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Bolsa-saúde de deputado evolui para desfaçatez
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Os bons dicionários de língua portuguesa trazem mais de 430 mil vocábulos. Numa língua tão rica de significados, há uma palavra mal empregada: contribuinte. Num sentido literal é aquele que contribui. Na prática, significa que o fisco arrancará o que puder à força, e depois chamará o cidadão de "contribuinte". A palavra começa a perder o sentido na hora em que o dinheiro é arrancado do bolso do seu dono. E o significado pode se desvirtuar por completo quando o dinheiro é aplicado. Há no Estado muita gente confundindo verba pública com dinheiro grátis.
Por exemplo: deputados e senadores já desfrutam de todas as facilidades médicas e hospitalares que o déficit público pode pagar. E o presidente da Câmara, Arthur Lira, achou que seria uma boa ideia reajustar, em plena pandemia, os valores do reembolso das despesas médicas dos deputados. Passou de R$ 50 mil para R$ 135,4 mil. Repetindo: num instante em que faltam leitos e sedativos para pacientes de covid, o Bolsa-Saúde dos deputados foi reajustado para R$ 135,4 mil. Um salto de 170%.
Se o tratamento for mais caro, será pago do mesmo jeito, pois a Mesa diretora da Câmara costuma avalizar o pagamento de gastos acima do teto. Em 2019, quando o teto ainda era de R$ 50 mil, a Câmara pagou com dinheiro dos hipotéticos contribuintes uma recauchutagem dentária do deputado Marco Feliciano de R$ 150 mil. Em português claro, a Câmara autoriza qualquer despesa médica ou odontológica. A coisa é ainda mais generosa no Senado. Ali, a proteção de saúde ultrapassa as fronteiras do mandato.
Na outra ponta, onde está situada a clientela pobre do Estado, o programa Farmácia Popular passa por um processo de emagrecimento. Em 2020, foram beneficiados algo como 20 milhões de doentes, 1,2 milhão a menos do que no ano anterior. Deixaram de ser atendidas com medicamentos vitais pessoas do grupo de risco do coronavírus. Gente com hipertensão, diabetes e asma, por exemplo.
Esse tipo de descaso eleva a cobertura das despesas médicas dos parlamentares do patamar de mero absurdo para a categoria do descaramento. Privilégios como o Bolsa-Saúde dos parlamentares, quando são institucionalizados, viram religião. Mas o suposto contribuinte não diria amém se pudesse opinar sobre a falta de vergonha na cara.
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