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Adolescente conta em carta à mãe que foi estuprada pelo pai durante 11 anos

O caso foi registrado na Delegacia da Mulher de Mongaguá e o pai da adolescente foi encontrado e preso cautelarmente - Reprodução/Google Maps
O caso foi registrado na Delegacia da Mulher de Mongaguá e o pai da adolescente foi encontrado e preso cautelarmente Imagem: Reprodução/Google Maps

Maurício Businari

Colaboração para o UOL, em Santos

27/06/2022 14h06Atualizada em 27/06/2022 15h35

Cansada de sofrer abusos praticados pelo próprio pai desde que tinha 5 anos de idade, uma adolescente de 16 anos decidiu criar coragem para contar à mãe o que estava acontecendo. Ela escreveu em uma carta que o pai a estuprava constantemente e que, segundo ela, ameaçava matá-la e ao seu irmão caso contasse a alguém sobre o que acontecia. A mãe denunciou o caso à polícia e o homem, de 57 anos, confessou os abusos e teve a prisão cautelar decretada.

O caso ocorreu na cidade de Mongaguá, no litoral sul de São Paulo. Em depoimento ao Creas (Centro de Referência Especializado da Assistência Social) do município, ela confirmou que vinha sido vítima de violência sexual praticada pelo pai desde os 5 anos de idade. E que tinha medo de denunciar o que acontecia por conta das ameaças.

A denúncia foi oficializada junto à Delegacia de Defesa da Mulher do município. Agentes da unidade capturaram o suspeito na tarde de quinta-feira (23). Ele estava escondido em uma residência no bairro Jardim Leonor.

Ele foi apontado pelas investigações em curso como responsável pelo estupro de vulnerável, cometido de forma reiterada contra a própria filha, durante 11 anos. Segundo informações da Polícia Civil, ele confessou os abusos, mas refutou as ameaças à vida da filha.

Com a prisão cautelar decretada, o homem foi conduzido ao sistema penitenciário. A investigação foi encaminhada ao Ministério Público, que avaliará se existem elementos para a abertura de uma ação na Justiça. O caso segue em segredo de Justiça.

O papel da mãe em caso de abuso dos filhos

Especialistas ouvidos pelo UOL explicam que é papel da mãe, assim que toma conhecimento, reportar os abusos sofridos pelos filhos às autoridades. Muitas vezes, porém, não é isso que acontece. Com receio de perderem seus parceiros, muitas mães acabam desacreditando os filhos ou até mesmo encobrindo os atos de seus maridos ou namorados.

"Quando uma criança é abusada desde muito pequena, ela não entende que está sofrendo um abuso. Ela entende aquilo como um carinho, porque geralmente o abusador disfarça a violência com demonstrações de carinho", explica a psicóloga forense Deise Cristina Gomes.

"A criança também não sabe o que é permitido que seja feito com o seu corpo até mesmo por falta de orientação dos próprios pais. Por isso a mãe, ao invés de se virar contra filha, de se irritar, de querer bater e querer culpá-la, ela tem que sempre apoiar e acolher essa criança".

Na opinião do professor doutor em Direito Penal Luciano Santoro, a mãe que é alertada pelos filhos sobre possíveis abusos e não denuncia também está cometendo um crime. Ela estaria desprezando o dever de agir, que está previsto no Artigo 13, parágrafo 2º do Código Penal.

"Se a mãe não toma providências tendo sido comunicada pela filha do que houve, ela responde igualmente pela prática do crime, porque ela tem o dever de impedir o resultado. Não foi o que ocorreu nesse caso em Mongaguá, em que a mãe denunciou os abusos. Mas esse tipo de omissão é muito comum. Muitas vezes a mãe finge que não vê o que está acontecendo, chega até mais tarde do trabalho para não ter que enfrentar a situação", explicou Santoro

Segundo o especialista, se condenado por estupro de vulnerável, o pai da adolescente de Mongaguá receberá uma pena que varia de oito a 15 anos de prisão, acrescida de metade dessa pena pelo crime ter sido praticado por um ascendente. Se for considerado o concurso de crimes pela reiteração de comportamentos a pena pode ser acrescida de até dois terços do total.

Como notar os sinais de abuso

A psicóloga forense afirma que muitas pessoas julgam as vítimas pela demora em denunciar os abusos, como no caso ocorrido em Mongaguá. "A criança, somente depois de uma certa idade irá compreender que aquilo que ela sofreu foi um abuso", explica Cristina, sugerindo que as pessoas se coloquem no lugar das vítimas antes de julgar seu comportamento.

"É preciso que as pessoas entendam que, muitas vezes para a vítima, falar sobre o que ela passou traz dor, sofrimento, angústia, uma revivência do trauma que ela não gostaria de se lembrar nunca mais e quanto mais as pessoas acusam, mais a vítima sofre".

O silêncio e o ato de se calar, acompanham a maioria das vítimas de violência sexual, principalmente entre as crianças. Por essa razão, explica a especialista, os pais e responsáveis devem ficar atentos a alguns sinais que indicam que a criança ou adolescente pode estar sendo vítima de abusos.

"As vítimas se tornam submissas, podendo apresentar comportamento extremamente agressivo e antissocial. Elas amadurecem mais depressa e começam a apresentar brincadeiras de cunho sexual inapropriadas para a idade. Preferem passar a maior parte do tempo na escola ou qualquer outro lugar, longe de casa", avisa Deise.

"Ela também pode apresentar dificuldades em fazer amizades e não participa de atividades sociais na escola, onde seu desempenho escolar pode diminuir. Elas também podem apresentar uma desconfiança quanto às pessoas, geralmente sentem medo de adultos do mesmo sexo que seu abusador".