Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
O caso dos cem anos de sigilo para Pazuello e até onde isso pode chegar
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Há no caso do sigilo de cem anos que protege o general Eduardo Pazuello uma nuance legal e uma probabilidade de ele acabar por confirmar uma alarmante constatação.
Pazuello, até hoje na ativa, sofreu um processo administrativo por participar publicamente de um ato político em flagrante desrespeito ao regulamento disciplinar do Exército. Por pressão de seu protetor, o presidente Jair Bolsonaro, e por decisão do comandante da Força, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, o militar ficou impune, o que deixou apoplética a maior parte do generalato, e em festa boa parcela dos oficiais, sargentos e praças que apoiam Bolsonaro.
À demanda de jornais para que se divulgasse o processo que terminou na não punição do general, o Exército respondeu com uma negativa - invocou o artigo 31 da Lei de Acesso à Informação para dizer que estava impedido de divulgar dados que possam ferir "a privacidade e a honra" dos investigados.
No primeiro parágrafo do artigo, a lei diz que "pelo prazo máximo de cem anos", o acesso a informações consideradas pessoais será franqueado apenas aos investigados e a agentes públicos autorizados - "independentemente de classificação de sigilo".
Eis aí a nuance legal na qual o Exército se ampara para afirmar que "não decretou sigilo de cem anos" sobre o caso Pazuello.
A "classificação de sigilo" sobre um documento (ultra-secreto, secreto, confidencial e reservado) é regida por outra lei, o decreto 4553/2002, que o Exército não invocou.
Formalmente, portanto, não se pode dizer que o processo de Pazuello recebeu da Força, ou de seu comandante, classificação de sigilo de até cem anos. O que não muda em absoluto o fato de que em sigilo ele permanecerá por até cem anos — só que por força da Lei de Acesso à Informação, e não como resultado de uma classificação que não ocorreu.
Quanto ao desenrolar do caso, o próximo passo é os veículos que tiveram negado o acesso ao processo de Pazuello entrarem com pedido de recurso. Aqui, a última instância será a Controladoria-Geral da União (CGU), comandada pelo ministro Wagner Rosário.
Rosário, servidor de carreira da CGU, já era ministro no governo Temer. Foi confirmado no cargo por Bolsonaro e nele permanece até hoje.
Não é alguém que, como diz o presidente, tome cerveja com ele - ou seja, que pertence à categoria formada por amigos nomeados pelo ex-capitão e que nunca contrariam um desejo seu, como o procurador-geral da República, Augusto Aras, o ministro do TCU, Jorge Oliveira, o chefe da Abin, Alexandre Ramagem, e o provável novo ministro do STF, André Mendonça.
Rosário pode ter vindo de outra turma, assim como veio o comandante do Exército, Paulo Sérgio, mas nem por isso as decisões de um e outro têm deixado de coincidir com os desejos do ex-capitão. No ano passado, Rosário declarou que foi "acertadíssima" a decisão do presidente de determinar ao Exército que incrementasse a produção de cloroquina.
Em abril, considerou que Bolsonaro tinha todo direito de fazer a viagem de férias na qual gastou 2,3 milhões de reais porque, na verdade, o presidente estaria apenas "trabalhando fora do local costumeiro". Acrescentou que quem não estivesse satisfeito com a explicação que aprovasse uma lei "proibindo" o presidente de sair do Palácio do Planalto.
A lista da cerveja não para de crescer.
E isso significa bem mais que é a alta a probabilidade de o processo administrativo de Pazuello descansar em sono eterno.
Significa que Bolsonaro avança, sem encontrar resistências, no projeto de tomar para si o que é do Estado. Eis aí a constatação alarmante.
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