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Thiago Herdy

REPORTAGEM

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Programa de combate a desmatamento está parado por causa da ONU, diz Salles

Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente - Fernando Moraes/UOL
Ricardo Salles, ex-ministro do Meio Ambiente Imagem: Fernando Moraes/UOL

Colunista do UOL

30/08/2021 07h00Atualizada em 30/08/2021 17h29

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Celebrado durante a gestão do então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, como uma das iniciativas mais relevantes dentro da estratégia de combate ao desmatamento na Amazônia, o programa Floresta+ previa pagamento a moradores da região por serviços florestais, mas ainda não saiu do papel. O orçamento é de meio bilhão de reais.

Nesta segunda parte da entrevista à coluna, Salles atribui a paralisia à "ineficiência" do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), órgão da ONU responsável pela execução do Floresta+ no Brasil. Na tarde de hoje, o organismo disse que depende do governo federal para avançar com o programa.

Salles se diz a frustrado pelo insucesso das negociações de reativação do Fundo Amazônia. Durante sua gestão, os registros de incêndios florestais no ano de 2020 foi o maior dos últimos dez anos, de acordo com dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

O ex-ministro se defende também das acusações que envolvem seu aumento de patrimônio e sua relação com madeireiros.

Por que não houve acordo para reativar o Fundo Amazônia, que está com dinheiro parado desde abril de 2019?

Os doadores, em especial a Noruega, não concordaram com o aprimoramento das regras do fundo que nós propusemos e ficou esse impasse.

Diante da urgência da questão ambiental no Brasil, não é frustrante três anos sem projetos aprovados no fundo?

Se o projeto for pretexto para transferir dinheiro para ONGs e ativismo político, não tem valor. Nós tentamos trazer projetos que tinham resultados. Eu gostaria que eles pudessem ter sido feitos, então, nesse sentido, sim, é uma frustração.

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Gado pasta em meio ao céu coberto com fumaça de queimadas na Amazônia, no sul do Pará
Imagem: Ernesto Carriço/NurPhoto via Getty Images

O desmatamento na Amazônia cresceu 35% entre 2018 e 2019. Qual a razão de um resultado tão ruim?

Os requisitos para se combater o desmatamento ilegal são a regularização fundiária, o pagamento pelos serviços ambientais e a bioeconomia. Mas colocando as pessoas no centro do debate. Os 23 milhões de brasileiros da Amazônia foram ignorados e esquecidos por gestões anteriores. A Amazônia continuou sendo o pior índice de desenvolvimento humano do Brasil, sem dinamismo econômico, sem investimento, sem prosperidade.

A iniciativa de pagamento a essas pessoas, por serviços ambientais...

O maior programa do mundo foi feito na minha administração, que é o Floresta+. Com recursos do GCF, o fundo verde para o clima.

Por que ele não está funcionando?

É um problema da ONU. Quem estrutura o programa e paga aos trabalhadores é o Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). E eles é que não estão fazendo.

Na verdade o programa vinha sendo debatido desde 2017, certo? Não é uma iniciativa do governo Bolsonaro.

Ele foi assinado em 2018 e implementado em 2019. O que nós mudamos do que havia antes: antes era dinheiro para ONG, projetos e pesquisa. Nós transformamos um dinheiro para ir direto para o bolso do cidadão, pagamento por serviço ambiental de verdade. Essa é a grande diferença.

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Ricardo Salles se diz frustrado, mas desmatamento da Amazônia cresceu em sua gestão no Ministério do Meio Ambiente
Imagem: Fernando Moraes/UOL

O senhor deixou o governo e nenhum real foi para o bolso do cidadão.

O projeto foi reformulado em 2019, para ser implementado no final de 2020. Graças à pandemia e tudo mais o Pnud não conseguiu [começar]. São eles que estão montando as equipes, a metodologia de pagamento, não éramos nós.

Mas esse projeto que o senhor aponta como o símbolo de sua gestão do senhor é realizado em parceria com um organismo internacional que cuida de fazer diagnóstico, projeto.

Você vê como é ineficiente. Com toda a estrutura que eles têm, não conseguiram por de pé.

Por que convidar o Pnud para realizar e não o próprio governo tomar essa iniciativa?

Essas doações internacionais vêm carimbadas.

Por que não conseguiu fazer mais para reduzir o desmatamento?

São muitos fatores. O primeiro é o não-alinhamento de diversas polícias militares e estaduais, que não deram o suporte necessário para as operações, sobretudo no Pará. Por interesses estaduais, locais. E também, justiça seja afeita, em razão da pandemia e restrições orçamentárias.

O Exército não foi chamado para cobrir esta lacuna?

Quando as polícias militares não estavam entrando para dar o suporte armado para as operações, o governo precisou que as Forças Armadas e a Força Nacional entrassem suprindo essa falta. O Ibama e o ICMBio têm 50% de déficit de funcionários. Herdamos de administração anterior, ao contrário da narrativa mentirosa que diz o contrário.

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Queimadas na Amazônia e no Pantanal bateram recordes nos últimos anos
Imagem: Reuters

Por que as vagas continuam ociosas?

Nós fizemos o pedido de concurso. Vai ser feito. O problema é que para contratar funcionário público tem que ter folga orçamentária. Não tem dinheiro.

A defesa pública do presidente Bolsonaro do garimpo em terra indígena traz prejuízo para o meio ambiente?

O que traz prejuízo é o não debate desse tema.

Isso incentiva o garimpo ilegal?

Sim, os próprios indígenas já faziam mineração, muito antes do presidente Bolsonaro ser eleito, porque o grau de atratividade econômica é elevado. Não adianta fingir que as pessoas não vão fazer determinada atividade se elas terão muito lucro com isso. A melhor forma de lidar é criar um procedimento que preserve o meio ambiente, permita o acesso a essa riqueza e melhore a prosperidade da região.

O senhor é muito crítico às ONGs de defesa do meio ambiente. Ainda assim, identifica no ativismo gente que admire?

Paulo Hartung, presidente da Ibá (Indústria Brasileira de Árvores), é ótima pessoa. Os membros da TNC (The Nature Conservancy), da CI (Conservation International), do Instituto Espinhaço, de Minas Gerais, são alguns exemplos.

O senhor foi acusado de se reunir com madeireiros e defender seus interesses junto ao ministério.

A minha posição foi a de ouvir parlamentares e membros do governo, organizar a reunião em que todos participaram, inclusive três delegados da Polícia Federal. Ou seja, uma reunião institucional. Essa história de dizer que nós tentamos interferir [a favor de madeireiros] é ridícula.

Um servidor do Ibama disse em depoimento que um assessor do senhor, Leopoldo Penteado, fazia gestão em defesa de autuados.

Mentira absoluta. O processo de conciliação ambiental envolvia as três esferas: Ibama, ICMBio e ministério. Cada um dos três órgãos indicou um representante. O Leopoldo era o representante do ministério. Ou seja, não havia nada ali se não a tentativa de fazer destravar o processo sanatório das conciliações e das multas do Ibama, que há 10 anos é criticado por ser ineficiente e moroso.

O servidor foi específico em relação à postura de Leopoldo.

Muitos dos que foram ouvidos, tanto no inquérito ou em reportagens, são de esquerda e ativistas políticos contra o governo.

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Muitos dos servidores que me criticam são de esquerda, diz Ricardo Salles
Imagem: Fernando Moraes/UOL

O senhor conhecia a instrução normativa que destravou a exportação de madeira e foi alvo da investigação sobre o senhor no STF?

A instrução normativa foi analisada e interpretada por um despacho do presidente do Ibama. Despacho esse que eu entendo que tecnicamente está correto. Fiquei sabendo disso apenas pela imprensa, quando esse assunto veio à tona.

Se tivesse sido consultado, teria concordado com a mudança?

Teria. O que ele fez foi tentar trazer segurança jurídica para algo que já estava sendo feito na prática há muitos anos.

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Ricardo Salles é suspeito de favorecer madeireiros quando era ministro do Meio Ambiente
Imagem: Divulgação / Instagram / ricardosallesmma

O senhor pediu recentemente o arquivamento da investigação do MP de São Paulo sobre o patrimônio do senhor.

Sim, porque ali não tem nada, é politicagem pura. Dois anos de inquérito, todos os meus sigilos quebrados, todas as minhas informações analisadas, não acharam nada.

Em um dos despachos o MP aponta pagamentos que mereceriam atenção, por exemplo, R$ 56,3 mil de uma empresa identificada como Agropecuária Nova, na época em que o senhor era secretário do Alckmin.

Esse cliente é do escritório de advocacia da minha mãe. Ela prestou serviço, emitiu nota, pagou imposto, o que tem de errado?

Qual foi o serviço específico contratado pela Agropecuária Nova?

Matéria civil, vários assuntos. Nada a ver comigo, zero.

O despacho menciona outros pagamentos. Em 2014 e 2015, R$ 340 mil pagos por uma empresa identificada como Dist. Brin. Outros R$ 187 mil da Golf Village Empreendimentos Imobiliários, R$ 316,2 mil de Roberto Visnevski, quase meio milhão de reais de uma empresa identificada apenas como "Sind. N. Emp". Quem são elas?

São clientes do escritório, que continuou operando quando eu não estava lá. Eu só voltei no final de 2014. São serviços jurídicos com impostos recolhidos, nota emitida. São incorretas e indevidas as elucubrações e conjecturas que o Ministério Público faz.

Quando o senhor for chamado a prestar depoimento, vai trazer mais detalhes sobre esses pagamentos?

Todos eles estão nas nossas declarações de imposto de renda, eles já têm todas as informações.

Sobre os pagamentos, sim. Mas e a razão?

A razão do pagamento não compete a ninguém. O que eu presto como serviço jurídico é o que qualquer advogado presta: consultoria em processos, análises, parecer. Esse exercício de ficar questionando coisas que são formais, dentro das regras de advocacia, é algo totalmente abusivo.