Pressão conservadora faz gigantes dos EUA fecharem programas de diversidade
O setor empresarial norte-americano vive uma onda de desmonte de políticas de diversidade, depois da eleição de Donald Trump e de decisões de uma Corte Suprema dominada por um movimento conservador.
Nas últimas semanas e meses, empresas como a Walmart, Ford, John Deere, Meta, Amazon e a Harley-Davidson já abandonaram parte de suas políticas de diversidade, assim como a Microsoft e Zoom.
Um dos casos mais emblemáticos ocorreu com McDonald's que, depois de quatro anos do anúncio de uma ampla política de diversidade, tomou a decisão em janeiro de 2025 e desmontar algumas das medidas. O anúncio foi justificado como uma resposta à decisão Suprema Corte dos EUA que proibiu a ação afirmativa em admissões universitárias, um gesto polêmico e que causou protestos de grupos minoritários pelo país.
Mas a decisão do Judiciário é de 2023 e, para observadores, o anúncio feito às vésperas da volta de Trump - um crítico das medidas de diversidade - revela uma nova tendência.
No caso do McDonald's, o que deixa de ser uma meta é a garantia de uma diversidade nos níveis de comando da empresa. Nos EUA, 70% dos cargos de chefia estão nas mãos de homens brancos. Uma em cada sete dessas empresas ainda tem equipes executivas compostas exclusivamente por homens brancos.
Programas de treinamento sobre diversidade para fornecedores também serão abolidos. A divisão responsável por assegurar a diversidade na empresa também muda de nome e passa a ser chamada de "Equipe de Inclusão Global".
Já o anúncio da Meta, de Mark Zuckerberg, foi feito dias após a empresa anunciar que desativaria seus mecanismos de moderação em suas plataformas digitais, como Facebook e Instagram.
Ao explicar a mudança de política, Janelle Gale, vice-presidente de recursos humanos da Meta, disse que o "cenário jurídico e de políticas em torno dos esforços de diversidade, equidade e inclusão nos Estados Unidos está mudando".
Na semana passada, Zuckerberg criticou empresas que procuraram se distanciar da "energia masculina". Para ele, seria positivo que uma cultura "celebre um pouco mais a agressividade".
Ainda no ano passado, a Tractor Supply, maior varejista de estilo de vida rural dos EUA, anunciou que deixaria de patrocinar atividades como "festivais de orgulho" e que "aposentaria metas atuais de diversidade". "Ouvimos dos clientes que os decepcionamos", justificou a empresa.
Em agosto do ano passado, o CEO da Ford, Jim Farley, anunciou em uma mensagem aos seus funcionários que a mudança de suas políticas de diversidade. Além disso, encerrou a participação em pesquisas externas de cultura da Human Rights Campaign, um grupo de defesa da causa LGBTQ+.
Nesta semana, a entidade National Center for Public Policy Research (NCPPR) submeteu uma proposta formal para que os acionistas da Apple abandonem os programas de igualdade e diversidade na empresa. O voto está marcado para o dia 25 de fevereiro.
O conselho da empresa é contra o fim dos programas. Mas o embate revela a reviravolta vivida entre as maiores empresas americanas.
Para a NCPPR, a gigante da tecnologia deveria abolir suas políticas, afirmando que elas expõem as empresas a "litígios e riscos financeiros e de reputação".
Outra que tenta resistir é a Costco, que também enfrenta um voto de seus acionistas para acabar com os programas no próximo dia 23, três dias depois da posse de Trump.
Pelo país, o que se registra é ainda um movimento de ativistas conservadores que ameaçam boicotes e de grupos como o Wisconsin Institute for Law & Liberty, que têm contestado ativamente os programas de diversidade, com ações judiciais.
"Masculinidade" foi explorada por Trump em campanha
A onda conservadora nas empresas não se limitou ao setor econômico. Ainda em 2024, uma pesquisa assustou o campo democrata nos EUA: 63% dos homens brancos sem nível universitário votariam em Donald Trump na eleição. Segundo analistas e levantamentos feitos por organismos americanos, a chave para entender esse êxito do republicano está, em parte, na sua capacidade de transformar o que seria uma frustração do homem branco americano em votos.
O movimento liderado por Trump tentou mobilizar um segmento da população que vive uma encruzilhada diante da transformação do debate público sobre gênero, independência financeira das mulheres e a ofensiva antirracismo. Esse mesmo grupo atravessa o que é apresentado como uma "ansiedade financeira" diante de um modelo econômico incapaz de reduzir as desigualdades sociais.
Para Richard Reeves, presidente do American Institute for Boys and Men, esses americanos que viram seu status social ruir sentem que estão sendo mais ouvidos pelos republicanos, em uma crise que é em parte de percepção e, em parte, de perda de poder.
Na era pós-MeToo, a conversa sobre a masculinidade nos EUA é também política e, na avaliação do instituto, esses homens brancos se sentem "desabrigados".
Reeves não é um reacionário. Seu livro publicado sobre o tema, em 2022, foi a leitura de verão de Barack Obama. No começo de 2023, Melinda Gates destinou US$ 20 milhões para as pesquisas de seu instituto.
Mas a campanha republicana instrumentalizou essa crise e usou o exemplo de Trump como um espelho para essa população. Depois de ser humilhado, agora ele volta ao topo do poder. Sem desculpas.
164 comentários
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Daniel de Castro Ribeiro
empresas, seja qual for, não são ONGs de caridade, elas visam lucro para os seus donos e acionistas, portanto a entrada de funcionários deve ser pela suas qualificações e habilidades, não por imposição de qualquer tipo de cota.
Teobaldo Alberto Wilsmann
Ótimo começo. Viva a competência e a Meritocracia
Roberto Luiz Carvalho Alves Junior
Enfim o MIMIMI vai se apagando. O Capitalismo é implacável...