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Justiça condena banco Santander a pagar R$ 275 milhões por assédio moral
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A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região manteve a condenação do banco Santander, que terá que pagar indenizações que totalizam R$ 275,4 milhões por danos morais coletivos em razão de metas abusivas, adoecimentos mentais e práticas de assédio moral aos empregados.
As condenações são decorrentes de duas ações civis públicas movidas pelo Ministério Público do Trabalho contra o banco, que haviam sido julgadas parcialmente procedentes pelo juiz Gustavo Chehab, da 3ª Vara do Trabalho de Brasília. A decisão do TRT, tomada pela maioria da turma, é da última sexta (15).
Em nota enviada à coluna, o Santander afirma que irá recorrer e acredita que a decisão será reformada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A empresa diz que "recebeu com surpresa a decisão, visto que os julgadores reconhecem as práticas da instituição no combate a qualquer tipo de assédio ou discriminação, como, aliás, já havia feito o juiz de primeiro grau".
Em seu voto, o desembargador relator, Dourival Borges de Souza Neto, afirma que "os diversos depoimentos transcritos na sentença dão nítida ideia do abalo emocional e psíquico impingido pela sistemática organizacional de fixação de metas de produção, mediante cobrança truculenta pelos gestores, seja diretamente ao empregado ou por meio de reuniões com exposição vexatória, cujas metas deveriam ser cumpridas a todo custo".
Segundo ele, "tais práticas impingiram os empregados a cometer atos irregulares para garantir a todo custo o cumprimento das metas, como comprar para si produtos do banco ou mesmo se aproveitar 'da boa-fé de clientes idosos pediram para ele comprar determinado produto e após o idoso assinar aumentavam a quantidade'".
Em sua avaliação, "os relatos prestados noticiam o grande número de empregados que foram acometidos de doenças mentais, transtornos psíquicos, síndrome do pânico, estresse e depressão".
O desembargador Grijalbo Coutinho afirmou, em seu voto, que "as provas produzidas revelaram a ocorrência de tratamento humilhante, inadequado e discriminatório no meio ambiente de trabalho".
"Na solução da presente controvérsia, interessa, antes de tudo, o bem-estar das pessoas e o respeito ao conjunto de atributos morais e éticos preservadores da dignidade humana, o que não foi observado pelo Banco Santander", avaliou o magistrado. "Não é possível fechar os olhos para a dura e crua realidade das relações de trabalho no Brasil, algo incompatível com qualquer ordem jurídica amparada em princípios democráticos."
Além do pagamento da indenização, que será revertida à coletividade, a decisão obriga o banco a não permitir, tolerar ou praticar, por seus gestores e prepostos, práticas que configurem assédio moral, como humilhações, xingamentos, ameaças de demissões, constrangimentos, coação, agressão e perseguição.
O Santander, em sua nota, "destaca o fato de a decisão não ter sido unânime, ou seja, dois juízes votaram para absolver inteiramente o banco da condenação".
Ambas decisões têm aplicação em todas as agências e em relação a todos os empregados do Santander no Brasil.
Ação inicial do MPT pedia indenização de R$ 460 milhões ao Santander
O Ministério Público do Trabalho ajuizou duas ações civis públicas contra o banco, em 2014 e 2017, após inquéritos civis mostrarem a pratica de assédio moral e outras violações aos direitos dos bancários. A condenação em primeira instância ocorreu em 2019.
Na ação de 2017, o Ministério Público do Trabalho demandou indenização no valor de R$ 460 milhões do Santander por danos morais coletivos. Afirmou que o banco adotava um modelo de organização do trabalho de seus empregados baseado na gestão por estresse e em assédios morais visando ao cumprimento de metas.
Segundo a ação civil pública, o banco adotava metas excessivamente elevadas e as aumentava constantemente, aplicando cobranças excessivas e sobrecarga de trabalho, mantendo empregados sob ameaça constante de demissão pelo não cumprimento das metas e descontando da produtividade quando clientes realizavam saques em aplicações financeiras.
Esse modelo de metas abusivas, de acordo com o MPT, tem levado a prejuízos também aos consumidores - que acabam sendo vítimas de vendas casadas "empurradas" ou outras práticas ilegais.
Empresas do sistema financeiro têm afirmado nesse tipo de ação que como as metas são aplicadas à parte variável do salário, que seriam um complemento, uma forma de bônus, e não à parte fixa da remuneração, o seu cumprimento não é obrigatório, mas facultativo. Uma das justificativas dadas para mostrar que isso não se configura assédio é que as metas aplicadas à parte variável se aplicam a todos os cargos, inclusive diretorias.
De acordo com o MPT, a política do banco teria causado danos à saúde de trabalhadores e ao erário público, pois afastamentos teriam representado um prejuízo milionário à Previdência Social.
'Pensado em dar fim à sua vida'
A ação civil pública traz uma avaliação psicológica realizada a pedido do MPT em agências do banco que concluiu que os bancários se encontram em níveis de sofrimento extremo em decorrência da organização e das condições do trabalho.
Em uma delas, de acordo com a ação, 43% dos empregados declaravam que "tem pensado em dar fim à sua vida". Outros resultados para a mesma agência eram: 43% sentiam-se inúteis em sua vida, 86% tinham dificuldade de pensar claramente e de tomar decisões, 100% sentiam-se tristes, 86% dormiam mal, 100% sentiam-se nervosos, tensos e preocupados, 86% assustavam-se com facilidade e 43% tinham tremores nas mãos.
A conclusão presente nos autos de infração lavrados pelos auditores fiscais do trabalho é de que "o estabelecimento de metas praticamente impossíveis de serem atingidas, seguido da cobrança pelo atingimento destas metas pelos superiores (...) trará a curto e médio prazo danos graves e irreparáveis à saúde dos bancários do Santander".
A aplicação de questionário para avaliação de condições de trabalho e saúde de bancários em uma outra agência apontou o seguinte resultado: 88% acreditavam que a meta de produtividade era excessiva; 66% sentiam-se muito fatigados ou sentiam pressão excessiva; 55% afirmavam que o cumprimento da meta prejudicava a sua saúde e a sua vida social; 100% tinham sentido, nos últimos seis meses, ansiedade em relação ao trabalho; 66% diziam que a cobrança era excessiva ou gerava constrangimento; 44% tinham sentido, nos últimos seis meses, dificuldades para dormir; 33% tinham tomado, nos últimos seis meses, remédios para ansiedade ou para dormir.
A ação trouxe depoimentos de empregados do banco colhidos em um inquérito civil pelo Ministério Público do Trabalho. Em uma das agências, um deles afirmou que o coordenador estava afastado em razão de tentativa de suicídio e acreditava que isso estava relacionado às condições de trabalho, uma vez que o coordenador não conseguia chegar perto de sua agência bancária.
Outro disse que pensava em bater a meta do momento em que acordava até quando dormia e que passou a apresentar problemas de saúde como distúrbios do sono, alteração do apetite, ansiedade, gastrite, síndrome do intestino irritado, crise de enxaqueca, crise de labirintite. Até que recebeu diagnóstico de depressão e síndrome do pânico, afastando-se, inicialmente, dez dias. Quando retornou, trabalhou por dez dias até teve uma crise de pânico durante o expediente.
Mais um informou que chegou a realizar operações bancárias para si próprio, visando atingir a meta. Para ele, o banco realizava cobranças excessivas sem assegurar condições para o cumprimento das exigências. Ele informou que, em razão das condições de trabalho, o gerente de pessoa jurídica de sua agência se afastou para tratamento de saúde, com diagnóstico de síndrome do pânico e depressão.
Outra depoente revelou que conseguia atingir as metas, mas trabalhava adoentada e que, na agência, todos os bancários estavam sob intensa pressão. Segundo ela, o gerente geral ameaçava de demissão em razão do não cumprimento das metas usando termos como "eu também sou cobrado", "lá fora não está bom", "não era o pior emprego do mundo". Para cumprir a meta de venda de produtos bancários, ela vendia aos sábados e domingos, em eventos sociais particulares, como churrascos.