Governo não previu toda a verba para pagar médicos-residentes na pandemia
Resumo da notícia
- Em ofício enviado a Paulo Guedes (Economia), o ministro Milton Ribeiro (Educação) pede R$ 302 milhões para conseguir pagar bolsas e dar reajuste
- Parte dos residentes, mesmo que atuando em programa educacional, atua na linha de frente de combate ao coronavírus; bolsa hoje é de R$ 3,3 mil mensais
- Ministérios da Saúde e da Educação pedem reajuste de 23% no valor das bolsas, que está congelado desde 2016; Economia diz que recebeu e avalia pedido
Em meio à pandemia, o governo Bolsonaro não separou, na previsão orçamentária para 2021, o dinheiro necessário para o pagamento das bolsas dos 13,8 mil médicos-residentes e outros profissionais de saúde no país, além de um reajuste solicitado por dois ministérios. Apesar de estar em formação, participando de um programa de pós-graduação, boa parte dos residentes tem que atuar na linha de frente de combate ao novo coronavírus.
De acordo com nota técnica do MEC (Ministério da Educação) enviada ao Ministério da Economia, seriam necessários R$ 665,2 milhões para pagar as bolsas de 13.872 vagas de médicos-residentes no país ao longo de 2021. Contudo, a Lei Orçamentária elaborada pelo governo federal previu para a ação orçamentária um total de R$ 517,9 milhões, uma diferença de R$ 147,3 milhões.
Dois ministérios, da Saúde e da Educação, defendem o reajuste das bolsas, cujo valor está congelado desde 2016. Por meio de um ofício enviado ao ministro Paulo Guedes (Economia) na última quarta-feira (6), ao qual o UOL teve acesso, o ministro Milton Ribeiro (Educação) pediu mais R$ 302 milhões para a ação orçamentária dos dois tipos de Residências em Saúde, uma voltada para médicos e outra para profissionais de outras áreas da saúde, que são consideradas modalidades de ensino de pós-graduação.
Com o reajuste, o total necessário para cobrir os pagamentos a médicos-residentes saltaria dos atuais R$ 517 milhões para R$ 820 milhões.
Hoje os médicos-residentes e outros profissionais de saúde recebem uma bolsa de R$ 3,3 mil brutos por uma carga horária de 60 horas semanais, incluindo plantão noturno de no mínimo 12 horas (o valor às vezes é complementado por Estados e municípios). Com o reajuste, a bolsa passaria a valer R$ 4,1 mil.
Ministério informou queda de 16,5% no orçamento para 2021
Em nota técnica, o MEC adverte sobre a necessidade de uma "suplementação orçamentária adicional", inclusive porque o valor total das despesas discricionárias (as quais o órgão pode ou não executar) previsto para o MEC para 2021 está abaixo das necessidades da pasta.
"Inicialmente, vale registrar o baixo valor do referencial monetário das despesas discricionárias apresentado para o MEC para o orçamento de 2021, totalizando R$ 19,2 bilhões, o que representa uma redução de R$ 3,8 bilhões (16,5%) em relação à dotação constante da LOA 2020 deste Ministério", diz a nota da coordenação-geral de Suporte à Gestão Orçamentária.
O documento aponta que a suplementação é "condição indispensável para que o Ministério da Educação viabilize a concessão do reajuste no valor da bolsa para a residência médica e multiprofissional em programas de residência sob a gestão deste Ministério".
No ofício a Guedes, o ministro Milton Ribeiro associou os recursos ao combate à pandemia do novo coronavírus. "Dada a relevância dos Programas de Residências em Saúde para o país, principalmente no atual momento de pandemia mundial, solicito a gentileza de apreciar a ampliação orçamentária para o PLOA 2021", escreveu Ribeiro.
O ministro ainda ressaltou a diminuição do caia do MEC, e que não pode fazer cancelamentos para obter a verba para os médicos-residentes. "Informo da impossibilidade de oferta de cancelamentos para cobrir tal ampliação, tendo em vista a redução de mais de R$ 3 bilhões para 2021, em relação à Lei Orçamentária Anual de 2020 - LOA 2020."
Em julho, MEC informou à Câmara que não incluiu reajuste no projeto orçamentário
O reajuste das bolsas é apoiado por parlamentares no Congresso Nacional, tanto da base aliada de Bolsonaro ligada aos médicos quanto por políticos de esquerda. Em julho passado, durante sessão virtual da comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha o combate à pandemia, a Associação Nacional dos Médicos Residentes disse que o necessário seria um reajuste de 50%, mas em negociação com o governo acabou aceitando 20%. O pedido feito pelo MEC no ofício a Guedes é de 23,2%.
Durante alguns meses durante a pandemia, o governo federal pagou aos residentes uma bonificação de R$ 667.
O representante do MEC na audiência, Sergio Henrique Santos, diretor da secretaria de educação superior, disse que o valor dos reajustes das bolsas não foi colocado no Projeto de Lei Orçamentária para 2021 "dada uma informação que recebemos do nosso SPO [área orçamentária no MEC] de que haverá uma redução no valor aí para o [orçamento do] MEC no próximo ano".
A participação dos profissionais de saúde residentes no combate à pandemia foi considerada "muito grande" pelo deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP), que foi ministro da Saúde no governo de Dilma Rousseff (PT). "Eles [governo Bolsonaro] mandaram a proposta do Orçamento para o Congresso sem esse reajuste. O Orçamento tem que tramitar ainda. Nós estamos pressionando, na tramitação no Congresso, para aumentar esse valor. São milhares de residentes no país", disse Padilha.
A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) defendeu, durante a sessão da comissão externa em julho, a prorrogação da bonificação que vinha sendo paga pelo governo federal. "Muitas vezes um ente federado, como estado ou município, terá mais dificuldade de segurar essa prorrogação do que o governo federal."
Saúde confirma que pediu valores; Economia diz que avalia o pedido
Em nota ao UOL, o Ministério da Economia afirmou que o ofício do ministro Milton Ribeiro "foi recebido pela Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério da Economia em 07/01/2021 e está em análise pela área técnica, razão pela qual não tem como se manifestar ainda sobre o tema". O MEC, procurado, não havia se manifestado até o fechamento deste texto.
Também em nota à coluna, o Ministério da Saúde afirmou, na íntegra:
"O Ministério da Saúde (MS) informa que incluiu no Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2021 a previsão orçamentária para correção da defasagem das bolsas de residência médica e em área profissional da saúde sob sua gestão. No entanto, o referido reajuste deverá ser instituído por meio de portaria interministerial, e com essa finalidade, o MS encaminhou proposta ao Ministério da Educação para que a referida correção do valor da bolsa seja aplicada.
A concessão de bolsas financiadas pelo MS é realizada por meio de dois Programas Nacionais de financiamento mediante a publicação de editais dirigidos às instituições proponentes dos programas de residência em saúde. O Ministério da Saúde financia atualmente mais de 21 mil bolsas de residência em todo o Brasil, contribuindo para a formação de especialistas e, consequentemente, para a assistência qualificada à população.
Os residentes realizam especialização na modalidade ensino-serviço com atuação na assistência à saúde. No contexto da pandemia, esses residentes atuam no enfrentamento à COVID-19 de acordo com a sua especialidade, evitando desassistência nos serviços essenciais à população.
Em 2020, o Ministério da Saúde instituiu a Ação Estratégica "O Brasil Conta Comigo - Residentes na área de Saúde" para estimular os residentes por meio de pagamento de bonificação, no valor de R$ 667,00/mês. A ação beneficiou não só residentes financiados pelo Ministério da Saúde, mas também financiados por outros órgãos ou entidades públicas federais, estaduais, distritais ou municipais e entidades sem fins lucrativos, contemplando cerca de 57 mil residentes em todo país, numa iniciativa de valorização desses profissionais que estão atuando na assistência à população durante o cenário de emergência em saúde pública.
Para 2021, o Ministério da Saúde elaborou uma estratégia de valorização dos residentes e ampliação na concessão de bolsas para regiões de vazios assistenciais, bem como ofertas educacionais aos residentes, preceptores e gestores de saúde."
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