Ataques a Flávio mostram que bolsonaristas são mais bolsonaristas que ele
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), primogênito de Jair, foi chamado de "Frouxonaro" por parte da sua própria militância nas redes descontente com a entrevista que deu ao programa Roda Viva, da TV Cultura, nesta segunda (8). Avaliam que não foi bolsonarista o bastante. O problema é que (alerta de spoiler) ninguém consegue ser, nem o próprio clã.
Ele está sendo duramente criticado por não ter defendido o impeachment do ministro Alexandre de Moraes, que presidiu no Tribunal Superior Eleitoral o processo que levou à inelegibilidade de Jair Bolsonaro e vem conduzindo os inquéritos relacionados a atos antidemocráticos, milícias digitais e a tentativa de golpe entre 2022 e 2023 no Supremo Tribunal Federal.
A posição do senador é um discurso para proteção de si mesmo e do seu pai em meio às investigações no STF. Além disso, ele é o mais político do clã, responsável pelos diálogos e articulações. Não caberia em um ambiente como aquele ir à guerra ideológica. Ou seja, não é que ele não pense isso ou não atue dessa forma.
Porém, os seguidores radicais queriam ver na boca dele as mesmas palavras que o núcleo do bolsonarismo jorra nas redes sociais. Há os incitados e excitados, que estão em uma estado de guerra total e não aceitam "vejabens" ou mesmo as estratégias de sobrevivência do clã, apenas o sangue do inimigo, e o pessoal do rancor — irritado porque já foi questionado por seu engajamento à direita pelo clã antes e agora vai à forra.
Outros temas também provocaram a ira do Bolsoverso, o universo paralelo dos seguidores mais radicais do ex-presidente, contra Flávio, no Roda Viva.
Um deles foi a falta de apoio do senador a uma teoria da conspiração vagabunda que circula nas redes da extrema direita, afirmando que a vitória de Donald Trump, em novembro, pode reverter a inelegibilidade de Jair Bolsonaro através de futuras sanções comerciais impostas pelos Estados Unidos ao Brasil.
A tese é de que os empresários brasileiros, dessa forma, pressionariam pelo impeachment de Moraes e mesmo pela mudança na decisão que levou Bolsonaro à inelegibilidade até 2030. Claro que isso não passa por uma prova de lógica da primeira série do ensino fundamental. Ou alguém acha que o Tio Sam trataria o Brasil como uma Venezuela, deixando de lado um de seus principais parceiros comerciais, em nome de Bolsonaro?
Questionado pelos jornalistas na bancada do Roda Viva se apoiaria uma ação estrangeira contra os interesses brasileiros, Flávio disse que estava apenas mostrando algo que estava no radar, mas sem declarar apoio. Foi o suficiente para desagradar seguidores que vêm bombando essa tese maluquete nas redes. Afirmaram que ele estaria sendo frouxo por não assumir.
Flávio foi criticado até ao falar de milícias, veja só que ironia. Ele, que condecorou o miliciano Adriano da Nóbrega e empregou dois de seus familiares enquanto era deputado estadual, tentou explicar a natureza dessas ações na entrevista. Questionado se apoiava milícias, ele disse que não. Foi o bastante para ser duramente atacado por parte dos seguidores que, pasmem, saem em defesa dessas mutações criminosas da polícia.
Como disse acima, o senador cuida da articulação política do clã no Brasil. Enquanto isso, seus dois irmãos são responsáveis pela comunicação do pai (o vereador carioca Carlos) e pela inserção do bolsonarismo na rede internacional de extrema direita (o deputado federal Eduardo). Por isso, era para ser o sucessor natural de Jair à Presidência da República, mas foi abatido pelas denúncias de rachadinha e enriquecimento ilícito.
Esse descontentamento nas redes lembra que o bolsonarismo é maior do que o próprio clã Bolsonaro. A família alimenta os seguidores radicais, tentando manipulá-los para as suas necessidades, mas também é conduzido por essa massa, que anseia ouvir a confirmação das próprias opiniões, muitas delas violentas, mas também ver seus desejos delirantes atendidos.
E deslizes que demonstrem fraqueza não são aceitos. Afinal, mitos e heróis são ideias que não podem errar.
O mais interessante é que o clã, que sempre apontou o dedo para outros expoentes da direita, dizendo que não eram radicais o bastante, agora experimentam um pouco do próprio veneno.