Jamil Chade

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Reportagem

Eleição joga Espanha em incerteza política; extrema direita desaba

O Partido Popular, de direita, terminou em primeiro lugar nas eleições gerais deste domingo na Espanha e seu líder, Alberto Feijóo, reivindica que seja autorizado a assumir o governo. Mas o pleito foi encerrado sem uma definição clara e nenhum dos blocos políticos será capaz de formar uma maioria automática, o que impede o vencedor de simplesmente tomar posse.

Os socialistas do PSOE do presidente do governo, Pedro Sanchez, resistem à reivindicação de Feijóo e tentarão negociar um pacto com aliados. Se quiserem governar, porém, terão de fazer concessões fundamentais com grupos separatistas de regiões como Catalunha.

Os cenários, agora, apontam para uma negociação intrincada e uma incerteza que pode se arrastar por dias. Mas não se descarta a realização de um novo pleito se acordos fracassarem. A crise é de tal dimensão que alguns dos comentaristas ironizavam a situação: "maioria relativa para a direita, caos absoluto para a Espanha".

Extrema-direita desaba e perde 19 assentos

A eleição ainda marcou uma queda importante da extrema direita, que esperava chegar ao poder pela primeira vez desde o fim da ditadura de Francisco Franco. O resultado foi considerado como um alívio para líderes europeus, preocupados com o avanço desse movimento pelo continente.

Entre 2019 e 2023, o Vox perdeu 19 assentos no Parlamento, somando agora apenas 33 lugares.

A votação havia sido convocada depois que o governo socialista de Pedro Sanchez registrou uma dura derrota nas eleições regionais, há dois meses. Naquele momento, a extrema direita já havia multiplicado seu apoio e votos e fechou acordos com o PP. Nas regiões onde passou a fazer parte do governo, ela aboliu departamentos que lidam com meio ambiente ou certos aspectos de direitos humanos.

Mas a onda extremista não se confirmou na eleição nacional e a decisão da direita tradicional de fechar acordos com o Vox custou caro.

Em regiões como a Catalunha, o resultado ainda foi um claro "não" à entrada da extrema direita no governo central. Na opinião pública, passou a ser visto como incoerente por parte do PP buscar o voto do centro e, ao mesmo tempo, fechar acordos com os herdeiros do franquismo.

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Yolanda Diaz, vice-presidente do governo e líder da aliança de esquerda, foi a primeira a fazer alusão aos riscos da extrema-direita. "Neste país, tinha muita gente preocupada. Mas vamos dormir mais tranquilos. A democracia venceu", afirmou.

Em seu tradicional estilo, o líder da extrema direita, Santiago Abascal, alertou que Sanchez poderá governar agora com a ajuda de "comunistas, terroristas e golpistas". Ele ainda acusou as pesquisas de opinião de estarem "manipuladas", levando seu grupo a desmobilizar por supostos resultados positivos que poderiam ter nas urnas.

Mesmo assim, 3 milhões de espanhóis votaram pelo Vox.

Pedro Sanchez, em seu primeiro discurso após o anúncio dos resultados, rebateu a extrema direita afirmou que a Espanha mostrou ao mundo que é "uma democracia forte". "Somamos mais votos que há quatro anos", disse.

Enquanto isso, militantes e apoiadores socialistas gritavam diante da sede do PSOE o lema No pasarán, numa referência dos republicanos contra os fascistas durante a Guerra Civil. "O bloco de retrocesso fracassou", comemorou Sanchez.

Resultados

Para formar governo, uma coalizão precisa de 176 assentos no Parlamento Espanhol, algo que não obteve nem o partido no governo, o socialista PSOE, ou a direita tradicional do PP.

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Com 99,3% dos votos apurados, os resultados são:

Partido Popular - 136 assentos no Parlamento - 33% dos votos

Partido Socialista - 122 assentos - 31,7% dos votos

Vox - 33 assentos - 12,39% dos votos

Sumar (união de partidos de esquerda) - 31 assentos - 12,31% dos votos

Na prática, nem uma coalizão ampla de direita e nem de todos os partidos de esquerda conseguiram votos suficientes para formar uma maioria absoluta. Pelos resultados, os blocos se dividem da seguinte forma:

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Direita: 171 assentos

Esquerda: 172 assentos

Um partido catalão ainda somou sete lugares no Parlamento.

Considerando apenas a aliança entre os quatro principais movimentos políticos, o resultado seria:

PP e Vox - 169 assentos

PSOE e Sumar - 153 assentos

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Feijóo inicia negociação para formar governo e faz apelo aos socialistas

O Partido Popular esperava vencer o pleito por uma margem mais ampla, o que não ocorreu. Mesmo assim, por ter aumentado seu papel no Parlamento em 47 assentos desde 2019 e pela estagnação dos socialistas, o líder da direita insiste que ele teria a legitimidade para governar e que jamais um partido que chegou em segundo lugar na eleição saiu como o novo governo.

Não por acaso, em seu discurso nesta noite de domingo, ele insistiu que o PP "venceu as eleições" e que seria uma "anomalia" que o partido que saiu em primeiro lugar nas urnas não governe. O argumento é contestado pelos constitucionalistas espanhóis, que apontam que não se trata de um sistema presidencialista.

"Peço que o Partido Socialista que não bloqueiem o governo da Espanha", apelou o líder da direita. "Nossa obrigação é de que não se abra um período de incerteza para a Espanha. Meu dever é liderar o diálogo para tentar governar o país, de acordo com o resultado eleitoral, vamos começar a negociar", disse.

Mas, para formar governo, Feijóo terá um trabalho considerado como improvável.

Ele dependeria necessariamente da extrema direita, além de outros aliados. De fato, Vox -movimento ultranacionalista, racista, anti-LGBT — esperava se apresentar como uma peça fundamental para que a direita pudesse formar um governo. Mas a queda, em comparação aos resultados das eleições de 2019, surpreendeu seus dirigentes. Há quatro anos, o grupo obteve mais de 50 assentos no Parlamento. Mas não fez parte da formação do governo.

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Agora, o cenário político era outro e a Espanha, na avaliação de observadores, poderia ver a volta da extrema-direita no poder pela primeira desde o final da ditadura de Franco, nos anos 70. O grupo é ainda um dos principais aliados do bolsonarismo na Europa, com constante contato com Eduardo Bolsonaro.

Se Vox fizesse parte do governo, seria o quinto país europeu com a extrema direita no poder. Três deles estariam na coalizão de maioria.

Esquerda terá de negociar

Mas a esquerda contesta qualquer cenário neste sentido diante dos resultados e tentará, nos próximos dias, negociar apoio com outros partidos independentes para permitir que uma coalização mais ampla seja estabelecida. Neste caso, Pedro Sanchez poderia continuar governando.

Sua situação não será simples. Partidos catalães que podem ser aliados num novo governo socialistas alertaram que não abrirão mão de suas políticas, reivindicações e princípios.

Se não houver um acordo, porém, a Espanha poderá ter de convocar novas eleições.

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Ataques cibernéticos por grupo pró-russo

A eleição ainda foi marcada por ataques cibernético contra sites e mesmo páginas oficiais do Ministério do Interior, a Junta Eleitoral e outras instituições.

Num comunicado, o grupo pro-russo NoName Hacking Group, organização clandestina próxima ao Kremlin, alegou que os ataqueis ocorriam como resposta ao apoio da Espanha ao governo de Volodymyr Zelensky, na Espanha.

Autoridades espanholas chegaram a apontar que o ataque poderia ser o maior desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022.

Um caos nos serviços de transporte também ampliou as acusações mútuas entre os partidos, com a direita alegando que haveria uma conspiração do governo para evitar que eleitores pudessem chegar às urnas.

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