Erro histórico do jornalismo brasileiro, caso Escola Base completa 30 anos
![A casa de um dos acusados no Caso Escola Base em 1994, foi alvo de depredação pela massa ensandecida A casa de um dos acusados no Caso Escola Base em 1994, foi alvo de depredação pela massa ensandecida](https://conteudo.imguol.com.br/c/tab/ec/2020/06/22/a-casa-de-um-dos-acusados-no-caso-escola-base-em-1944-foi-alvo-de-depredacao-pela-massa-ensandecida-1592855335640_v2_900x506.jpg)
No dia 28 de março de 1994, uma denúncia de um suposto abuso sexual na Escola Base, no bairro Aclimação, na região central de São Paulo, mudaria para sempre a vida dos donos do local e entraria para a história como um dos maiores erros do jornalismo brasileiro.
O caso Escola Base
Os proprietários da Escola Base foram denunciados injustamente. Icushiro Shimada e Maria Aparecida Shimada, a professora Paula Milhim e o esposo, o motorista Maurício Alvarenga, foram acusados de abuso sexual de crianças de quatro anos, alunos do local.
Havia também queixas de que os quatro aproveitavam o horário escolar para levar os estudantes para moteis, onde seriam filmados e fotografados nus.
Mesmo sem mandado, a polícia foi acionada e fez buscas tanto na escola, quanto na casa de uma das crianças citadas na denúncia. Como voltaram sem provas, as mães denunciantes telefonaram para a TV Globo, pedindo ajuda.
A mídia, à época, reproduziu a história, mesmo com a falta de provas. Jornais de grande circulação, programas de TV e rádio passaram a acusar os donos e funcionários da escola de pedofilia, provocando uma comoção contra os envolvidos, que precisaram se esconder. O local, inclusive, chegou a ser atacado por vândalos.
Em entrevista ao UOL em 2022, Ricardo Shimada, 44, filho de Icushiro e Maria Aparecida, relembrou uma fala de Hebe Camargo, em que a apresentadora teria pedido a morte de seus pais.
Eu não sei se não acharam todo o arquivo original, mas ela pediu a morte dos meus pais. Nesse dia que a Hebe falou disso, a minha mãe sofreu um derrame no olho por todo o estresse que já estava passando e ela estava num oftalmologista. Logo que a Hebe falou isso, foi lançada a prisão preventiva dos meus pais. Na hora, eu liguei para eles e mandei eles irem embora porque seriam presos.
Ricardo Shimada
No entanto, tudo era mentira. Investigações posteriores confirmaram que nenhum dos acusados participou de abusos sexuais contra os alunos.
O estrago, porém, já estava feito. Icushiro e Maria Aparecida precisaram fechar a escola e mudar de São Paulo para recomeçar a vida. Apesar do amor pelo ofício, eles não voltaram a trabalhar na área da educação.
![Fachada da Escola Base, que foi vandalizada após as denúncias infundadas Fachada da Escola Base, que foi vandalizada após as denúncias infundadas](https://f.i.bol.com.br/2013/03/31/em-marco-de-1994-os-proprietarios-socios-e-uma-professora-da-escola-base-em-sao-paulo-foram-injustamente-acusados-de-abuso-sexual-contra-alguns-alunos-de-quatro-anos-jornais-revistas-emissoras-de-1364741645631_750x421.jpg)
Mea culpa
O mea culpa da imprensa começou ainda em 1994. Jornais da época frisaram em notícias e manchetes a falta de provas contra os acusados e o pesadelo vivido por cada um deles.
O pedido de desculpas mais contundente foi o de Valmir Salaro, ex-repórter da Rede Globo. O jornalista, autor da primeira reportagem sobre o tema na época, lançou na Globoplay, em 2022, o documentário "Escola Base - Um Repórter Enfrenta o Passado".
A produção esmiúça os fatos e explica o lado de Valmir na história. Em entrevista ao "Fantástico" (TV Globo) na época de lançamento do documentário, o jornalista destacou a importância de alertar as próximas gerações sobre os erros cometidos naquela época.
A maioria dos jornalistas que cobriram o caso nunca quis falar sobre o erro. As pessoas, obviamente, preferem falar sobre os seus acertos e as grandes reportagens que fizeram. Eu não. Eu acho importante falar sobre o erro da Escola Base em todos os aspectos para alertar, não só os colegas, mas também os novos jornalistas
Valmir Salaro
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Para Emílio Coutinho, autor do livro "Escola Base", de 2016, o documentário foi uma boa forma de recuperar imagens. Segundo o jornalista e escritor, muitos registros da época haviam "sumido". "Acho importante que a Globo tenha aceitado falado desse caso, mesmo que tanto tempo depois", pontua Coutinho.
Salaro disse ao UOL, também em 2022, que se arrepende de ter feito a primeira reportagem sem insistir no contato pessoal com os donos da escola e com os outros investigados que tinham sido denunciados pelas mães. "Ao ouvi-los, eu poderia ter desconfiado mais, poderia ter tido uma outra impressão daquela história que, num primeiro momento, me pareceu muito verdadeira".
O jornalista também prefaciou o livro "O filho da injustiça", publicado por Ricardo Shimada em 2023.
O perdão
Mesmo com os traumas e as lembranças dos momentos ruins, Ricardo disse ao UOL que não tem mais mágoa dos envolvidos - principalmente de Valmir Salaro.
Por mais que ele tenha errado, a gente já conversou e ele já me pediu perdão pelo que aconteceu. Afinal, ele foi a única pessoa de caráter que quis conversar, não foi nem só para pedir perdão, mas falar conosco. Tem muitas pessoas envolvidas, não só as mães e os delegados, há vários repórteres, diz Ricardo.
![Valmir Salaro e Ricardo Shimada, filho do casal de proprietários da Escola Base, já falecidos Valmir Salaro e Ricardo Shimada, filho do casal de proprietários da Escola Base, já falecidos](https://conteudo.imguol.com.br/c/entretenimento/11/2022/11/10/valmir-salaro-e-ricardo-shimada-filho-do-casal-icushiro-shimada-e-maria-aparecida-shimada-proprietarios-da-escola-base-ja-falecidos-1668116222501_v2_750x421.jpg)
Valmir contou ao UOL como se sentiu ao retornar à história para a produção e encarar as pessoas ligadas à Escola Base. "A todo momento, antes dos encontros, eu me perguntava como os envolvidos no caso me receberiam, se aceitariam minhas desculpas, se entenderiam o que me fez fazer aquela primeira reportagem. Então foi um processo difícil, de muita angústia", explica.
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