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Plínio Fraga

Torres de Witzel no Leblon são disparate sem tamanho

A praia do Leblon é linda, mas a água fica imprópria para banho um terço do ano em razão de esgoto não tratado e ligações clandestinas - Ricardo Borges/Folhapress
A praia do Leblon é linda, mas a água fica imprópria para banho um terço do ano em razão de esgoto não tratado e ligações clandestinas Imagem: Ricardo Borges/Folhapress

Colunista do UOL

20/12/2019 04h00

Como se o Rio de Janeiro já não tivesse problemas demais, o governador Wilson Witzel (PSC) resolveu criar um novo de proporções gigantescas: quer autorização para construir duas torres com 200 metros de altura no último grande espaço público do Leblon, na zona sul da cidade.

Não há justificativa urbanística ou ambiental para tal empreitada. Pode haver justificativa econômica, mas resta ainda saber a favor de quem. Das contas públicas e da qualidade de vida do Rio de Janeiro, provavelmente não será.

Governador do Estado, Witzel quer convencer os vereadores e a prefeitura do Rio a embarcarem numa jogada imobiliária. Permitir a elevação estratosférica do gabarito no Leblon para que sejam construídas duas torres onde hoje funciona o 23º Batalhão de Polícia Militar. Defendeu que a construção tornaria a cidade do Rio "diferenciada". Na visão estreita e comprida do governador, as duas torres gerarão recursos via IPTU e pagamento de licenças municipais e irão se harmonizar com a região.

O batalhão está localizado numa das áreas com maior densidade de veículos da zona sul. Imaginar duas torres ali é multiplicar o caos. As ligações clandestinas e a falta de tratamento de esgoto já tornam o canal e a praia do Leblon vítimas constantes de toneladas de dejetos _ em um terço do ano, a água ali está imprópria para banho.

A argumentação urbanística mais decente seria de que a verticalização otimizaria os serviços públicos da região. Mais gente servida com menos investimento público em infraestrutura. A ideia faz sentido em áreas como o centro da cidade, fracamente povoada. Naquele ponto do Leblon, o serviço de transporte público, o espaço viário, as áreas verdes, nada dá conta da demanda atual. Imagine com duas torres a mais, atraindo milhares de pessoas à volta.

Faz pelo menos dez anos que os governantes do Rio de Janeiro tentam de alguma forma obter dinheiro com projetos na área do batalhão da PM no Leblon. São 35 mil metros quadrados, ou cinco vezes o tamanho de um campo de futebol oficial. Parte sedia o batalhão, parte está abandonada desde o fim das obras da Linha 4 do Metrô que tiveram base ali. Essas obras já haviam derrubado dezenas de árvores e tornado mais cinza o bairro de metro quadrado mais caro no Brasil.

A premissa de nova ocupação para a área é correta. Polícias militares aquarteladas, ou seja, cuja rotina tem como base um quartel em que os agentes dormem, almoçam e se exercitam, são experiência superada na maioria das polícias do mundo. É claro também que a área que foi degradada pelo metrô tem de ser recuperada.

A primeira ideia a ser discutida para o terreno foi a criação um parque público. Apesar de pequeno (1,5% do tamanho do parque do Ibirapuera), o parque no Leblon seria a maior região verde das vizinhanças, uma lufada ambiental da qual o Rio necessita.

O escritor e compositor Sérgio Cabral chegou a sugerir a seu filho, quando governador do Estado entre 2007 e 2014, que o parque do Leblon sediasse também o Museu da Bossa Nova. A ideia era muito boa para seguir adiante no governo argentário de Cabral Filho.

Em vez de aprovar a construção de torres, o governo do Estado e a prefeitura do Rio de Janeiro poderiam abrir um concurso público para projetos paisagísticos para a área. Isso também dá dinheiro. Um exemplo é a High Line _ parque suspenso criado numa antiga linha férrea em Nova York _ que, em dez anos desde sua criação em 2009, gerou um impulso econômico para a cidade calculado em US$ 2 bilhões. O espaço da High Line é um décimo daquele que poderia ser ocupado por um parque no Leblon.