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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Defesa de Bolsonaro confunde maçã com abóbora ao focar em minuta golpista

Colunista do UOL

22/06/2023 12h21

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Jair Bolsonaro, seus aliados e advogados estão tentando vender a tese de que o Tribunal Superior Eleitoral não poderia ter anexado uma minuta golpista encontrada na casa de seu ex-ministro Anderson Torres no processo que pode torna-lo inelegível e começou a ser analisado nesta quinta (22). A tática não vai mudar nada pois compara duas coisas diferentes, mas deve ajudar na vitimização do ex-presidente.

Ele está sendo julgado por fazer uma micareta golpista no Palácio do Alvorada a fim de contar mentiras sobre a urna eletrônica para embaixadores estrangeiros, em uma espécie de ato de campanha eleitoral que usou, ilegalmente, usando a estrutrura do Estado e, portanto, dinheiro público.

Aproveitando que a imprensa estava em peso no Senado Federal para a sabatina de Cristiano Zanin ao cargo de ministro do STF, Bolsonaro deu as caras por lá nesta quarta. Disse que no julgamento da chapa Dilma-Temer ficou definido que novas provas não poderiam ser agregadas ao processo e, portanto, no caso dele também não.

"A ação contra mim é exatamente igual à chapa Dilma-Temer. Novos fatos foram apensados à minha ação. A partir do momento em que o TSE aplicar a jurisprudência para o meu caso, por coerência, no meu entender, tem que ser assim, a acusação contra mim, por se reunir com embaixadores, se torna frágil", alegou.

Contudo, a lei permite ao juiz conhecer fatos ocorridos ou revelados depois de a ação ser proposta. O Tribunal Superior Eleitoral havia decidido que não se pode usar essa norma para criar uma ação nova dentro de uma que já existe, mas apenas para trazer fatos relacionados com a "causa de pedir" - o conjunto de fatos expostos na demanda e instrumentalizados na petição inicial.

O que ocorreu na Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) da chapa Dilma-Temer? Havia uma ação sobre abuso de poder econômico em que se alegou que partidos teriam lavado dinheiro de propina através de doações declaradas em 2012 e 2013.

E, por conta disso, tentou-se enxertar uma alegação de caixa 2 no julgamento da eleição de ambos em 2014. Os fatos não têm nenhuma relação entre si, sendo duas coisas autônomas. Dessa forma, o caixa 2 foi desconsiderado e excluído. A chapa acabou sendo inocentada e Temer seguiu presidente.

Isso é diferente do que ocorreu em 2022. Na presente ação, a denúncia apresentou que a reunião com embaixadores disseminou desordem informacional sobre as urnas como estratégia para inflamar o eleitorado e incitar descrédito no resultado. Isso teria ocorrido como parte de um plano de caráter golpista por parte de Bolsonaro.

A minuta encontrada na casa de Anderson Torres foi acrescentada ao processo sob a justificativa de que ela mostrava aonde essa movimentação toda foi parar. Ou seja, há uma correlação estrita.

Se isso vai ser aceito no mérito do julgamento, é outra coisa. O que importa aqui é ver se a reclamação de Bolsonaro de que não há conexão faz sentido. E não faz.

É a mesma tese sendo aplicada, mas com duas situações bem diferentes.

A defesa de Bolsonaro está apostando todas as fichas em insistir nessa comparação. Mas o que não conta é que não está comparando maçã com maçã, mas maçã com uma abóbora.

E há quem engula a salada de fruta bolsonarista, afirmando que se o documento permanecer (o que foi definido no curso do processo pelo colegiado no início deste ano), o TSE estaria mudando a jurisprudência. E, portanto, abrindo caminho para anular o processo. Mas o ministro relator Benedito Gonçalves está bem resguardado quanto a isso.

Do ponto de vista prático, a argumentação usada por Bolsonaro, aliados e defensores não deve ter efeito prático no tribunal. Servirá apenas para alimentar seguidores radicais quanto à narrativa de que o ex-presidente está sendo vítima de grande injustiça. O que ajuda a manter o rebanho próximo do seu pastor.