os franceses ainda receberam o assessor especial do Planalto, Celso Amorim, para uma conversa com o conselheiro diplomático de Macron, Emmanuel Bonne. O francês ainda conversou com Wang Yi, ex-chanceler chinês
Não existe uma data para a cúpula desejada por Macron. Mas um dos esforços é o de permitir que, até meados do ano, os parâmetros da reunião possam ser estabelecidos. Na esperança, entre os franceses, que os ucranianos avancem militarmente.
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