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Sobe para 126 o número de mortos por causa das chuvas em Pernambuco

Chuvas em Pernambuco

Do UOL, em São Paulo

02/06/2022 12h21Atualizada em 02/06/2022 13h33

Ao menos 126 pessoas morreram e duas estão desaparecidas por causa das chuvas que atingiram Pernambuco entre quarta-feira (25) e o início da tarde de hoje (2), informou a Defesa Civil do estado.

Com isso, a tragédia supera chuvas e cheias de 1975, quando 107 pessoas morreram no estado. A enchente de maio de 1966 matou 175 pessoas e continua como o maior desastre da história de Pernambuco.

O total de desabrigados subiu para 9.302. Essas pessoas estão em 111 abrigos distribuídos em 27 municípios. Uma das pessoas desaparecidas sumiu "em um deslizamento em Camaragibe, e a outra é um homem que foi arrastado pela enxurrada em Paratibe, em Paulista", diz a Defesa Civil.

O governo decretou situação de emergência, assim como 24 municípios. O decreto de situação de emergência permite que os municípios solicitem recursos do Sistema Nacional de Defesa Civil.

Os municípios em emergência são: Recife, Olinda, Jaboatão dos Guararapes, São José da Coroa Grande, Moreno, Nazaré da Mata, Macaparana, Cabo de Santo Agostinho, São Vicente Férrer, Paudalho, Paulista, Goiana, Timbaúba, Camaragibe, breu e Lima, Aliança, Araçoiaba, Bom Jardim, Glória do Goitá, Igarassu, Limoeiro, Passira, São Lourenço da Mata e Vicência.

Além do decreto, R$ 100 milhões foram disponibilizados para os trabalhos de busca e salvamento nas áreas atingidas, assim como para obras de infraestrutura nos municípios atingidos pela chuva.

Na capital Recife, a Prefeitura divulgou que há 3.811 pessoas alojadas em 34 abrigos emergenciais temporários. A administração também notificou 148 ocorrências desde o início das chuvas, há quase uma semana, e informou que 15 mil toneladas de resíduos sólidos já foram removidas da cidade.

Cantora salva 14 animais

A imagem do reencontro com o cão de estimação Bolt revela o alívio da cantora recifense Mary Rosa ao confirmar que tinha conseguido salvar o animal da cheia do rio Capibaribe, no bairro da Várzea, no Recife. Ela perdeu todos os bens que estavam no imóvel, inclusive os instrumentos musicais dos quais depende para trabalhar.

Além dos cãezinhos Bolt e Branquinha, a cantora conseguiu retirar a tempo da casa —tomada até o teto pelas águas— 12 gatinhos, que colocou em um recipiente onde guarda comida para que pudessem boiar.

No último sábado (28), ela acordou com o barulho da água entrando na casa. A água ultrapassou os 5 m de altura no terreno da residência.

Meus cachorros colocavam as patas pela janela e não conseguiam achar chão! Ficavam uivando, desesperados. Quando meu marido me levou nadando até a outra ponta [uma casa vizinha com saída para a avenida principal do bairro], a correnteza fazia uma espécie de redemoinho. O medo era de ser puxada pelo rio."
Mary Rosa, cantora

A água subiu rapidamente, mas com a ajuda do marido, que sabe nadar, Mary retirou os dois cães e os gatos e os levou para o terreno de um morador em uma parte mais alta do bairro. Os animais passaram a noite lá, enquanto a cantora e o marido tentavam salvar objetos pessoais e monitoravam o volume do rio.

Somente quando amanheceu, no dia seguinte, Mary Rosa foi buscar os cães e gatos, e a fotografia do reencontro foi registrada —Bolt correu para os braços dela quando a viu de volta ao terreno. Quando a água baixou e o casal voltou para casa, o cenário era de destruição.

Gatinhos salvos pela cantora Mary Rosa, que teve a casa tomada pela cheia do rio Capiberibe - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Gatinhos salvos pela cantora Mary Rosa, que teve a casa tomada pela cheia do rio Capiberibe
Imagem: Arquivo Pessoal

Plano contra tragédia demorou 2 dias

O Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), órgão federal ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, emitiu um boletim geo-hidrológico na última quarta-feira (25) em que alertou para o "risco alto" de chuvas intensas e de deslizamentos na região metropolitana do Recife.

Mesmo com o alerta, a prefeitura da capital pernambucana só acionou o plano de contingência na sexta-feira (27), quando a Apac (Agência Pernambucana de Águas e Clima) emitiu um outro comunicado informando a previsão de chuva intensa para o final de semana. Entre sexta e ontem, o estado contabilizava 79 pessoas mortas em consequência das chuvas e 3.957 desabrigados.

Procurada, a Prefeitura do Recife confirmou ter usado como referência os alertas da Apac.

Plano de contingência é um planejamento previsto em lei federal de 2012, determinando que os municípios tenham definidas ações de proteção e defesa civil. Elaborado a partir de uma hipótese de desastre, é nele que está a definição de procedimentos, ações e decisões em caso de eventos extremos, com preparação e resposta ao ocorrido.

Fenômeno atípico

As fortes chuvas que atingiram o Recife e cidades vizinhas foram provocadas por um sistema climático conhecido como Distúrbio Ondulatório de Leste. Ele tem como uma de suas principais características o deslocamento da massa de ar do oceano Atlântico para o continente.

Ele se movimenta em ondas. "A primeira onda vem trazendo chuvas de moderadas a fortes. O segundo movimento é caracterizado pela ausência ou reduzida precipitação. Na terceira onda, normalmente, podemos esperar chuvas ainda mais intensas", explicou o meteorologista Fabiano Prestelo, da Apac (Agência Pernambucana de Águas e Climas).

Segundo ele, a primeira onda observada no Distúrbio Ondulatório Leste deste ano foi justamente da última terça para a quarta. Neste momento, o fenômeno está começando a se dissipar.

De acordo com a Agência Pernambucana de Águas e Clima, apesar da redução no volume, as precipitações devem continuar, com intensidade moderada, até a próxima sexta-feira (3), na região metropolitana do Recife e na Zona da Mata, "diminuindo no final de semana no litoral pernambucano".

História de perdas

Eram 2h do sábado (28), chovia forte no Recife e a dona de casa Camila Barbosa da Silva, 24, nem sequer conseguia cochilar. Moradora da comunidade ribeirinha B13, na zona oeste da cidade, às margens do Capibaribe, estava apreensiva e temia pela segurança dela e dos filhos pequenos, de 2 e 5 anos.

Durante duas horas, o nível do rio parecia ter estabilizado. Ela tinha esperanças de que tudo acabasse bem, como em outras chuvas. Mas desta vez foi diferente. Camila disse que nunca viu a água do rio subir tanto e tão rápido.

"De repente, subiu com tudo, feito uma avalanche. Em poucos minutos, a maré já estava na minha cintura. Só deu tempo de pegar meus filhos e chegar até a casa da minha mãe, que fica um pouco mais em cima", contou ao UOL a dona de casa, que perdeu todos os móveis.

Mais de 90 pessoas morreram em cidades do Grande Recife em decorrência das fortes chuvas desde a última quarta-feira (25). O total de desabrigados é de cerca de 5.000 moradores, segundo a Defesa Civil do estado. O governo decretou situação de emergência, assim como 14 municípios da região metropolitana.

Com 61 anos e dificuldade para se locomover, Maria Lúcia de Arruda, que mora com o marido de 70 anos na comunidade, acredita que também não tem mais condições de viver no local.

Vivemos momentos de terror, muita água, com medo de levar choque elétrico, o chão escorregando e nossas coisas sendo levadas pela água"
Maria Lúcia de Arruda, 61

Do lado de fora das casas, pelos becos da comunidade, ficou o rastro do estrago causado pelo temporal: geladeiras quebradas, móveis destruídos, panelas espalhadas pelo chão e até mesmo uma jangada arrastada do rio pela correnteza.

"Só hoje [segunda], quando a chuva passou e a água do rio desceu, conseguimos voltar para ver os estragos. Começamos a limpar e organizar tudo. Vamos ver o que será possível de recuperar", disse Felipe.