Raquel Landim

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Opinião

Trump força aliados a assumir custos para focar em "guerra fria" com China

Donald Trump nem tomou posse e já mantém a imprensa ocupada com "disparates" em série.

Em poucos dias, o presidente eleito dos Estados Unidos disse que quer ocupar a Groenlândia, retomar o Canal do Panamá, transformar o Canadá em um dos Estados americanos e mudar o nome do Golfo do México.

Levou respostas atravessadas do primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, e da presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, que geraram mais manchetes.

Observadores atentos da cena internacional, no entanto, ponderam que o objetivo do republicano não é apenas chamar a atenção com absurdos que obviamente não vão acontecer. (Ou alguém acredita numa invasão americana para tomar Toronto?)

Trump tem método. E sua meta é que os aliados dos Estados Unidos assumam mais custos para que Washington concentre suas energias na nova "guerra fria" com a China.

Essa é conclusão final. Mas, para entender, vamos por partes.

A técnica de Trump é conhecida de quem estuda negociações internacionais. A ideia é começar com uma posição aparentemente absurda para conseguir uma concessão muito relevante do outro lado, que parecerá menos absurda do que a proposta final.

Vejamos.

Em 2026, o Nafta, acordo de livre comércio entre Estados Unidos, México e Canadá, vai ser revisto. Em vigor desde 1994, o Nafta é vital para as economias mexicana e canadense.

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Trump não tem o menor interesse em mudar o nome do Golfo do México, mas deseja, sim, que os mexicanos financiem o combate aos cartéis de drogas e ajudem a conter o fluxo de migração na fronteira.

Apesar da troca de farpas em público, o presidente eleito americano e a mandatária mexicana já se falaram duas vezes por telefone - a segunda ligação foi considerada positiva por ambos. E o México vem cooperando no que os EUA demandam.

Já os "disparates" sobre o Canadá e a Groenlândia são consequências da preocupação americana com o Ártico.

Com o aquecimento global, a região vem ganhando relevância geopolítica. O Ártico tem recursos importantes de minério e petróleo e, com o degelo, novas rotas de comércio podem se abrir. Além disso, é a menor distância para um ataque militar da Rússia e da China aos Estados Unidos e vice-versa.

Enquanto a presença americana no Ártico está limitada ao Alasca, Dinamarca e Canadá possuem enormes territórios por lá. Certamente os Estados Unidos querem mais bases militares e acordos comerciais que garantam seu espaço.

Um ponto importante: Dinamarca e Canadá são membros da Otan, a Aliança do Tratado do Atlântico Norte - assim como os Estados Unidos.

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Portanto, qualquer agressão dos EUA a esses países seria uma agressão a toda a Otan, o que incluiria a Europa na confusão.

E o que Trump quer da Otan? Ele deseja que os europeus arquem com uma fatia maior dos gastos da organização para concentrar esforços no seu alvo principal, a China.

Aqui todo o raciocínio volta ao ponto original: o mundo está diante de uma nova "guerra fria" entre os Estados Unidos e a China e essa é a linha mestra da política externa americana.

Os republicanos acreditam que não têm que perder tempo e dinheiro com nada mais.

Trump tem um modo peculiar e cansativo de fazer política - interna ou externa. Mas ele não é o maluco que parece. Sua reeleição é prova mais que suficiente disso. É bom o mundo estar atento.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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