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Falsos agenciadores de táxi mudam local e horário para burlar fiscalização no Galeão

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

13/04/2012 06h00

No principal aeroporto internacional do Rio de Janeiro, o Galeão, o famoso grito de "Táxi! Táxi!", antes proferido em alto e bom som pelos chamados jóqueis --espécie de agenciadores de táxis piratas--,  foram trocaram por táticas mais discretas de atuação nas áreas de desembarque. Depois que a fiscalização aumentou, os infratores mudaram horários e locais de atuação para conseguir continuar oferecendo o serviço ilícito.

Dá para notar que o fluxo de táxis não credenciados pela Infraero diminuiu consideravelmente no aeroporto depois que o programa "Táxi Boa Praça" foi implantado, em 24 de janeiro. Desde então, apenas táxis das sete cooperativas credenciadas pela Infraero (duas de táxis comuns e cinco especiais) podem pegar passageiros nos setores de desembarque do Galeão. As áreas são vigiadas por câmeras da prefeitura e há agentes para multar supostos infratores.

Histórico de agressões

  • A Prefeitura começou a organizar o serviço de táxi nos aeroportos do Rio há dois anos, após sucessivos casos de agressões.

    Um dos casos mais grave foi o do taxista Kléber da Rosa (vídeo acima), que em 2010 foi linchado por cinco colegas, depois que a vítima parou seu táxi na área das cooperativas credenciadas.

  • Recentemente, mais cenas de violência gratuita na área de desembarque do Galeão foram flagradas pelas câmeras de segurança. Um casal gay foi espancado por motoristas de táxis piratas ao recusar uma oferta. Durante a briga, um dos criminosos deu um chute no rosto da vítima, que teve os ossos da cabeça e da face quebrados.

Segundo a Secretaria Municipal de Transportes, 920 multas a motoristas que não respeitaram as novas regras foram multados pela CET-Rio (Companhia de Engenharia de Tráfego do Rio de Janeiro) e Guarda Municipal.

Mas o problema ainda está longe de ser resolvido. A fiscalização e as câmeras fizeram os jóqueis migrar para o saguão. Lá, com o objetivo de enganar a fiscalização, os agenciadores atuavam perto de estabelecimentos comerciais ou optavam por andar com cartazes --como se estivessem à espera de uma determinada pessoa.

"Desde que houve aquele problema com o casal de homossexuais [que foi agredido no fim de fevereiro por rejeitar a oferta de um jóquei], eles estão buscando novas estratégias. Muitos fugiram ou foram fichados, mas ainda há os que abordam parentes que estão aguardando a chegada de alguém, gente que para para comer alguma e é abordada ali mesmo. Também há os que ficam circulando por aí com aquelas placas com nomes", explica um funcionário da Infraero responsável pela segurança patrimonial. "É a deixa para se posicionar na área de desembarque e fazer a oferta. O turista, bobo, acaba caindo", completa.

Durante três dias, em horários alternados, a reportagem do UOL circulou pelos dois terminais do Galeão de forma anônima, e foi abordada por jóqueis em diversos momentos. Nem todos ofereceram serviço de táxi pirata. Além dos falsos taxistas, os chamados "bandalhas" -- não credenciados e/ou que rodam com o taxímetro adulterado -- também são um antigo problema para a administração do aeroporto e para a polícia.

Nas proximidades da filial de uma famosa rede de lanchonetes situada no Terminal Dois, um homem se aproximou com o intuito de perguntar sorrateiramente sobre serviços de táxi "mais barato", e ouviu um "não" como resposta. "Posso fazer mais barato do que os caras que param aqui no Terminal Dois. Está indo para onde?", perguntou ele.

Posteriormente, ao ser informado de que o repórter desejava ir ao centro do Rio, o jóquei -- que se identificou como César -- cobrou "no tiro" R$ 72, isto é, um valor combinado antes do trajeto, o que é proibido. "Se você pega um desses especiais, cobram R$ 90, às vezes R$ 100. É jogo", completou.

Após algumas tentativas de barganha, o jóquei aceitou fechar a corrida por R$ 65, e conduziu a reportagem ao setor de embarque do Terminal Dois. Ainda no caminho, o agenciador utilizou um rádio Nextel para chamar um taxista identificado como Edson.

Um veículo não cooperativado chegou à área de embarque -- onde a circulação de táxis e veículos particulares é livre -- em pouco menos de cinco minutos. Nenhum guarda municipal ou policial militar patrulhava o local neste momento. Também não havia a identificação do motorista (com nome e foto) em lugar visível dentro do veículo.

Ao fim da corrida, pagos os R$ 65 pré-combinados, o taxista deixou um número de telefone celular, e disse que estaria disponível para "passeios turísticos" pela capital fluminense. No taxímetro? "Nesses casos a gente tem que fechar o valor antes", respondeu o taxista.

O motorista também não quis dar um recibo. "Eu só poderia te dar nota se fosse corrida no taxímetro, senão pega para mim", argumentou.

Se a mesma corrida solicitada pela reportagem do UOL fosse feita no taxímetro, os valores seriam R$ 32,35 (bandeira um) e R$ 37,70 (bandeira dois). No táxi especial, o preço seria de aproximadamente R$ 54, segundo cálculos de um serviço online de cotação de tarifas de táxi.

A vida noturna dos jóqueis

Segundo funcionários responsáveis pela segurança patrimonial da Infraero, o esquema de segurança no período noturno no Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, ainda deixa a desejar. Com isso, os agenciadores que atuavam durante o dia passaram a agir efetivamente a partir das 20h. Há até um local no qual é possível localizar com facilidade os chamados jóqueis.

"Como não tem guarda municipal e fiscal da CET-Rio à noite, esse pessoal procurar se posicionar perto dos pontos de ônibus especiais. Já vi até carros provavelmente piratas parando naquele trecho à espera de passageiros", disse o funcionário, que pediu para não ter o seu nome publicado.

Quando estava no aeroporto, a reportagem do UOL foi abordada por um jóquei exatamente no local citado pelo funcionário da Infraero. Após alguns minutos, a empresária paulista Sônia Batista, 38, que tinha acabado de desembarcar, também recebeu a oferta. De acordo com o agenciador, que prometiu rapidez no serviço, o táxi estaria parado há poucos metros dali.

Taxistas fazem curso de inglês para evitar "embromation" na Copa

Ela, no entanto, optou por aguardar o ônibus especial. "Prefiro ir de ônibus do que arriscar a minha vida pegando um desses táxis piratas. Acompanhei pelo noticiário aquele caso do casal gay que foi espancado, é o tipo de coisa que assusta bastante", afirmou ela. "Como os funcionários da minha empresa [que fica em São Paulo] viajam sempre para o Rio, há até uma orientação para evitar esse tipo de risco."

O designer baiano Rodrigo Mourão também conta que, antes de viajar, procurou informações na internet sobre o serviço de táxi oferecido pelo Galeão. "Li em sites de mochileiros e em outras referências que se deve fugir dos piratas, pois não se sabe o tipo de pessoa que está ali dirigindo", disse.

De acordo com funcionários da Infraero, muitos dos motoristas que trabalham com táxis piratas são ex-policiais ou indivíduos que já têm passagem pela polícia.

O estudante carioca Rafael Almeida, 24, contou que sua avó passou por uma situação de extremo constrangimento ao pegar um táxi supostamente pirata e depois disso ele passou a indicar taxistas de confiança para seus amigos que vêm ao Rio. "É uma pena que eu tenha que fazer isso. Acaba prejudicando a imagem do nosso Estado em outras regiões do Brasil", afirmou.

Em 2008, a avó de Rafael, que tinha acabado de chegar de Goiás, foi largada numa das avenidas de maior circulação de veículos da capital fluminense. "Quando ela notou que o taxímetro estava desligado e questionou, o cara quis impor um valor. Ela não aceitou e pediu que o taxista a deixasse pelo menos em um local seguro, mas o motorista ficou bravo e largou ela no meio da avenida Brasil. Desceu do carro, abriu a mala e lançou a bagagem dela no chão, com toda força. Minha avó ficou horrorizada, acho que ela nunca mais virá ao Rio", relatou.

Fiscalização deficiente

De acordo com a Secretaria Municipal de Transportes e a Infraero, os resultados do programa "Táxi Boa Praça" no sentido de reprimir a ação dos jóqueis são positivos, mas o processo de fiscalização ainda está sendo aprimorado visando à Copa do Mundo de 2014 e aos Jogos Olímpicos de 2016.

O próximo passo será estender o esquema de vigilância para o saguão do aeroporto. "Sabemos que essas pessoas ainda agem perto dos balcões abordando os passageiros. No Galeão, já não é mais um caso somente administrativo, é caso de polícia, pois eles vendem a ideia de que o táxi pirata é mais barato. São bandidos", afirma o superintendente regional da Infraero, Abib Ferreira Júnior.

Ainda segundo Ferreira Júnior, os procedimentos de segurança são feitos 24 horas, com equipe da Infraero e da Polícia Militar fazendo rondas constantes, mas vai investigar as informações de que os jóqueis estariam atuando em um local preestabelecido no período da noite.

A Polícia Militar atua no Galeão com policiais do BPTur (batalhão especializado em garantir a segurança dos turistas) e do Proeis (Programa Estadual de Integração na Segurança).