Poderes mudam status das emendas sem bulir no quo
O escritor italiano Giuseppe Tomasi di Lampedusa, autor do romance "O Leopardo", cunhou o raciocínio segundo o qual algo precisa mudar para que tudo continue como está. Foi mais ou menos o que aconteceu na negociação intermediada pelo Judiciário, para tentar promover entre Legislativo e Executivo um acordo capaz de colocar um fim na farra das emendas parlamentares.
Foram à mesa de almoço servido no Supremo três encrencas: 1) O valor exorbitante das emendas —coisa de R$ 53 bilhões em cifras de 2024—, 2) a pulverização das verbas em projetos de serventia duvidosa, e 3) a transparência dos gastos. No gogó, houve avanço em relação ao último item. Decidiu-se acender a luz no porão das emendas, identificando todos os projetos e os autores dos repasses.
Quanto ao valor, ficou entendido que o Congresso não quer gastar mais. Nem menos. Pagamentos que eram impositivos continuarão obrigatórios. Sobreviveram todas as modalidades de emendas —as individuais, as de bancada e as de comissão. Até as emendas Pix continuarão caindo direto na conta das prefeituras, desde que o objeto do gasto seja identificado, assegurando-se a fiscalização do TCU.
Em relação à fragmentação das despesas, concedeu-se um prazo de dez dias para que Congresso e Planalto refinem o acordo. Se funcionar, as emendas de bancada serão destinadas a projetos estruturantes nos estados. Faltou definir estruturante. E as emendas de comissão passarão a azeitar obras de interesse nacional e regional, com a hipotética participação do governo na definição dos gastos.
Enquanto aguarda pela finalização do acerto, o Supremo mantém em vigor a suspensão do pagamento das emendas. Aplicando-se à negociação a expressão do Latim status quo, que significa "o estado das coisas", pode-se dizer que os três Poderes mudaram o status das emendas sem bulir muito no quo.
Em essência, a única certeza disponível é que o contribuinte brasileiro continua entrando na equação com o bolso, sem ter muita certeza sobre a eficácia e a probidade do uso do seu dinheiro. Há nos escaninhos do Supremo algo como duas dezenas de inquéritos sobre desvios na aplicação de verbas liberadas por meio das emendas parlamentares.
De resto, continua de pé a ordem de Flávio Dino para que a Controladoria-Geral da União esquadrinhe em 90 dias a execução das emendas Pix, isentas de projetos e de fiscalização. Se a investigação for levadas às últimas consequências, a mesa de almoço logo será substituída pelo patíbulo.
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