Bolsonaro tentou sabotar combate à Covid, diz relatório de direitos humanos
Resumo da notícia
- Organização não governamental Human Rights Watch divulga o 31º relatório anual sobre a situação dos direitos humanos em 2020 em mais de 100 países
- Além da pandemia, são destacados no relatório ataques à imprensa e ao meio ambiente, ofensa aos direitos indígenas e violência policial
Divulgada na manhã desta quarta-feira (13), a 31ª edição do Relatório Mundial sobre a situação dos direitos humanos no mundo, editada pela organização não governamental HRW (Human Rights Watch), apontou que o presidente Jair Bolsonaro tentou sabotar medidas de combate ao novo coronavírus, "promoveu políticas que contrariam os direitos das mulheres e os direitos das pessoas com deficiência, atacou a mídia independente e organizações da sociedade civil e enfraqueceu os mecanismos de fiscalização da legislação ambiental".
A HRW também citou, entre outros pontos, que Bolsonaro "acusou, sem qualquer prova, indígenas e organizações não governamentais de serem responsáveis pela destruição da floresta" e fez ataques a jornalistas. O Ministério da Justiça de seu governo, diz o relatório, "produziu um relatório confidencial sobre quase 600 policiais e três acadêmicos identificados como 'antifascistas'", caso que foi revelado pelo UOL em julho passado. "O Supremo Tribunal Federal determinou ao ministério a suspensão da coleta de informações sobre pessoas que exerçam seus direitos à liberdade de expressão e de associação", informou o relatório.
O levantamento destacou ainda que a polícia matou, no país, 6.357 pessoas, "uma das maiores taxas de mortes pela polícia no mundo". "Quase 80% das vítimas eram negras. As mortes causadas por policiais aumentaram 6% no primeiro semestre de 2020."
O relatório, de 776 páginas, analisa o quadro sobre os direitos humanos em mais de cem países. De acordo afirmação distribuída à imprensa pela ONG, a diretora adjunta da HRW no Brasil, Anna Lívia Arida, disse que Bolsonaro "expôs a vida e a saúde dos brasileiros a grandes riscos" ao longo da pandemia do novo coronavírus.
"O presidente Bolsonaro minimizou a Covid-19, a qual chamou de 'gripezinha'; recusou-se a adotar medidas para proteger a si mesmo e as pessoas ao seu redor; disseminou informações equivocadas; e tentou impedir os governos estaduais de imporem medidas de distanciamento social. Seu governo tentou restringir a publicação de dados sobre a Covid-19. Ele demitiu seu ministro da saúde por defender as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), e seu substituto deixou o cargo no ministério em razão da defesa do presidente de um medicamento sem eficácia comprovada para tratar a Covid-19", diz o relatório.
No campo da liberdade de expressão, além do dossiê contra os antifascistas, o relatório lembra que "Bolsonaro, autoridades de seu governo e outros políticos aliados ao governo proferiram ataques a jornalistas mais de 400 vezes", de acordo com levantamento da ONG Artigo 19.
"O presidente ameaçou um jornalista em agosto de 2020, afirmando que queria 'encher tua boca de porrada'. Seus apoiadores atacaram repórteres durante manifestações e em frente ao palácio presidencial, o que fez com que diversos veículos de imprensa suspendessem a cobertura nesse local em maio. O governo pediu à Polícia Federal que investigasse dois jornalistas e um cartunista por suposta difamação ou calúnia após críticas ao presidente", menciona a HRW.
O relatório também dá destaque à situação dos presídios no país, que se agravou com a pandemia. O sistema penitenciário é marcado por "instalações superlotadas, pouca ventilação e cuidados de saúde inadequados", o que reuniu "condições favoráveis a surtos de Covid-19".
A HRW cita que, segundo o CNJ (Conselho Nacional de Justiça), "cerca de 46.210 presos e servidores tinham contraído Covid-19 e 205 tinham falecido até 26 de outubro".
"Em dezembro de 2019, mais de 755 mil adultos estavam privados de liberdade, excedendo a capacidade máxima do sistema prisional em cerca de 70%, de acordo com o Ministério da Justiça. As prisões contavam com um médico clínico geral para cada 900 detidos e um ginecologista para cada 1,2 mil mulheres encarceradas", diz o levantamento.
"Em julho, o presidente Bolsonaro vetou um artigo de um projeto de lei exigindo o uso de máscaras em unidades prisionais e centros socioeducativos, mas o Supremo Tribunal Federal concluiu que o veto não atendeu ao trâmite processual e restabeleceu o artigo da lei. A corte também ressaltou a 'precariedade estrutural' das políticas de saúde nas unidades prisionais e socioeducativas em sua decisão."
De acordo com o relatório, as mortes causadas por policiais aumentaram 6% no primeiro semestre de 2020. Algumas ocorreram "em legítima defesa", mas "muitas outras são resultado do uso excessivo da força".
"Os abusos da polícia contribuem para um ciclo de violência que compromete a segurança pública e põe em risco a vida de civis e dos próprios policiais. De janeiro a junho de 2020, 110 policiais foram mortos, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública", ressalta o relatório.
No campo socioambiental, o relatório mencionou o aumento de 135% nas invasões a terras indígenas no primeiro ano do governo Bolsonaro (levantamento do Conselho Indigenista Missionário), crescimento do desmatamentos e das queimadas, incluindo a destruição "de mais de um quarto do Pantanal" nos estados de Mato Grosso e de Mato Grosso do Sul e o "enfraquecimento da fiscalização das leis ambientais".
"Em outubro de 2019, o Ministério do Meio Ambiente adotou novos procedimentos, estabelecendo que as multas ambientais não precisam ser pagas até que sejam revistas em uma audiência de conciliação. Os agentes de fiscalização ambiental emitiram milhares de multas desde então, mas apenas cinco dessas audiências tinham sido realizadas até agosto de 2020. Em maio de 2020, o governo transferiu a responsabilidade de liderar os esforços de combate ao desmatamento da Amazônia dos órgãos ambientais para as forças armadas, apesar de sua falta de expertise e treinamento", descreve o relatório.
O levantamento será entregue aos governos dos vários países, incluindo o do Brasil, e organismos de cooperação internacional. No ano passado, após a divulgação da 30ª edição, a HRW manteve audiências com o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, e com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. O resultado desses encontros foi considerado não muito produtivo.
O governo será procurado ao longo desta quarta-feira (13) e, caso se manifeste, este texto será atualizado.
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