Leonardo Sakamoto

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Opinião

Queda na aprovação de Lula na economia acende sinal de alerta para 2026

A avaliação positiva do governo Lula passou de 40%, em fevereiro de 2023, para 35%, em fevereiro de 2024, enquanto a negativa foi de 20% para 34% no mesmo período. Dois fatores são apontados pela pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta quarta (6), um crescimento na insatisfação entre os evangélicos e a percepção geral sobre a economia. O segundo ponto deveria acender um sinal de alerta para a comunicação do governo.

O descontentamento de evangélicos com as declarações de Lula sobre Israel por conta do conflito em Gaza são conjunturais e devem perder força em algum momento. Vai ser substituída por outra polêmica, certamente, uma vez que o bolsonarismo usa parte desse grupo demográfico como seu aríete.

Mas se a percepção sobre a economia estivesse melhor entre os evangélicos, principalmente os da classe média baixa, eles próprios estariam menos críticos ao governo.

O IPCA, a inflação ao consumidor, freou, registrando 4,62% no ano passado - ficando abaixo do teto da meta pela primeira vez em dois anos. Em 2022, ela foi de 5,79% e, em 2021, 10,06%. Houve queda significativa em itens como carne - apesar do mimimi bolsonarista, a picanha caiu sim, em média, segundo o IBGE, no ano passado.

Mas, tirando a Faria Lima, ninguém come teto de meta. No geral, os preços se mantiveram em patamares elevados após as altas dos últimos anos. Isso sem contar os aumentos conjunturais devido ao clima horroroso. As perdas para a agricultura trazidas pelo El Niño agravado pelas mudanças climáticas fizeram com que a alimentação em domicílio ficasse mais cara para os brasileiros nos últimos meses.

A carne continua caindo, mas a batata, cenoura e o feijão, por exemplo, cacetaram sem dó o bolso do consumidor. E o preço de alimentos afeta mais a classe trabalhadora, que tem nele um dos principais itens de seu orçamento: se a inflação geral de janeiro ficou em 0,42%, a alta do custo de comer em casa subiu 1,81%, segundo o IPCA.

Enquanto isso, a taxa de desemprego no Brasil foi de 7,6% no trimestre encerrado em janeiro, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua do IBGE. No mesmo trimestre de 2023, a taxa era de 8,4%, e no mesmo período em 2022, 11,2%. Estamos na menor taxa para o período desde janeiro de 2015.

Ao mesmo tempo em que a população ocupada aumentou, a renda média avançou 3,8% no primeiro ano de Lula.

Contudo, inflação menor não significa que preços voltaram a patamares anteriores ao salto inflacionário de 2021 e 2022. Tampouco o aumento na renda compensou a corrosão do poder de compra trazida pela inflação. Ou seja, a economia está melhor e com perspectivas melhores, mas isso não se traduziu, necessariamente, em percepção de melhora pelos trabalhadores.

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Novamente, trabalhadores não comem aprovação de Reforma Tributária, nem arcabouço fiscal.

A pesquisa Genial/Quaest mostra que a população sentiu a alta do IPCA de janeiro: questionados sobre os preços dos alimentos no último mês, 73% afirmam que eles subiram. A alta em contas foi sentida por 63% e dos combustíveis por 51%.

O sentimento sobre os problemas de hoje gera uma releitura inclusive sobre os de ontem. Para 38%, a economia piorou nos últimos 12 meses, 34% dizem que ela se manteve estável e 26%, que melhorou. Em agosto de 2023, eram 34% que diziam que ela tinha melhorado, 39% que se mantinha estável e 23% que piorou. A diferença entre os dois momentos era, principalmente, os preços.

A maior parte (46%) ainda se mostra otimista com a melhora da economia nos próximos 12 meses, frente a 31% que acha que vai piorar e 19% que se manterá como está. Mas em dezembro do ano passado, eram 55% os otimistas e 25% os pessimistas.

Lula, se quiser a reeleição, precisa aprender com a situação nos Estados Unidos. Por lá, a inflação caiu, a renda está subindo e o desemprego está bem baixo. Mesmo assim, Joe Biden terá problemas para vencer Donald Trump por conta da corrosão do poder de compra e, portanto, da queda na qualidade de vida. Por mais que esse BO tivesse sido gestado no governo Trump e não no dele.

Isso sem contar que os EUA vivem uma ultrapolarização com cristalização de pontos de vista que são impermeáveis à informação. Se para um naco significativo dos republicanos, Biden perdeu e assumiu ilegalmente a Presidência, a melhora de indicadores econômicos, que é um fato, é mais facilmente tratado por trumpistas como fake news sob argumentos estapafúrdios.

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A economia ainda é a chave para a reeleição de Biden, e o partido democrata vai bombar intensamente propagandas mostrando que a vida melhorou sob o atual presidente e piorou sob o anterior. Uma vez que esse ganho não foi estrondoso, a Biden vai ter que mostrar (e convencer) o trabalhador, principalmente os chamados blue collars, os operários, que eles estão melhores com ele.

Se a melhora nos indicadores econômicos, que de fato ocorreu, não se traduzir em um grande salto para a vida da classe média no Brasil, tal como ocorreu nos seus dois primeiros mandatos, o que jogou sua popularidade nas alturas, Lula terá que seguir pelo caminho da campanha de Biden e mostrar que a vida melhorou. Sim, mostrar ao país que a economia melhorou apesar de o bolsonarismo bater bumbo dizendo que não.

Nos EUA, democratas se arrependem, dizendo que isso deveria ter sido feito com força desde 2022, dois anos antes. No Brasil, faltam pouco mais de dois anos para as eleições gerais de 2026.

Eleições mostram que o povão não quer saber quem é o culpado por não conseguir comprar o brinquedo para os filhos, pois culpa sempre o gerente de plantão. A maior parte dos eleitores não deu as costas a Jair pelas acusações de "golpista" e "genocida", mas pelo Bolsocaro. Isso precisa ser levado em conta pelo gerente de hoje na hora de escolher a prioridade de sua comunicação ao país.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL