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Leonardo Sakamoto

Hoje, segundo turno. Amanhã, o dia da ressaca da covid-19 pelo Brasil

Funcionários durante entrerro no cemitério da Vila Formosa na zona leste de São Paulo - MARCELLO ZAMBRANA/ESTADÃO CONTEÚDO
Funcionários durante entrerro no cemitério da Vila Formosa na zona leste de São Paulo Imagem: MARCELLO ZAMBRANA/ESTADÃO CONTEÚDO

Colunista do UOL

29/11/2020 09h57

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Hoje, ocorre o segundo turno para a escolha do comando de 57 municípios, mobilizando 38 milhões de eleitores. A partir de amanhã, ficaremos sabendo em quais locais os políticos seguraram a adoção de medidas mais duras contra o coronavírus diante do crescimento da pandemia para que seus aliados vencessem ou para que eles mesmos fossem reeleitos.

A taxa de ocupação de UTIs por pacientes com covid-19 em hospitais particulares e públicos disparou em várias regiões do país. Em alguns lugares, restam poucos leitos. Mas a impressão é de que o Brasil vive um cenário de normalidade, endossado pelo momento eleitoral. E não só pelo desrespeito às regras sanitárias, praticadas por quase todos os candidatos, da esquerda à direita, mas pelo quadro atual de inação da administração pública.

Apesar de contarmos com um presidente da República que primeiro menosprezou, depois negou e, por fim, se associou ao vírus, era alvissareiro que boa parte dos prefeitos e governadores tivessem formado uma espécie de "barreira sanitária" à necropolítica de Jair Bolsonaro. Adotaram medidas corretas nos momentos certos e impediram que a catástrofe fosse maior.

Que uma parte da população estivesse cansada das quarentenas e do isolamento social e mandasse para a glória os cuidados, era esperado. Nunca conseguimos estabelecer um lockdown real, apenas quarentenas imperfeitas, também porque tivemos o governo federal jogando contra. Isso alongou demasiadamente o tempo de isolamento social e aprofundou a crise econômica. Da mesma forma, era esperado que uma parte dos candidatos "flexibilizasse" as restrições por conta própria e se aglomerassem com seus eleitores. 

Mas isso não dá aos governadores e prefeitos autorização para agirem como cidadãos irresponsáveis, como candidatos em busca de voto ou como um presidente que só pensa em si. Muito menos colocar suas necessidades políticas acima da qualidade de vida de milhões de pessoas.

Algumas cidades na Europa tiveram protestos de rua quando falaram da imposição de novas quarentenas rígidas. Mesmo a limitação do lazer por aqui, com o calor que está fazendo em boa parte do país, teria claros ônus eleitorais.

A Prefeitura de São Bernardo do Campo (SP), por exemplo, voltará a endurecer as regras para comércio e serviços - o que limitará o funcionamento de bares e academias e suspenderá teatros e cinemas. Pelo Plano São Paulo, que trata de reabertura, o município segue na fase verde - a segunda menos restritiva. Dependendo dos indicadores, deveria estar na fase laranja - a segunda mais severa.

O prefeito Orlando Morando (PSDB) foi reeleito no primeiro turno, em 15 de novembro, derrotando Luiz Marinho (PT), sem precisar de segundo turno. Estava livre, portanto, dessa preocupação. Mas outros tantos, de diversos partidos, não estão. E, pelo jeito, fizeram a opção de empurrar com a barriga.

João Gabbardo, coordenador executivo do Centro de Contingência ao Coronavírus em São Paulo, afirmou que foi recomendado a João Doria a adoção de medidas mais restritivas. O governador paulista decidiu esperar a data marcada para a revisão das fases. Amanhã, um dia após a eleição.

Independentemente de quem sejam os eleitos nas 57 cidades, esperamos que políticos estejam preparados. Não para as críticas que virão contra alguns deles diante da constatação de que dobraram a saúde pública em nome de seus interesses. Mas da ressaca de um vírus que não respeita, nem obedece o tempo da política. Afinal de contas, ele é um vírus.