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Leonardo Sakamoto

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Ao encher igrejas, Kassio reforça apoio de grupos religiosos a Bolsonaro

Culto da Igreja Mundial reune grande quantidade de fieis na Páscoa - Reprodução/YouTube
Culto da Igreja Mundial reune grande quantidade de fieis na Páscoa Imagem: Reprodução/YouTube

Colunista do UOL

05/04/2021 03h38

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Mesmo que a decisão do ministro Kassio Nunes Marques de liberar missas e cultos presenciais em meio à escalada de mortes da pandemia seja revertida pelo plenário do Supremo Tribunal Federal em breve, ela já cumpriu o papel de ajudar o presidente da República a reforçar o apoio junto ao naco religioso de sua base no momento em que cai sua aprovação.

Para além do dízimo, há líderes evangélicos e católicos conservadores que precisam manter igrejas e templos abertos nesta fase crítica para mostrar que a teologia que vendem não é uma ilusão e, portanto, quem vier a eles estará seguro. O discurso conforta muita gente que está em desespero.

O mais irônico é que a bíblia não pede para os cristãos confiarem apenas na fé, mas que se cuidem também. São famosas algumas orientações sanitárias e de higiene pessoal no livro de Levítico - que sugere até isolamento social, como no capítulo 14, versículo 8. E o que é o aviso, no livro do Êxodo, para que todos fiquem em casa durante a décima e última das pragas do Egito, a morte dos primogênitos, se não um lockdown?

Como resultado do ato irresponsável de Nunes Marques, a fatura de mortes de quem se aglomerou em igrejas e templos no feriado prolongado de Páscoa chegará em algumas semanas. Ou, pior: mortes de seus familiares, colegas de trabalho, empregados - que apesar de terem tomado todos os cuidados, serão infectados indiretamente.

Pragmático, o bolsonarismo não está preocupado com a contagem de óbitos, mas com as pesquisas de opinião.

Com a popularidade em queda por conta da falta de vacinas em número suficiente (o que atrasou o fim da doença) e da demora no retorno do auxílio emergencial (o que gerou mais fome), Jair Bolsonaro precisa estreitar laços com os grupos simpáticos a ele para manter um colchão de proteção. Vem fazendo isso, por exemplo, com os policiais militares, jogando-os contra governadores que adotam medidas de isolamento social.

O acordo de leasing com o centrão, no Congresso Nacional, será mantido desde que a aprovação do presidente não derreta. Deputados e senadores não arriscariam sua sobrevivência eleitoral, em 2022, sacrificando-se pelo negacionismo dele.

Com a sinalização de que os aliados de Bolsonaro, como o ministro Nunes Marques, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, André Mendonça, tentam garantir o funcionamento presencial de missas e cultos, Bolsonaro se vende como alguém que luta por esses grupos religiosos. Para que não haja dúvidas, reforça isso em lives e nas redes sociais.

Por conta da certa revisão da decisão pelo plenário do STF, a abertura terá vida curta - tal como parte daqueles que aproveitaram para procurar Deus em locais consagrados nesta Páscoa quando ele, na verdade, já estava na casa de cada um.

Mas os dias serão bem aproveitados pelas lideranças religiosas (neste domingo, algumas igrejas lotadas, grandes e pequenas, usavam como única medida de prevenção a oração), que usarão novamente o argumento de que o "demônio" dificulta Jair Messias de governar quando o fechamento voltar. O que vai ser suficiente para o marketing, inclusive junto à bancada do fundamentalismo religioso.

Ministro do STF, líderes religiosos, presidente da República batem no peito, se dizem cristãos e mandam as pessoas para o abatedouro, aproveitando-se de sua fé em nome de seus interesses. Infelizmente, a história do cristianismo está repleta de pessoas assim, que distorcem as ideias presentes no Novo Testamento porque, sinceramente, nunca entenderam de verdade o que o nazareno quis dizer.