Leonardo Sakamoto

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Opinião

No Guarujá, PCC suga um monte de dinheiro e PM produz montanha de mortos

O PCC rouba o dinheiro público do Guarujá através de falcatruas na prefeitura e na Câmara dos Vereadores. Enquanto isso, o governo do estado mata primeiro e pergunta depois, produzindo montanhas de mortos nas comunidades pobres. Sim, nesse trecho do litoral paulista, entre a montanha e o mar, a população está emparedada entre "mocinhos" e "bandidos".

Reportagem de Flávio Costa, Josmar Jozino e Luís Adorno, no UOL, neste sábado (12), mostra que, na avaliação da Polícia Civil, as instituições municipais foram "sequestradas" pelo Primeiro Comando da Capital. E cita parecer do relatório da Operação Hereditas, que investiga fraudes em licitações que beneficiaram empresas ligadas a integrantes da facção, que está nas mãos do Ministério Público.

As sacanagens nos contratos chegam a R$ 70 milhões e três vereadores são investigados, tendo sido alvos de mandados de busca e apreensão - entre eles Edmar Lima dos Santos (PP), o Juninho Eroso, presidente da Câmara. Todos foram reeleitos no dia 6 de outubro.

Quem acha que o fundo do poço é um grupo político tentar um golpe de Estado ao perder a eleição, como o bolsonarismo entre o segundo turno de 2022 e 8 de janeiro do ano passado, precisa urgentemente rever seus conceitos. Sim, no fundo do poço há um alçapão que nos leva muito mais fundo, talvez em direção a um narcoestado.

E a infiltração que vivemos até agora, e que o Guarujá é prova, não é nada se comparada com o que deve vir.

Como já disse aqui, o maior desafio da direita e da esquerda, pelo menos aquelas que se dizem democráticas, deveria ser evitar que as facções aumentem seu naco na política. Pois isso é um risco à própria existência de partidos e grupos políticos criados para defender interesses legítimos.

O PCC virou uma máfia e descobriu que desviar dinheiro público pode ser mais seguro e lucrativo que fazer logística de cocaína.

Na capital, tivemos risco de um partido, o PRTB de Pablo Marçal, cuja cúpula se orgulha da relação com o PCC ganhar a eleição. Lembrando, é claro, que a facção usou empresas de transporte urbano para lavar dinheiro na gestão Ricardo Nunes, segundo o próprio Ministério Público.

O avanço do PCC na política acontece paralelamente à matança realizada por policiais militares na Baixada Santista, com epicentro no Guarujá. Entre julho de 2023 e abril de 2024, 84 pessoas foram mortas nas operações Escudo e Verão.

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A justificativa dada pela Secretaria de Segurança Pública era de um plano elaborado para combater o tráfico na região portuária, dominada pelo PCC. O que não faz sentido, pois as ações da Polícia Federal contra facções em terminais prendem meliantes sem mortes. Organizações da sociedade civil acusam a PM de aplicar uma vingança coletiva na população por conta da (inaceitável) morte de policiais.

Um dos contrastes mais chocantes é o abismo entre os relatos de parentes dos mortos e os dos policiais envolvidos. O registro da PM coloca agentes como heróis dignos de condecoração, enquanto familiares, moradores e testemunhas contam cenas de covardia, com tortura e execução de inocentes.

Quem diz a verdade? O problema é que muitos policiais não usavam as câmeras corporais, que poderiam resolver isso. E imagens dos que as usavam chegaram, convenientemente, com problema ao Ministério Público. O governo Tarcísio de Freitas? Pareceu confortável com a falta de resposta. Afinal, em São Paulo, chacina de pobre e negro gera votos nas eleições.

O repórter Luís Adorno, do UOL, percorreu o Guarujá e municípios vizinhos reconstruindo as histórias de parte das e dos sobreviventes no ano passado. E o relato que traz era de pessoas que não estavam em confronto, mas tiveram o azar de estarem no lugar errado, viver na classe social errada e ter a cor de pele errada.

Filipe do Nascimento, negro, 22 anos, morava na favela de Morrinhos 4, no Guarujá, e tinha saído de casa para comprar macarrão. Trabalhava em um quiosque na praia de Astúrias há três anos e, segundo o chefe, era um bom funcionário. O sonho dele era ser tiktoker. A PM alega legítima defesa. Os moradores indicam que ele morreu porque teria testemunhado execução policial

É triste termos que mostrar que uma pessoa tinha um emprego para tentar afastar dela a pecha de criminoso, em um país em que até a Justiça confunde desemprego com periculosidade. Mas, para muitos, isso também já não basta mais.

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"Trouxeram ele até aqui, que não era a moradia dele, a moradia dele é mais para frente. Entraram com ele nesse barraco e executaram ele aí dentro. Ainda pegaram a bicicleta da esposa dele e jogaram dentro do mangue", afirmou uma testemunha ao UOL.

Uma parcela das pessoas que terceirizou o seu senso crítico confia quando policiais dizem que o cano de suas armas separa quem é culpado e inocente, não sendo necessários investigação e julgamento. Ou seja, quando a PM, de São Paulo, da Bahia ou do Rio, dizem que quem morreu é culpado e quem tá vivo é inocente.

A crítica a execuções públicas de pessoas por parte de agentes do Estado não é defesa de "bandido", mas sim do pacto que os membros da sociedade fizeram entre si para poderem conviver (minimamente) em harmonia. Em suma, não entregamos para o Estado o poder de usar a violência como último recurso a fim de proteger os cidadãos para que ele a use como padrão de solução de todos os conflitos.

A polícia, um dos braços armados do Estado, deve seguir as leis e não usar os mesmos métodos dos bandidos sob a pena de cometer injustiças e gerar filhotes monstruosos. Como as milícias que mantêm o poder político ou econômico em comunidades, decidindo quem morre e quem vive, tornando-se piores que outras formas de crime organizado.

Parte da população que não vive áreas ocupadas pelo tráfico ou pela milícia, cansada da violência, apoia desvios de Justiça por parte do Estado. E festeja mortes aceitando sem questionar o julgamento sumário trazido pela bala: se a pessoa morreu pelas mãos da polícia é porque era culpada de algo.

O mais irônico é que, enquanto a PM caceta pobre sob a justificativa de estar caçando o PCC, o PCC se expande gostosamente sobre a administração pública. Mais inteligência, menos porrada seria mais efetivo — se o objetivo fosse resolver o problema.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL