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Médico não terá CRM cassado caso se recuse a prescrever hidroxicloroquina

Arte/Dirceu Portugal/Fotoarena/Estadão Conteúdo
Imagem: Arte/Dirceu Portugal/Fotoarena/Estadão Conteúdo

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

27/07/2020 04h00

Com mais de 85 mil mortos por causa da covid-19 no Brasil, ainda há um debate sobre o uso de hidroxicloroquina no tratamento da doença, mesmo sem comprovação científica de sua eficácia. Agora, uma corrente que circula pelas redes sociais propõe ameaçar médicos com a perda do registro caso eles se recusem a prescrever a droga.

"Quem estiver contaminado com covid-19 e pedir para ser tratado com hidroxicloroquina e o médico se recusar ou mesmo o hospital não permitir, peça a um familiar ir a uma delegacia e fazer um boletim de ocorrência. De posse do mesmo, volte ao hospital e apresente-o ao médico e paço o documento de autorização para assinar", instrui a corrente.

"Se este médico se recusar a fazer a receita, vá ao Ministério Público e peça a cassação imediata do CRM [registro no Conselho Regional de Medicina] deste médico", sugere o texto, que não indica a base legal da sua proposta.

O UOL encontrou esta corrente sendo compartilhada em especial em grupos de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), entusiasta do medicamento.

Médico não é obrigado a receitar remédio algum

Nenhum médico perderá o registro caso se recuse a prescrever hidroxicloroquina ou qualquer medicamento pedido pelo paciente. Ao UOL, o CFM (Conselho Federal de Medicina) esclareceu que a escolha é de autonomia do profissional visando sempre o bem do doente.

"Em todas as situações, o princípio que deve, obrigatoriamente, nortear o tratamento do paciente é o da autonomia do médico, assim como a valorização da relação médico-paciente, sendo esta a mais próxima possível, com o objetivo de oferecer ao paciente o melhor tratamento médico disponível no momento", explicou o órgão.

De acordo com o conselho, o médico não é obrigado a receitar nenhum medicamento, seja hidroxicloroquina ou um remédio de eficácia comprovada para o tratamento, só por que o paciente solicitou.

"O paciente não é obrigado a tomar qualquer medicação nem o médico é obrigado a prescrever", concluiu o CFM.

Critério é do médico com consentimento do paciente

O CFM reconhece que não há qualquer comprovação científica da eficácia da cloroquina no tratamento da covid-19. No entanto, em abril, deu um parecer de que o uso do medicamento para tratar a doença é um critério do médico em concordância com o paciente.

O conselho diz "ser possível" a prescrição do medicamento em três situações específicas, desde que a decisão seja compartilhada entre o profissional e o paciente:

  • Pacientes com sintomas leves, em início de quadro clínico, em que tenham sido descartadas outras viroses, como influenza, H1N1 e dengue
  • Paciente com sintomas "importantes", mas ainda sem necessidade de cuidados intensivos, com ou sem recomendação de internação
  • Pacientes críticos em cuidados intensivos, incluindo ventilação mecânica

Médico tem de explicar que eficácia não é comprovada

Além de ser uma decisão em comum acordo, o CFM ressalta ainda que o profissional é obrigado a "explicar ao doente que não existe, até o momento, nenhum trabalho científico, com ensaio clínico adequado, feito por pesquisadores reconhecidos e publicado em revistas científicas de alto nível, que comprove qualquer benefício do uso das drogas para o tratamento da covid-19".

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