Em áudios, suspeitos comentam decisão de PCC de matar mulher em SP; ouça
Em áudios obtidos pelo UOL, é possível ouvir dois supostos criminosos comentando a decisão do "tribunal do crime" do PCC (Primeiro Comando da Capital) sobre o assassinato de uma mulher que negou um beijo a um traficante da facção criminosa em um bar no Itaim Paulista, zona leste de São Paulo (ouça no vídeo acima).
Nas mensagens, os dois suspeitos comentam o caso de assédio e a localização do paradeiro da vítima, que se escondeu em Taboão da Serra (Grande São Paulo) após denunciar o episódio em depoimento à Polícia Civil há três semanas.
Quando PCC a localizou. Em mensagem, um dos suspeitos cita quando a cuidadora de idosos Karina Bezerra, 26, foi sequestrada e mantida em cárcere privado após recusar as investidas de um traficante na noite de 14 de agosto, que tentou beijá-la e agarrá-la à força.
Ela disse à Polícia Civil ter sido sequestrada e mantida em cárcere privado até a manhã do dia seguinte, quando policiais militares a resgataram e prenderam nove suspeitos de envolvimento na ação.
"A menina lá... Certo, mano? Que tava nas mãos dos 'parceiro' [sic] que foi em cana. Tá lá no [sic] Taboão da Serra".
Decisão sobre a morte. Na sequência do áudio, o traficante conta que o homem que dava refúgio a Karina revelou o seu paradeiro a integrantes do PCC na região.
"Os 'irmão' [como são chamados os criminosos 'batizados' pelo PCC] já pulou pra montar um 'tabuleiro' [gíria para citar os 'tribunais do crime']".
Vítima contou ao PCC a mesma versão dada à polícia. Também em áudio, um outro suspeito de envolvimento no "tribunal do crime" comenta que Karina contou aos criminosos a mesma versão apresentada em depoimento à Polícia Civil, citando inclusive o apelido do traficante apontado como autor do assédio.
"Pros 'irmão' [sic] do Taboão... Ela tá mandando as mesmas ideia [sic] que ela mandou pra polícia lá, entendeu? Que o 'Xenon' lá, já falou o vulgo do 'irmão', o 'Xenon'. Quis ficar com ela e ela não quis. Os 'irmão' [sic], foi, pegou e levou ela pro 'tabuleiro'".
E, em seguida, encerrou a mensagem repetindo o mesmo recado dado pelo outro suspeito: "deixa a ciência pros parceiro [sic]".
Mulher foi morta na favela de Paraisópolis. Segundo a Polícia Civil, Karina foi assassinada na favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo.
Suspeitas de envolvimento no crime, três pessoas foram presas em flagrante na última quarta-feira (14) pelo Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais), indiciadas por tráfico, associação para o tráfico e porte ilegal de arma. Os agentes encontraram no local um revólver calibre 38 e apreenderam drogas, como crack, cocaína, maconha e lança-perfume.
Entre os presos, estava Brendon Soares, 27, apontado pelos investigadores como suspeito de ser o responsável pelo "tribunal do crime" do PCC na favela. Segundo a Polícia Civil, ele admitiu envolvimento no crime, mas não deu informações sobre o paradeiro do corpo. O UOL não conseguiu localizar a defesa do suspeito.
Os agentes também identificaram três imóveis a serviço do crime organizado, onde eram armazenadas as drogas.
Como foi o caso de assédio? Em depoimento, Karina disse ter ido a um bar na estrada Dom João Nery, no Itaim Paulista, com três amigas por volta das 22h de 14 de agosto. Cerca de duas horas depois, um rapaz identificado apenas como "Xenon" sentou na sua mesa, dizendo estar interessado nela. Mas ela disse ter recusado às investidas.
Contudo, ele teria insistido, segundo relato dado por Karina à Polícia Civil. "[O traficante do PCC] passou a tocá-la, segurar os seus braços, forçando abraços e beijos, mas ela se esquivou de todas as tentativas e começou a se irritar com ele. Inclusive, o xingou e eles passaram a discutir", disse, segundo relato em boletim de ocorrência ao qual o UOL teve acesso.
"A facção [PCC] que se diz contra crimes sexuais obriga mulheres a se relacionarem com os seus integrantes", disse o delegado Pedro Ivo Corrêa dos Santos, da 5ª Delegacia de Investigações sobre Furtos e Roubos a Bancos do Deic, responsável pela prisão dos suspeitos.
O que o traficante disse em meio à discussão? Após ser rejeitado por Karina, o assediador disse "que ela iria ser a mulher dele, por bem ou por mal, que ele era do PCC e que ficaria com quem ele quisesse", detalhou a vítima em seu depoimento.
Como ela foi sequestrada? Após xingá-lo, Karina relatou que o traficante reagiu, dizendo que "ela estava desacatando ele". Em seguida, tomou a chave do seu veículo, a puxou pelo braço e anunciou que ela seria sequestrada.
"Não é assim que se trata um irmão [em alusão ao fato de ser 'batizado' como membro do PCC]", teria dito o traficante, de acordo com o depoimento, antes de embarcar no veículo com outros três comparsas. Depois de um trajeto que durou cerca de 15 minutos, Karina foi levada ao cativeiro.
O que aconteceu no cativeiro? No cativeiro, Karina disse ter tido braço e pernas amarradas enquanto era questionada pelo chamado "tribunal do crime" por que não teria ficado com Xenon, que estava armado no local e a ameaçou de morte.
"Depois, ele foi embora. Mas antes mandou que os caras 'dessem um jeito' nela", disse a vítima em depoimento à Polícia Civil.
Mudança de cativeiro. Pela manhã, Karina disse ter presenciado a chegada de outras duas pessoas. Em seguida, relatou ter sido levada em um veículo para outro cativeiro, em frente a um barraco. Segundo ela, os criminosos aguardavam pela chegada de "Xenon" quando foram interceptados pelos policiais militares.
Como vítima foi localizada pelo PCC. Segundo a Polícia Civil, Karina foi para Taboão da Serra após relatar o episódio em depoimento, com medo de ser localizada pelo PCC. Contudo, a facção criminosa encontrou o seu paradeiro e a assassinou em outro "tribunal do crime".
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