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Thiago Herdy

REPORTAGEM

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ONU decide monitorar ação policial que matou 26 suspeitos em Varginha (MG)

Jan Jarab, representante da ONU, monitora investigação que considera hipótese de execução de suspeitos pela polícia em MG - Divulgação/ONU
Jan Jarab, representante da ONU, monitora investigação que considera hipótese de execução de suspeitos pela polícia em MG Imagem: Divulgação/ONU

Colunista do UOL

24/12/2021 04h00

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A ação policial que resultou na morte de 26 suspeitos de envolvimento com o "novo cangaço" em outubro deste ano, em Varginha (MG), entrou no radar do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), que decidiu monitorar a resposta das autoridades brasileiras ao caso.

Conduzida pela Polícia Militar do governo de Romeu Zema (Novo) e com apoio da Polícia Rodoviária Federal, sob gestão de Jair Bolsonaro (PL), a ação foi a mais letal contra quadrilhas suspeitas de promover assaltos a banco já realizada no país e é alvo de investigação da Polícia Civil e do Ministério Público mineiros.

Em reunião com a presidente do Conselho de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Andréia de Jesus (PSOL), o representante do Alto Comissariado na América do Sul, Jan Jarab, expressou descontentamento com a posição oficial do governo de Minas, que dá conta de que todos os suspeitos foram socorridos com vida após o enfrentamento com a polícia e que morreram em meio à tentativa de atendimento hospitalar.

Para Jarab, que atua desde Santiago, no Chile, a hipótese não é crível e o escritório decidiu monitorar o andamento das investigações do caso pelas autoridades brasileiras.

A remoção de corpos baleados e já sem vida configura modificação do local de confronto. Tal medida é ilegal e dificulta a investigação do caso.

Cobrança ao governo brasileiro

O ACNUDH tem como missão monitorar o cumprimento das obrigações e compromissos aceitos pelos Estados membros, entre eles o Brasil, derivados tanto da Carta das Nações Unidas como dos tratados e outros instrumentos internacionais de direitos humanos.

Em última hipótese, o governo brasileiro pode vir a ser cobrado em relação ao caso, que apresenta indícios de execução extrajudicial de suspeitos de crime.

Conforme revelou a coluna na última segunda-feira, o relato de uma testemunha que trabalha em uma unidade de saúde de Varginha e que participou do atendimento aos suspeitos contradiz o que foi registrado pelos agentes no boletim de ocorrência do episódio.

Em áudio, ela afirma que chegaram às unidades de saúde do município "corpos amontoados" em carrocerias de caminhonetes, em vez de feridos com alguma chance de atendimento, como registraram os agentes no documento oficial.

As assessorias do governo de Minas, da Secretaria de Segurança Pública, da Polícia Militar e da Polícia Rodoviária Federal não quiseram comentar o áudio. Na época do episódio, autoridades informaram que as mortes foram resultado de ação policial em legítima defesa.

Espanto com homenagem

A reunião de Jan Jarab com representantes do parlamento mineiro e da sociedade civil organizada ocorreu um dia após a Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa de Minas realizar uma homenagem aos policiais que atuaram no episódio de Varginha.

A medida foi comentada por Jarab, que relatou espanto com esse tipo de manifestação no parlamento mineiro, em uma sociedade democrática.

É consenso entre especialistas em segurança pública a percepção de que uma ação policial bem-sucedida é aquela que resulta em pessoas presas, em vez de pessoas mortas.

À coluna, a assessoria de Jarab informou que "o Escritório da ACNUDH para América do Sul vem acompanhando o ocorrido em Varginha, mas ainda não tem comentários oficiais (sobre o episódio)".