Com filas, tempo nublado e turistas, Rio já vive clima de fim de pandemia
Não deu praia. A bem da verdade, faz quase 2 anos que não dá. Embora Tim Maia siga cantando que não há nada igual ao que existe do Leme ao Pontal, o fato é que a pandemia... xoxou o Rio. Afinal, por mais estúpido que seja, ninguém consegue pegar um bronze de consciência limpa com 500 mortes por dia. Mas Deus é justo e verdadeiro (como já dizia Jorge Ben) e, aos poucos, as coisas estão voltando para o lugar.
É claro que, andando por aí, a gente ainda se assusta com algumas coisas, como uma mulher de jaleco branco medindo a temperatura na porta do shopping e o informe de que o bondinho foi sanitizado com "quaternário de amônio de 5ª geração", algo que quase ninguém vai ter a mais remota ideia do que seja — mas que certamente vai se sentir bem menos sujeito ao vírus ao saber que foi usado.
Pena que, nas ruas, o povo já não esteja seguindo todos os protocolos. Na Lagoa, é um tal de gente correndo de máscara na mão, no pulso, no cotovelo. Tem na cara também. Assim como tem muita gente sem máscara. A aversão ao item chega aos níveis do absurdo. Na Igreja da Ressurreição, no Arpoador, existe um presépio com seis esculturas. Na manhã de domingo (10), duas delas estavam com a máscara no queixo.
Porém, para muita gente, a pandemia ainda é uma dor de cabeça. Na Pedra do Arpoador, o vendedor de caipirinhas Willian Ramos leva uma manhã inteira para vender só seis copos. Em Copa, Felipe Silva faz esculturas na areia e viu o total de doações cair de R$ 300 para R$ 160, depois do coronavírus.
"Estou cansado de pesos e reais. Quero dólares, euros e libras de novo", protesta, ansioso pela volta dos gringos.
No Pão de Açúcar, um lojista me confidenciou aliviado que sua lanchonete hoje vende um terço do que vendia antes, já que logo assim que o bondinho reabriu, "as coisas estavam desesperadoras".
Tem quiosque no Posto 5 anunciando sorteio de micropigmentação de sobrancelha e alongamento de unhas para convencer o pessoal a sentar para almoçar.
"Vem, não tem ciclone", implorou a cantora no microfone. Só duas das 10 mesas estavam ocupadas.
Mas, aqui e ali, você já vê muita coisa voltando ao normal. É um entrevistado que deixa escapar que foi padrinho de casamento da prima, outro que diz que já está meio mamado, o tap-tap ininterrupto da quadra de frescobol na altura da Rua Bolívar. O Rio de Janeiro continua sendo.
Quinze pessoas numa fila para tirar foto com o mar ao fundo na Pedra do Arpoador: duas de máscara, quatro de calça comprida e você entende quando o Tom Jobim dizia que o Brasil não é para iniciantes.
"Vi uma fila em frente ao Forte de Copacabana e achei que fosse vacinação, mas era para ir à Confeitaria Colombo mesmo", conta Taiara Zanetti, de Porto Alegre, enquanto toma um chimarrão no Arpex. Ela vê filas. Onde? Em todos os lugares: na Lapa, nos bares chics que pipocam em Ipanema e onde mais ela e seu marido Mayko Dias tentam ir.
Um ônibus pirata com placa de Ouro Branco, Minas Gerais, em plena avenida Atlântica aguardando os últimos passageiros. Não é o Novo Normal não, é o velho mesmo e nós já estávamos com saudade.
Mais preocupadas com o frio do que com a pandemia, as bolivianas Maria Eli e Suzane me dizem que a escadaria Selarón foi o único local em que estiveram que acharam muito cheio. Menos mal. Melhor assim.
No Galeto Sat's, uma cena sentimental. Um marmanjo faz uma chamada de vídeo. "Renatão, meu cunhado, você é unanimidade aqui. Semana que vem, vou aí estar com vocês", diz. As pessoas estão marcando de se ver novamente. É quase impossível conseguir uma mesa num restaurante do NorteShopping numa noite de domingo outra vez e até o preço dinâmico dos aplicativos já está de volta.
É como diz o último verso do samba da Vila do ano que vem em homenagem ao Martinho que eu não parei de ouvir nas últimos dias: a vida vai melhorar.
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