Leonardo Sakamoto

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Reportagem

Indígenas exibem Gilmar Mendes em NY em protesto contra marco temporal

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) projetou imagens do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, na fachada de um prédio de Nova York, na noite desta terça (24), em um protesto contra o marco temporal das terras indígenas. A cidade está recebendo chefes de Estado de todo o mundo para a Assembleia Geral das Nações Unidas, onde o presidente Lula discursou ontem.

Com frases em inglês e português, as projeções pediram para Gilmar Mendes suspender a eficácia da lei do marco temporal e respeitar os direitos territoriais dos povos indígenas. Mas também afirmaram que "em um mundo em chamas, nós somos a chuva" e que "o futuro é indígena".

O local das projeções foi próximo da Penn Station e do Madison Square Garden, dois locais de grande circulação de pessoas na cidade.

Mendes é o relator de ações judiciais que questionam a legislação que foi aprovada pelo Congresso Nacional para legalizar o marco temporal mesmo após decisão do próprio STF que declarou a tese inconstitucional.

O marco temporal, defendido por ruralistas, afirma que somente terras ocupadas por indígenas na época da promulgação da Constituição Federal, ou seja, em 5 de outubro de 1988, podem ser reivindicadas para a demarcação. Isso desconsidera os povos que estavam expulsos de suas terras contra sua vontade naquele momento. Por conta disso, a Apib batizou o projeto de "PL do Genocídio".

O ministro negou um pedido para a suspensão da nova legislação e estabeleceu um processo com audiências públicas para tentar conciliar os interesses envolvidos — o que acaba por flexibilizar a decisão do Supremo. A Apib decidiu se retirar da comissão no final de agosto, após dois encontros, por não aceitar a ideia de conciliação de algo já decidido pela corte.

"Reivindicamos a imediata suspensão da lei 14.701, de 2023, que tem potencializado ainda mais a violência contra os povos indígenas. Clamamos para que a Suprema Corte brasileira suspenda os efeitos dessa lei, a fim de conter esse cenário de violência que se intensifica diariamente em nossos territórios", afirmou à coluna Dinamam Tuxa, coordenador executivo da Apib.

De acordo com ele, há uma crise civilizatória, ambiental e climática causada pela ação do poder econômico e político. E lembra que os territórios indígenas ostentam as maiores taxas de preservação de cobertura florestal no país devido à ação das próprias comunidades.

"Quando o ministro Gilmar Mendes relata uma ação sobre a lei do marco temporal e hesita em reafirmar a sua inconstitucionalidade, já declarada por ampla maioria do tribunal pleno, percebe-se uma erosão da autoridade do Supremo Tribunal Federal." A avaliação é da constitucionalista Eloísa Machado, professora da FGV Direito SP e representante da Apib no caso.

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"Ainda mais quando submete a questão a uma audiência de conciliação sem lastro na Constituição", avalia.

O Supremo havia derrubado a tese com nove ministros contra e apenas André Mendonça e Kassio Nunes Marques, indicados por Jair Bolsonaro, a favor. Em resposta, a bancada ruralista conseguiu a aprovação do PL. O presidente Lula chegou a vetar o marco temporal, mas seu veto foi derrubado pelo Congresso em 14 de dezembro do ano passado. Entre os deputados federais, foram 321 contra os vetos, 137 a favor e uma abstenção. E entre os senadores, 53 contra e 19 a favor.

Para o Ministério dos Povos Indígenas, a decisão do Congresso vai contra os acordos para mitigar as mudanças climáticas dos quais o Brasil é signatário.

"Os povos indígenas no Brasil, neste exato momento, sofrem com queimadas devastadoras, invasões de territórios pelo agronegócio, mineração e a crescente pressão política para adentrar em sua terras, violando seus direitos, como evidencia a tese do marco temporal", afirma Tuxa.

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