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Opinião

Partidos anistiam a si mesmos, e prestação de contas vira faz de conta

Descrição da emenda da anistia partidária faz de tudo para não chamar anistia de anistia; é o me-engana-que-eu-gosto. Diz a ementa (resumo) da proposta original que foi aprovada:

"Impõe aos partidos políticos a obrigatoriedade da aplicação de recursos financeiros para as candidaturas de pessoas pretas e pardas; estabelece parâmetros e condições para regularização e refinanciamento de débitos de partidos políticos; e reforça a
imunidade tributária dos partidos políticos conforme previsto na Constituição Federal."

O que aconteceu?

Partidos não destinaram o dinheiro dos bilionários fundos partidário e eleitoral - ou seja, dinheiro meu, seu, nosso - para candidaturas de mulheres e negros na proporção prevista em lei e pelas normas do Tribunal Superior Eleitoral;

Partidos não pagaram tudo o que devem à Previdência Social;

Partidos também não cumpriram todos os ritos obrigatórios para suas prestações de contas;

E daí?

CCJ aprovou anistia por votação simbólica e, imediatamente, o presidente da comissão, Davi Alcolumbre, pediu regime de urgência para aprová-la em plenário; pode ocorrer hoje ou amanhã, pois já há acordo para aprovação;

Transparência Partidária estima que anistia chegue a 23 bilhões de reais se forem consideradas as prestações de contas entre 2018 e 2023 que ainda não foram julgadas;

A proposta de emenda constitucional já foi aprovada na Câmara em julho, com apoio de todos os partidos, menos PSOL e Novo;

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Se passar no Senado, será promulgada pelo Congresso (emendas constitucionais não precisam de sanção presidencial);

Com isso, as novas regras podem valer já para esta eleição municipal de 2024.

Quais são os novos privilégios aos partidos?

Entre outras coisas, a PEC da anistia partidária prevê:

15 anos para partidos pagarem multas eleitorais

5 anos para partidos pagarem o que devem à Previdência

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reduz verbas para candidaturas de pessoas negras para 30% dos fundos partidário e eleitoral (foram 50% e 46% nas últimas duas eleições, porque proporcionais às candidaturas)

Ou seja?

A emenda da anistia partidária cria novos e despropositados privilégios para a instituição que é vista com mais desconfiança pela população.

Entre 20 instituições que têm seu grau de confiança medido anualmente pelo Ipec (antigo Ibope), os partidos políticos ocupam a última colocação desde que a pesquisa começou a ser feita em 2009. Atualmente, sua confiança é de 33 pontos, numa escala que vai de 0 a 100. Esse índice chegou a ser 16 no ano da eleição de Bolsonaro presidente, subiu na pandemia (30) e no primeiro ano do governo Lula (34), mas voltou a cair em 2024.

Após o auge da era antipolítica - começa com os protestos de 2013, se acentua com a Operação Lava Jato e tem seu auge entre o impeachment de Dilma Rousseff e a eleição de Bolsonaro (2015 a 2018) -, os partidos políticos fisiológicos ganharam novo impulso após o fracasso de Bolsonaro e alcançaram um nível de poder inédito nos últimos anos.

O chamado Arenão (PP, União Brasil, PSD, MDB, PRP, mas também grande parte do PL) ganhou força sob a liderança de Arthur Lira na presidência da Câmara, se uniu para emparedar o governo Lula e abocanhar uma fatia de quase R$ 50 bilhões do orçamento da União. O grupo se rebelou também contra o Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal e o TSE.

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A aprovação da emenda da anistia partidária é também uma demonstração do avanço do desejo do Congresso se impor como o principal poder entre os poderes da República.

O Análise da Notícia vai ao ar às terças e quartas, às 13h e às 14h30.

Onde assistir: Ao vivo na home UOL, UOL no YouTube e Facebook do UOL.

Veja abaixo o programa na íntegra:

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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