Crivella culpa cariocas, mas zera investimento em prevenção de enchentes
Resumo da notícia
- Prefeitura não desembolsou verbas para manutenção do sistema de drenagem da cidade
- Foram cortados quase R$ 8,2 milhões dos R$ 53,9 milhões que estimava-se gastar
- Na sexta, Crivella tirou mais de R$ 4 milhões para repassá-los ao programa Cimento Social
Embora tenha culpado a população do Rio de Janeiro pelas enchentes em diversos bairros da cidade neste fim de semana, Marcelo Crivella (Republicanos) não fez investimentos em 2020 com a manutenção do sistema de drenagem da cidade — ação essencial para a prevenção de alagamentos. A prefeitura acumula uma dívida milionária com as empresas de engenharia que executavam esse tipo de serviço.
O levantamento foi feito pelo mandato do vereador Tarcísio Motta (PSOL-RJ) com base em dados do Fincon (Sistema de Contabilidade e Execução Orçamentária). De acordo com os dados, nem um real saiu dos cofres públicos para a manutenção do sistema de drenagem em 2020. Situação semelhante já havia ocorrido em 2019, quando não houve nenhum gasto até abril.
Além de não ter desembolsado verbas para a manutenção das galerias, a prefeitura também não fez nenhuma liquidação desses serviços. A liquidação é a segunda fase da execução das despesas públicas, e significa que o poder público já atestou que os serviços foram de fato prestados. O orçamento do Rio está aberto desde o dia 28 de janeiro.
A prefeitura já cortou quase R$ 8,2 milhões dos R$ 53,9 milhões que estimava gastar com a manutenção das galerias. Até o momento, só houve o empenho de R$ 35,9 milhões para esses serviços. O empenho garante que haja recursos reservados no orçamento para pagamento dos fornecedores.
Na última sexta-feira, véspera dos temporais no Rio, a prefeitura remanejou recursos que poderiam ajudar a prevenir catástrofes causadas pelas chuvas.
Crivella retirou mais de R$ 4 milhões de obras de pavimentação e drenagem para repassá-los ao programa Cimento Social — sua principal bandeira eleitoral desde que entrou na política. Também foram retirados da GeoRio (Fundação Instituto de Geotécnica) R$ 8 milhões, que custeariam obras de contenção de encostas e intervenções em pontes, viadutos e outras estruturas urbanas.
Os recursos foram destinados à injeção de capital por conta da participação do município na CDURP, companhia que administra a região portuária da cidade.
Na manhã de hoje (2), Crivella visitou Realengo, na zona oeste, um dos bairros mais afetados pelos alagamentos. "A culpa é de grande parte da população, que joga lixo nos rios frequentemente", afirmou a jornalistas. Durante a entrevista, ele foi hostilizado por moradores do local, que tiveram as casas invadidas pela água. O prefeito foi atingido no rosto por uma bola de lama.
Em dezembro de 2019, o UOL mostrou que a prefeitura do Rio já acumulava um calote de mais de R$ 20 milhões com as empresas de engenharia que fazem a manutenção do sistema de drenagem, segundo a Aeerj (Associação das Empresas de Engenharia do Rio de Janeiro). Presidente da entidade, Luiz Fernando Santos Reis, já alertava na época que a prevenção de enchentes iria parar se a prefeitura não quitasse os débitos.
De acordo com dados do portal Contas Rio — em que a prefeitura divulga suas informações de execução orçamentária — em 2019 foram gastos R$ 14,4 milhões com essas atividades. O portal registra que cinco empresas prestaram serviços de limpeza de galerias no ano passado.
No último trimestre de 2019, quando os serviços costumam ser intensificados por conta das chuvas de verão, foram gastos R$ 1,3 milhão — apenas 9% do total. O período coincide com o agravamento da crise financeira do município, que chegou a gerar atraso de salários de profissionais terceirizados da Saúde e fechamento de unidades mantidas por OSs (Organizações Sociais).
Em meio às dificuldades de caixa, a prefeitura do Rio chegou a suspender todos os pagamentos e movimentações financeiras por alguns dias.
A LAI (Lei de Acesso à Informação) e a regulamentação municipal determinam que a prefeitura mantenha atualizadas as informações sobre execução orçamentária, mas o portal Contas Rio não tem nenhum dado a respeito de empenhos ou gastos do município em 2020. Segundo informações do portal, ele não tem nenhuma atualização desde o dia 4 de fevereiro.
Prefeitura: manutenção "ocorre durante todo o ano"
Apesar dos problemas de pagamento já perdurarem por ao menos seis meses, a prefeitura sustenta que os serviços de manutenção da rede de drenagem ocorrem normalmente.
"Os serviços de desassoreamento, desobstrução e limpeza de rios e canais são permanentes e ocorrem durante todo o ano", afirma em nota.
A prefeitura afirma ainda que "para 2020, estão previstos investimentos de R$ 312 milhões em ações de prevenção de chuva, contenção de encostas, pavimentação de ruas, limpeza do sistema de drenagens e dragagem de rios.".
Sobre os cortes nas obras da GeoRio e de drenagem, a prefeitura negou que estivesse retirando os recursos, mas afirmou que novos decretos serão publicados devolvendo os valores.
"Não houve perda de recursos para a GeoRio por meio do Decreto 47.159. O que ocorreu foi apenas um remanejamento orçamentário comum à administração pública e que será devolvido à GeoRio. Prova disso é que um novo decreto será publicado no Diário Oficial esta semana reincorporando o valor de R$ 3.9 milhões à GeoRio. No que se refere ao Decreto 47.176, a Secretaria de Fazenda deixa claro que não se trata de retirada de recursos, mas sim de inclusão de recursos ao orçamento das pastas envolvidas (GeoRio e Infraestrutura-SMIH). Essa liberação é ordinária e já estava prevista no orçamento", declarou.
Porém, a gestão de Marcelo Crivella não informou qual é o valor da dívida com as prestadores de serviços de drenagem e por que não houve nenhum pagamento a estas empresas em 2020. Também não explicou os problemas de atualização no portal Contas Rio
Chuva deixa quatro mortos na Região Metropolitana
Desde a noite de sábado fortes chuvas atingem a Região Metropolitana do Rio, castigando principalmente a zona oeste da capital e a Baixada Fluminense. Até o momento foram confirmadas quatro mortes, três no Rio de Janeiro e uma em Mesquita.
Uma mulher de 75 anos morreu eletrocutada na Taquara, zona oeste da capital, enquanto um homem morreu no desabamento de um imóvel no Tanque, na mesma região. A terceira vítima morreu na comunidade de Acari, na zona norte. Há ainda mais uma morte confirmada no município de Mesquita, na Baixada Fluminense.
Por conta dos transtornos causados pela chuva, a cidade do Rio está em estado de alerta desde 0h20 de domingo. O estágio é o quarto em uma escala de cinco, e significa que uma ou mais ocorrências graves impactam a cidade.
Prefeitura do Rio recomenda ficar em local seguro
Por causa do estado de alerta e da possibilidade de novos temporais, o Centro de Operações do Rio recomenda que a população remarque compromissos e permaneça em local seguro. Veja as recomendações do órgão:
- Adie compromissos
- Permaneça em local seguro
- Só se desloque se estiver em área de risco ou em caso de extrema necessidade
- Ofereça abrigo a amigos e familiares
Em casos de alagamentos:
- Redobre a atenção ao dirigir e mantenha os faróis acessos
- Permaneça em local seguro e evite áreas com alagamentos
- Não caminhe pelas águas, pois há perigo de correnteza e de ferimentos com objetos, quedas em buracos sob a água, além de risco de doenças
- Não fique próximo à beira de córregos e rios
- Nunca force a passagem de carros em vias alagadas
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