Namorados e celulares movimentam reabertura de shoppings em SP na pandemia
A busca por presentes para o Dia dos Namorados, celebrado amanhã, e por serviços e aparelhos em lojas de telefonia foram os principais motivos que levaram os paulistanos aos shoppings nesta quinta-feira.
No dia em que o estado de São Paulo atingiu 10 mil mortes causadas pela covid-19, a capital começou a reabertura de shoppings com horário reduzido, de quatro horas, e restrições, como uso obrigatório de máscaras e protocolos de higiene e saúde pública. Em todos os estabelecimentos visitados pela reportagem, houve medição de temperatura para todos que entravam.
Carregando duas sacolas de compras e o lanche recém-comprado, a auxiliar de enfermagem Maria Rodrigues disse que foi ao Center Norte hoje por que era sua única folga na semana.
Funcionária de uma organização que administra um pronto-socorro na região, ela aproveitou o dia para fazer compras e comprar o jantar, porque, afirma, a pandemia "não é tão feia como a imprensa gosta de pintar".
Já Emerson da Silva, 22 anos, saiu de casa sabendo o que comprar para namorada: uma sandália da Melissa. Cartão no bolso e Shopping Ibirapuera reabrindo, não tinha como dar errado. Tinha sim: a loja estava fechada.
A irmã, Érica da Silva, foi junto dar conselho, mas só pode opinar sobre os modelos que estavam na vitrine. Não deu certo hoje e amanhã Emerson fará nova e derradeira tentativa. Sairá de casa porque não tem medo da covid-19.
"Conheço gente que pegou [a doença], amigos. Ficaram bem e por isso eu não tenho medo. Trabalho normal, mas sempre tomando cuidado", afirmou.
Ingrid Conrado, 24 anos, estava na fila antes mesmo de o shopping Interlagos abrir. Saiu de casa para garantir que amanhã o namorado ganhe presente. Ela tinha 4 horas para escolher acreditava que seria mais do que o necessário: "Vim comprar presente do Dia dos Namorados. Pela internet ia deitar [demorar] muito".
Aglomeração em lojas de telefonia
No Interlagos, o distanciamento social foi ignorado no primeiro dia de funcionamento. O local de maior movimento foi um canto com lojas de três operadores de celular e um quiosque de aparelhos. As filas eram tão grandes que a de um estabelecimento emendava com a de outro. Não havia marcação no chão e os clientes ficavam colados um nos outros.
O shopping abriu às 16 horas e a aglomeração se formou em minutos. O protocolo que os shoppings se comprometeram a cumprir aconselhava a criar um fluxo nos pontos de maior procura. Mas, hoje, não havia um funcionário de loja ou segurança organizando a situação.
O corredor ficou fechado por uma fila e as pessoas que queriam chegar ou sair de uma loja de departamentos vizinha esbarravam em quem buscava um celular novo. Só havia algum alívio quando algum consumidor cansava as pernas e desistia das compras.
Tamires Lins, 25 anos, disse que estava chocada. Ela entrou no shopping, deu meia volta e falou que iria embora. Acrescentou que esperava movimento, mas não o que encontrou.
"Não dá para funcionar assim. É tão estranho que nem sei o que te dizer. É bizarro. Se é para entrar para pegar coronavírus, o lugar é aqui", afirmou.
Tamires não era a única pessoa espantada. Muitos clientes tiravam fotos e faziam comentários recriminando a cena. A preocupação não era só de clientes. A funcionária de uma loja de celular confirmou que estava com medo de pegar covid-19 e levar para casa. Ela não escondia o incômodo por estar cercada de gente e contou que trabalhava por obrigação.
Afirmou ainda se preparou para um cenário assim porque cada vez há mais gente na rua, e concluiu que as pessoas não perdoariam o primeiro dia de abertura dos shoppings. A funcionária estava irritada porque as pessoas podem resolver qualquer pendência com operadoras pelo telefone e comprar um celular pela internet. Mesmo assim, lotavam o Shopping Interlagos.
Perto das 18 horas a situação estava menos pior. Ainda havia filas sem as pessoas respeitarem o distanciamento. Mas o fluxo de clientes havia caído pela metade. Já era possível identificar qual fila era de qual estabelecimento. Mas o protocolo continuava sendo desrespeitado.
E isto aconteceu antes mesmo de as lojas abrirem. Centenas de pessoas chegaram antes das 16 horas e a fila era enorme. Para ir da entrada do shopping até o final da fila era preciso caminhar exato 1 minuto e 13 segundos. Os seguranças não deixavam as pessoas se amontoarem, mas eles estavam somente nos 10 metros finais.
Na região central, a abertura do shopping Higienópolis, não foi marcada por filas no horário de abertura. Cerca de 20 pessoas aguardavam às 15h45, em pé, sobre adesivos de distanciamento social rigorosamente colocados na entrada principal, a única aberta por enquanto.
O rigor com a higiene e o distanciamento social já começava na entrada. Com uma auxiliar de enfermagem medindo a temperatura corporal de todos e máscaras sendo distribuídas para algum desavisado aqui e ali. Na saída do shopping, um dispensador de álcool em gel acionado por sensor chamava a atenção.
Nos banheiros, a intenção de fazer valer o distanciamento social permitia o uso de mictórios alternadamente. A cada três apenas um estava funcionando. Para lavar as mãos, uma pia livre, outra tampada.
Muitas lojas ainda estavam fechadas no Higienópolis. Algumas em definitivo, outras em adaptação para, em breve, atender os clientes.
Na praça de alimentação, os funcionários eram rigorosos e informavam que um lanche ou um jantar só seria vendido para levar para casa. As mesas não estavam disponíveis. As poucas que havia no ambiente não tinham cadeiras. Os sofás estavam liberados, mas não era permitido comer no local. Os principais clientes eram lojistas e funcionários.
Ainda assim, havia pessoas que se encontravam no shopping para conversar e passear com seus cachorros, permitidos no estabelecimento.
O produtor Hugo Alves levou seu Lulu da Pomerânia para uma volta e aproveitou para procurar um presente para o namorado. Ao pedir uma foto, ele negou: "A Lili está estressada hoje".
Nas duas horas em que esteve no shopping Higienópolis, a reportagem não testemunhou aglomerações. As poucas filas eram nas lojas de telefonia celular. Lojas de perfumaria, decoração e joalherias tinham pouco movimento.
A reportagem do UOL acompanhou também a última hora de funcionamento do Shopping Center Norte, o maior da região norte da cidade. O estacionamento estava bem movimentado, assim como os corredores, com pessoas efetivamente comprando presentes para o Dia dos Namorados.
Cada loja era sinalizada com um aviso informando a lotação máxima. Apesar disso, poucas lojas atingiam a lotação máxima. As maiores filas eram em lojas de telefonia e chocolates.
Banheiros estavam sinalizados sobre o distanciamento social, com parte dos mictórios e pias interditados. Os responsáveis pela limpeza do sanitário, além de máscara, usavam avental que cobria até os tornozelos.
O shopping fechou rigorosamente às 20h. Quem vinha do hipermercado que funciona no complexo, e que fica aberto até 21h, não conseguiu entrar. Vazios ou quase somente os restaurantes, uma vez que só era permitido comprar para levar para casa e as mesas seguiam interditadas.
Monitoramento por autotutela
Procurada pelo UOL, a prefeitura de São Paulo informou que "o protocolo para reabertura de comércio e shoppings centers, acordado com as entidades de classe, prevê que a fiscalização e monitoramento serão realizados por autotutela do próprio setor. Também cabe aos lojistas promover ações de higiene e distanciamento social, inclusive em eventuais filas nas portas dos estabelecimentos".
Segundo a nota, as subprefeituras continuam fiscalizando os estabelecimentos que não estão permitidos a funcionar no município. Desde o início das restrições, cerca de 2.000 agentes têm trabalhado na fiscalização e 592 estabelecimentos foram interditados por descumprirem as regras vigentes.
"É importante destacar que a cidade permanece em quarentena. Os setores que têm permissão para funcionar devem seguir à risca as determinações, tomadas com base nas recomendações das autoridades de saúde. É obrigatório o uso de máscaras", diz o texto.
O UOL procurou a direção do Shopping Interlagos e a Associação Brasileira de Shoppings Centers para pedir um posicionamento sobre a situação. Assim que forem enviados, serão incluídos neste texto.
*Colaborou Arthur Sandes, do UOL, em São Paulo
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