PM repete versão em registros de morte no litoral de SP: 'Receita pronta'

A PM tem repetido uma mesma versão em todos os registros das sete mortes no fim de semana na Operação Escudo na Baixada Santista.

O que aconteceu

Suspeita de alteração de cena de crime. Em todas as ocorrências com morte em operações policiais na Baixada Santista no fim de semana, os PMs alegaram ter socorrido os baleados ainda com vida. Mas os sete suspeitos morreram a caminho do hospital, segundo a corporação.

Pouco mais de oito horas antes do início dessas operações, um soldado da Rota morreu ao ser baleado em serviço. A ação foi filmada pela câmera acoplada junto à farda da vítima.

Narrativa repetida reforça a suspeita. Sem o corpo no local dos disparos, a perícia fica impossibilitada de determinar como foi a dinâmica dos tiros dados por policiais e suspeitos, como alegado nos boletins de ocorrência aos quais o UOL teve acesso.

Sem provas técnicas. Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e perito criminal aposentado, Cássio Thyone Rosa diz que, em muitas ocorrências do tipo, a PM costuma alegar que o baleado ainda estava vivo para retirar o corpo do local, prejudicando a perícia. Depois, alegam que ele não resistiu aos ferimentos. "Sem cadáver no local, não é possível analisar a posição do corpo e discutir a possível trajetória de disparos", diz.

Suspeitos atiraram e estavam com drogas em todas as ocorrências, diz PM. Outra versão que se repetiu no relato dado pelos PMs nas ações foi a de que os suspeitos teriam atirado e estavam com drogas, apreendidas pela corporação. "Chama a atenção essa quantidade de casos de letalidade em um curto espaço de tempo", diz Rafael Alcadipani, professor da FGV e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

SSP diz que casos são investigados. A Secretaria da Segurança Pública diz que todas as ocorrências são investigadas pela Polícia Civil.

'Repetição parece receita pronta'

Os registros da PM são repetitivos, falando de troca de tiro, morte, drogas e armas encontradas com suspeitos. É uma repetição que parece uma receita pronta.
Cássio Thyone Rosa, perito criminal aposentado e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

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Em qualquer ocorrência de morte, o relato dos policiais costuma ser o mesmo. Parece que seguem um script. Nesse primeiro momento, a Polícia Civil é obrigada a registrar aquilo que foi relatado. O que vai diferenciar cada caso vai ser a investigação.
Rafael Alcadipani, professor da FGV e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

O que dizem as entidades

"Falta de transparência". O Codepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos da Pessoa Humana) critica a falta de transparência da operação.

Seis dos sete mortos chegaram ao IML sem qualquer tipo de identificação. "A ausência de identificação favorece a criação de um discurso que tenta passar à opinião pública a versão da polícia de que se tratava de bandidos", diz Dimitri Sales, presidente do Condepe.

SSP diz que três dos mortos ainda não foram identificados. De acordo com a pasta, os outros quatro já identificados tinham anotações criminais por tráfico de drogas, furtos e roubos. Outros cinco suspeitos foram presos, diz a SSP. Armas, munição, cartões bancários e celulares sem procedência foram apreendidos, informa o órgão.

Canais para denúncias. A Ouvidoria das polícias de São Paulo disse estar à disposição da população para coletar informações sobre possíveis irregularidades de policiais na Operação Escudo. O órgão diz ainda que irá solicitar imagens e laudos para acompanhar a investigação dessas mortes em decorrência de intervenção policial.

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Operação Escudo

A primeira Operação Escudo resultou na morte de 28 pessoas pela polícia. Os casos ocorreram entre julho e setembro do ano passado, após o assassinato de um policial da Rota. A Secretaria defende a legalidade da atuação policial.

Alta em mortes cometidas por policiais em serviço. Essas ocorrências subiram 39,6% em 2023 na comparação com 2022, segundo dados divulgados pelo governo.

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