Topo

Suspeito de agenciar 'escravizados do arroz' paga fiança e é solto no RS

11.mar.2023 - Adolescente resgatado por trabalho escravo em Uruguaiana - Divulgação/MPT
11.mar.2023 - Adolescente resgatado por trabalho escravo em Uruguaiana Imagem: Divulgação/MPT
Paulo Roberto Netto e Tiago Minervino

Do UOL, em Brasília

12/03/2023 14h46Atualizada em 13/03/2023 14h31

Um homem suspeito de ser o responsável pelo agenciamento ilícito de 56 trabalhadores resgatados em condições análogas à escravidão foi solto ontem (11) após pagar fiança. O nome do acusado não foi divulgado. Ele responderá ao caso em liberdade provisória.

Em depoimento à Polícia Federal, ele ficou em silêncio.

O juiz determinou que o réu deve seguir algumas determinações para manter a liberdade provisória:

  • Comparecimento bimestral em juízo para informar e justificar atividades;
  • Manutenção de telefone e e-mail atualizados para fins de comunicação relativa às medidas impostas;
  • Pagamento de fiança no valor de R$ 10 mil e cumprimento das obrigações dela decorrentes;
  • Comparecer ao juízo sempre que convocado e comunicar eventual mudança de residência;
  • Não se ausentar da cidade de sua residência por mais de oito dias sem comunicar ao juízo o lugar onde poderá ser encontrado;
  • Não praticar deliberadamente ato de obstrução ao andamento do processo;
  • Não resistir injustificadamente a ordem judicial e não praticar novas infrações penais de natureza dolosa.

A prisão ocorreu após a PF, o Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego deflagrarem uma operação na sexta-feira (10) em duas fazendas a 50 quilômetros da área urbana de Uruguaiana (RS).

Dos 56 trabalhadores resgatados até o momento em condições degradantes, dez são adolescentes. A operação segue em andamento em busca de outras pessoas que trabalharam no local.

Ao UOL, o auditor fiscal do trabalho Vitor Ferreira afirmou que os trabalhadores resgatados costumavam desmaiar de fome e sede. Sem condições de terminar a jornada, eles perdiam parte do salário.

"É evidente que os desmaios aconteciam e que não era dado nenhum cuidado pelo explorador da mão de obra. Se ele [o trabalhador] não cumprir a jornada, seja por qualquer motivo, não recebe [a diária]", disse.

Os investigadores querem saber se os donos da fazenda —- as estâncias Santa Adelaide e São Joaquim —- ou a empresa que comprou a produção de arroz eram os verdadeiros empregadores dos lavradores rurais.

O auditor Vítor Ferreira disse que, quando forem identificados, os verdadeiros empregadores serão punidos. Eles terão de arcar com dívidas, multas trabalhistas e administrativas e responder criminalmente.

O que mais os investigadores encontraram:

  • Sem local para guardar a comida, as mochilas com marmitas azedavam na roça. Os lavradores dividiam entre si o resto de alimentos que ainda não tinham estragado;
  • Formigas atacavam os alimentos dos trabalhadores enquanto eles estavam na roça;
  • Comida fria. Não havia onde aquecer os alimentos;
  • Agrotóxicos nas mãos de adolescentes. Eles retiravam uma praga da plantação, chamada de "arroz vermelho", manuseando agrotóxico;
  • Parte do grupo retirava a praga com facas de cozinha, em vez de foices;
  • Faltavam equipamentos de proteção, como botas, foices, chapéus, protetores solares;
  • As contratações eram feitas sem documentos e registro oficial;
  • Adolescentes trabalhavam enquanto fumavam maconha, fornecida pelos "gatos";
  • Não havia primeiros socorros e nem uma pessoa a quem recorrer em caso de acidentes de trabalho ou qualquer eventualidade em uma área rural grande e longe da cidade.

O UOL procurou a Federarroz (Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul) para comentar as suspeitas de trabalho análogo à escravidão, mas não obteve retorno.