Mostra contra o racismo usa projeções para 'reinventar' monumentos em SP
Grafites, filmes, fotografias e projeções da mostra "Vozes Contra o Racismo" vão tomar muros, vias públicas e monumentos na cidade de São Paulo até 31 de agosto. São obras que levam a reflexões sobre o colonialismo e o preconceito.
Com galerias, museus e outros espaços culturais fechados, devido à pandemia da Covid-19, vai ser possível conferir essa exposição ao circular pela capital paulista. As projeções, que contam com suporte do Coletivo Coletores, ocorrem nos cinco cantos da cidade, incluindo o Theatro Municipal e a Praça Roosevelt, na região central, e o Centro de Culturas Negras, na zona norte.
Segundo o antropólogo Hélio Menezes, curador da mostra, a escolha dos locais a serem "reinventados" foi feita com base nos seu significado para região, já que o objetivo das intervenções é utilizar a arte para reler a simbologia de alguns monumentos.
Um deles é o "Monumento às Bandeiras", do escultor Victor Brecheret. Criada para homenagear as controversas figuras dos bandeirantes, a obra é um dos mais conhecidos cartões postais da capital e fica na região do Parque do Ibirapuera, na zona sul. Se, por um lado, os representados são tidos como desbravadores dos sertões do país, por outro, dizem que são responsáveis por exterminar povos indígenas.
Para retratar essa condição controversa, o monumento recebe a projeção "Brasil Terra Indígena" de Denilson Baniwa, artista e ativista dos direitos indígenas. Usando luzes, Baniwa representa o naufrágio de uma embarcação portuguesa, que é tragada para o fundo do mar pelas forças da natureza.
A projeção traz também desenhos de animais como pássaros, serpentes e peixes, um conjunto de árvores que se erguem sobre as figuras dos bandeirantes. Além disso, são projetadas sobre a pedra as frases "SP Terra Indígena" e "Brasil Terra Indígena".
Já a Igreja do Rosário dos Homens Pretos da Penha e a Praça Ramos, no centro, recebem as projeções de Tereza de Benguela, uma líder quilombola do século 17. O templo religioso foi escolhido por ter sido construído pela Irmandade dos Homens Pretos, um grupo fundado por negros escravizados que queriam professar sua fé e não podiam frequentar os mesmos espaços sagrados do restante da população no século 18.
Para Menezes, que atua como crítico e pesquisador de arte contemporânea do Centro Cultural São Paulo, a exibição faz mais do que brincar com uma possível reviravolta na história do Brasil.
A mostra joga luz sobre questões de pertencimento, diversidade, identidade, combate ao racismo, ao preconceito e às desigualdades, mas também sobre afetos e novas imaginações de vida em sociedade
No caso do Monumento às Bandeiras, Menezes diz que a projeção é uma forma de propor um novo imaginário a partir de mitologias e cosmologias indígenas diante de uma obra que tem significado histórico colonialista. Desse ponto de vista, o artista consegue driblar a solidez da escultura em pedra.
Ele vai apagando momentaneamente os seus personagens principais da paisagem urbana e cedendo espaço para outros protagonistas
A escolha de Baniwa não foi aleatória. Ele é indígena e constrói obras que exploram formas de descolonizar as artes.
"A prática artística de Baniwa dialoga diretamente com os questionamentos cada vez mais intensos sobre o Monumento às Bandeiras e outros locais de memória como violência colonial", explica o curador.
Baniwa faz parte de um grupo de artistas contemporâneos, como Sallisa Rosa, Rafa Kennedy e Xadalu, também presentes na mostra, que produzem obras que discutam racismo e colonialismo.
Além da obra dele, a programação conta também com os grafites de Mauro Neri, Diego Mouro, Grupo OPNI, Luna Bastos e Robinho Santana, e uma série de lambes e instalações em diversos pontos da cidade.
O projeto também contou com um ciclo de seminários on-line, que ocorreu até esta sexta-feira (31).
Menezes explica que o projeto surgiu a partir de diálogos entre as Secretarias Municipal de Cultura e Direitos Humanos e Cidadania, através da Coordenadoria de Promoção da Igualdade Racial, "com o objetivo de dar visibilidade, fazer circular e ocupar a cidade com obras tão potentes".
Para o curador, o projeto abre espaços para diferentes modos de combater o racismo, o que é, na sua visão, uma, mas certamente não a única, maneira de rever como a história tem sido escrita.
"Vozes contra o Racismo":
Quando: até 31 de agosto
O que: instalações artísticas (projeções, lambes e grafites) pela cidade de São Paulo
Programação completa:
https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/noticias/?p=28447
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.