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Thaís Oyama

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

General "não traiu Lula", mas vídeo faz governo ir de vítima a suspeito

O general Gonçalves Dias: "embaraçosamente cordato" - 29.dez.2022 - Evaristo Sá/AFP
O general Gonçalves Dias: "embaraçosamente cordato" Imagem: 29.dez.2022 - Evaristo Sá/AFP

Colunista do UOL

20/04/2023 11h28

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O general Gonçalves Dias pode ser acusado de tudo, menos de traição.

A frase, com variações, foi repetida ontem à coluna por amigos do presidente Lula, ministros próximos dele e militares diversos, incluindo ex-integrantes do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) pouco simpáticos ao governo petista e ao agora ministro-general demitido.

O ex-chefe do GSI, colocado no cargo por Lula e responsável pela segurança pessoal do petista nos seus dois primeiros mandatos na Presidência, é descrito como um "amigo fraterno" do presidente e um general "afável e cordial" — por vezes, excessivamente afável e cordial.

O episódio, ocorrido em 2012, em que G.Dias, como é conhecido, chega às lágrimas ao ganhar um bolo de aniversário e um coro de parabéns da parte de policiais amotinados que invadiram armados a Assembleia Legislativa da Bahia — e os quais ele havia sido chamado para enquadrar— é inevitavelmente lembrado para ilustrar o seu perfil, em algumas ocasiões, embaraçosamente brando, segundo testemunhas. Por causa do episódio em Salvador, o general foi destituído do comando da 6ª Região Militar e transferido para uma função burocrática.

Ontem, mais uma vez, foi convidado a demitir-se depois que a CNN revelou as imagens em que ele aparece em trajes de churrasco, caminhando casualmente em meio a bolsonaristas que invadiram e depredaram o Palácio do Planalto no fatídico 8 de janeiro. Um ministro que enviou a G. Dias uma mensagem de solidariedade lamentou o destino do militar, "um homem correto e que não é mais um menino".

No governo e no entorno do presidente Lula é fato que muitos gostam do general. É verdade também que não se acha quem desconfie de uma mancomunação entre ele e os invasores. Fora desses círculos, no entanto, muitas perguntas permanecem no ar. Entre elas:

-Se é verdade que grande parte dos integrantes do GSI que aparecem no vídeo misturando-se aos invasores (incluindo o major que lhes serve água e que só falta abaná-los também) eram "sobras" da gestão anterior, por que motivo G. Dias não se livrou deles antes, uma vez que a sua indicação para a chefia do estratégico gabinete foi anunciada pelo presidente no dia 22 de dezembro de 2022, dez dias antes da posse e 18 dias antes da invasão?

(Lembrando que, quando Lula tomou posse, toda o corpo da segurança pessoal da Presidência já havia mudado, assim como já estavam anunciados os nomes dos três novos comandantes das Forças Armadas).

-Por que, ao deparar-se com as cenas de invasão e depredação no Palácio do Planalto, o general não ordenou aos seus comandados, presentes e armados, a imediata prisão dos vândalos, e no lugar disso, solicitou cordialmente aos invasores que se encaminhassem para o segundo andar do Palácio a fim de lá serem presos, conforme afirmou ontem em entrevista à GloboNews?

- É verdade o que disse a amigos o general Dutra de Menezes, ex-comandante militar do Planalto, que, na manhã do dia 8, diante da sua sugestão de enviar reforços do Batalhão da Guarda Presidencial ao Palácio, Gonçalves Dias respondeu que aquilo não era necessário?

-É verdade que, diante do pedido do presidente Lula para que lhe exibisse as cenas integrais da invasão do Palácio, o general disse que isso não seria possível porque algumas câmeras estavam danificadas, o que se prova agora falso?

G. Dias tem muito a responder, mas as cenas reveladas pela CNN já tiveram o efeito imediato de vitaminar a versão conspiratória de que o governo Lula não tentou evitar a invasão dos prédios dos Três Poderes com o intuito de fazer com que o episódio caísse na conta de Jair Bolsonaro e seus seguidores.

Na CPMI que agora se avista, a hipótese delirante se fará ouvir em altos brados, com os esperados danos políticos a um governo que já vem com a popularidade em queda.

Desde já, no entanto, o comportamento do general que chora causou ao governo Lula o prejuízo impagável de, no episódio do 8 de janeiro, passar de vítima a suspeito — senão de conivência, ao menos de incompetência e frouxidão.