Mulheres descobrem, aos 37 anos, que foram trocadas na maternidade em SP
A vida de duas famílias de Sertãozinho, no interior de São Paulo, mudou completamente depois que elas descobriram que as filhas, hoje com 37 anos, foram trocadas na maternidade da Santa Casa da cidade. O hospital não quis se manifestar sobre o assunto.
A confeiteira Mônica Tatiane Ribeiro, 37, foi registrada como filha do companheiro da mãe dela, Maria de Lurdes, mas era fruto de uma relação anterior da genitora. Quando quem ela pensava ser seu pai biológico faleceu, em outubro do ano passado, por questões de inventário, foi necessário que ela fosse submetida a um exame de DNA.
Para a surpresa de toda a família, o resultado mostrou que ela não tinha genoma compatível nem com a mãe nem com o suposto pai biológico. Foi o primeiro passo para a descoberta da troca na unidade de saúde que abalaria duas famílias.
Quando o laboratório me deu o resultado de incompatibilidade eu não conseguia acreditar. Nunca tivemos nenhuma desconfiança de que eu não fosse filha da minha mãe. Fizemos dois exames, em locais diferentes, para ter a certeza.
Mônica Tatiane Ribeiro, confeiteira, filha de Maria de Lurdes e filha biológica de Regina
Após a descoberta, a mulher procurou a Santa Casa da cidade, onde havia nascido. Segundo o registro hospitalar, no dia 1º de dezembro de 1985, ela e outras oito meninas haviam nascido na unidade de saúde.
"O hospital foi por exclusão. Viu qual era a outra bebê que havia nascido no horário mais próximo e descobriu que a mãe chamava Maria Regina, nome parecido com o da minha mãe [de criação], que é Maria de Lurdes, e elas tinham a mesma idade", acrescenta.
Com o cruzamento das informações, a Santa Casa enviou uma carta para a corretora de imóveis Maria Regina Dias do Nascimento Fernandez, 56, moradora de Ribeirão Preto, cidade vizinha a Sertãozinho — e mãe de Thaísa Nascimento Fernandez, 37, filha biológica de Maria de Lurdes.
No comunicado, a instituição solicitou a presença de Regina no hospital. A corretora de imóveis recorda que, inicialmente, não deu importância e imaginou que o assunto teria relação com o falecimento dos seus pais, anos antes. "Eu imaginei que poderia ser alguma cobrança tardia de quando minha mãe foi hospitalizada e por estar bastante atarefada, demorei uma semana para retornar o contato", recorda Regina.
A corretora conta ainda que o provedor pediu para ela ir presencialmente ao hospital, já que o assunto era importante e não poderia ser tratado por telefone. Sem entender a situação, Regina pediu então para que a reunião fosse virtual, já que ela não estava na região.
Quando ele me falou que podia ter ocorrido a troca dos bebês, foi um choque porque jamais imaginei esse tipo de situação. Inicialmente eu duvidei, mas depois fica aquela dúvida. Lembro que eu estava com uma amiga em casa e eu não contei nada para ninguém.
Maria Regina Dias do Nascimento, corretora, mãe de Thaísa e mãe biológica de Tatiane
Após a conversa, a unidade de saúde solicitou que Regina e Tatiane fizessem juntas um novo exame de DNA para verificar a compatibilidade de genomas.
Confirmação científica
O primeiro encontro entre Regina e Tatiane foi no laboratório onde o exame foi realizado. Inicialmente, as duas não acreditavam na troca dos bebês, mas a certeza veio logo na sala de espera.
A nossa semelhança física é notória, quando eu a vi ali, tive a certeza da troca e comecei a chorar.
Regina
O teste de DNA deu 99,9% de compatibilidade da relação biológica entre Regina e Tatiane. Dias depois a filha de Regina, Thaísa, também foi submetida a um exame de DNA junto a Maria de Lurdes e o resultado comprovou a troca, em 1985.
"Passa um filme na sua cabeça e você começa a lembrar de tudo o que aconteceu naquele dia. Recordo que a minha bebê chegou no quarto sem a pulseira de identificação e quando questionei, a enfermeira ela disse que havia caído", lembra Regina. "É um misto de sensações. Se abre um grande vazio, você fica triste e feliz porque é sua filha, mas, ao mesmo tempo não é. A vida vira de ponta-cabeça".
Doença genética
Thaisa, filha de Regina, tem epilepsia, doença que normalmente tem origem genética, e esquizofrenia. Regina recorda que os médicos perguntavam sobre essa origem genética e ela nunca teve ideia da resposta, já que ninguém na família desenvolveu as doenças. Regina é mãe também de Vitória Fernandez, 23.
Depois da descoberta da troca dos bebês, a família descobriu que um irmão biológico de Thaisa também sofria da doença, esclarecendo a herança do genoma familiar. Ele faleceu há dois anos.
"Aos quatro meses, Thaisa começou a ter as primeiras crises convulsivas e aos 15, recebeu o diagnóstico de esquizofrenia. Sempre lutei muito e busquei tratamentos médicos para que ela pudesse ter uma vida normal. Hoje ela lê, escreve, anda de bicicleta e patins e tem até um canal no YouTube em que ela ensina a cuidar de peixes, sua paixão", diz Regina.
Pós-descoberta
Após a descoberta da troca, as famílias se conheceram. Regina conta que ficou feliz em saber que a filha biológica tem três filhos e que Thaisa tem conseguido lidar com a situação.
"Ficamos com medo de ela ter um surto devido a toda essa confusão de sentimentos que a situação nos expõe. Mas é como eu costumo falar: as pessoas chegam na nossa vida para somar e assim será com Tatiane e com toda a família dela", afirma.
"A gente troca mensagens e já visitei a casa dela. Ainda é estranho, mas estamos mantendo vínculo", acrescenta Tatiane.
Tanto os pais adotivos quanto os pais biológicos de Tatiane e Thaísa já morreram.
A reportagem do UOL entrou em contato com a Santa Casa. O hospital disse que não vai se manifestar sobre o assunto. "Por envolver famílias e, em caso do processo correr em segredo de Justiça, o hospital resolveu não se manifestar por hora", declarou em nota oficial.
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