Bolsonaro flerta com a versão fiscal do 'e daí?'
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Um pedaço da equipe de Paulo Guedes receia que Jair Bolsonaro reaja às adversidades da conjuntura política subvertendo a prioridade do Ministério da Economia. Avalia-se que as repercussões da eleição municipal elevaram o risco de Bolsonaro sacrificar a opção retórica pelo equilíbrio das contas públicas por um populismo eleitoreiro de consequências nefastas.
As urnas municipais submeteram Bolsonaro a um choque de realidade. O eleitor premiou o que o presidente negligenciou. Junto com os prefeitos mais bem avaliados foram reeleitos o apreço à vida, o gosto pela moderação e o desejo de obter resultados práticos.
Na bica de completar dois anos no poder, Bolsonaro acabou de tachar de "conversinha" o risco de uma segunda onda de Covid. Reabriu a indústria da raiva. E ainda não suou a camisa para levar à vitrine privatizações e reformas econômicas tidas por Guedes e sua equipe como vitais.
O alarme da impopularidade voltou a tocar nos grandes centros urbanos. De acordo com o Datafolha, a rejeição a Bolsonaro entre os paulistanos subiu dois pontos, batendo em notáveis 50%. A aprovação junto aos cariocas ruiu seis pontos, estacionando em 28%.
O grande pavor é o de que Bolsonaro decida criar uma versão fiscal do célebre bordão "e daí?". Nessa hipótese, o presidente mandaria às favas o teto de gastos para engordar o Bolsa Família ou colocar em pé um programa de renda mínima para substituir o auxílio emergencial que acaba na virada do Ano Novo.
As mesmas urnas que encolheram Bolsonaro aumentaram o poder de fogo dos partidos do centrão e adjacências. Há algumas providências que o presidente poderia adotar em vez de se entregar ao negacionismo fiscal. Entre elas condicionar as verbas e os cargos cedidos ao centrão à aprovação de duas ou três reformas.
De resto, se Bolsonaro se dedicar a atividades menos estéreis do que fazer oposição a si mesmo, talvez lhe sobre tempo para tarefas menores como, digamos, trabalhar. Do contrário, o presidente logo descobrirá que a popularidade de um governante é como o amor do Soneto de Fidelidade, de Vinicius de Moraes: não é imortal, posto que é chama. É infinita enquanto dura.
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