Recusa ao bafômetro sobe mais de 1.000% em 10 anos na cidade de São Paulo

O número de motoristas multados por se recusarem a fazer o teste de bafômetro na cidade de São Paulo explodiu nos últimos dez anos.

O que aconteceu

Recusa saltou 1.081% no período. Dados obtidos pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação) mostram que, em 2014, 2.931 motoristas foram multados por se negarem a soprar o bafômetro. No ano passado, esse número foi de 34.627.

De 2014 até março deste ano foram 180.294 infrações deste tipo na capital paulista. Os dados envolvem apenas ocorrências registradas pelo CPTran (Comando de Policiamento de Trânsito), da Polícia Militar. Equipes do Detran também realizam operações para reduzir acidentes causados pelo consumo de bebida alcoólica, apoiadas por equipes das polícias Militar, Civil e Técnico-Científica. Uma mudança na legislação no ano passado também permite que agentes da CET realizem esse tipo de fiscalização.

Ao ser barrado em uma blitz da Lei Seca o motorista tem a opção de não realizar o teste do bafômetro. Isso acontece devido ao princípio constitucional de que ninguém é obrigado a gerar provas contra si mesmo perante a lei.

Já o número de multas por embriaguez tem caído. Foram 8.852 autuações em 2014 e 865 no ano passado. Nesses casos, previstos no artigo 165 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro), o motorista sofre uma série de sanções:

  • Pagamento de multa de R$ 2.934,70 (valor dobra se o motorista for reincidente no período de um ano);
  • Recolhimento da CNH;
  • Direito de dirigir suspenso por um ano;
  • Carro pode ser retido caso não haja outro motorista habilitado para conduzi-lo no momento.

Negativa ao bafômetro permite evitar acusação de crime de trânsito, o que pode explicar aumento nos registros, afirmam especialistas. "A recusa é a chance de a pessoa escapar de penalidade maior", esclarece Carlos Eduardo Dias Djamdjian, membro da Comissão de Direito da OAB São Paulo. "Pelo fato de a embriaguez ao volante ser tipificada como crime pelo Código de Trânsito Brasileiro, a autoridade de trânsito pode dar voz de prisão ao infrator", diz o advogado Marcos Poliszezuk.

O número de CNHs ativas na cidade de São Paulo é de mais de 4,8 milhões, segundo dados do Detran. Nada impede, no entanto, que um motorista com carteira de habilitação de outra cidade ou estado seja multado na capital.

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Infração e crime

A diferença entre infração e crime está no índice apontado pelo etilômetro. Se o resultado for superior a 0,3 miligramas de álcool por litro de ar expelido, o condutor pode responder por crime de trânsito. No exame de sangue, esse índice tem de ser igual ou superior a 6 dg/L (seis decigramas por litro de sangue).

Quando isso ocorre, o motorista é preso em flagrante com base no artigo 306 do CTB. Ele prevê uma pena de seis meses a três anos de detenção, além de multa e suspensão ou proibição do direito de dirigir.

O número de motoristas presos na cidade sob a suspeita de embriaguez quase dobrou em dez anos. Foram 100 em 2014 e 195 em 2023. De 2014 até março deste ano foram contabilizadas 3.175 prisões.

Dado o fato de a pena máxima desse crime ser inferior a quatro anos, o próprio delegado pode estipular uma fiança para que o suspeito, após o pagamento, responda à acusação em liberdade.

Recusar teste não significa passar ileso

O artigo 165-A do CTB estabelece uma série de sanções ao motorista que não quiser se submeter ao teste. O tratamento é o mesmo que o dado a um condutor comprovadamente embriagado, com pagamento de multa e outras sanções.

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Bafômetro, no entanto, não é a única forma de comprovar embriaguez. Se o condutor demonstrar sinais que indiquem que ele está alterado sob o efeito de álcool, como voz enrolada, tontura, olhos vermelhos e cheiro de bebida, ele já pode ser autuado. Segundo Djamdjian, são necessários no mínimo dois desses requisitos.

Governador de SP disse que a PM falhou em não fazer o flagrante de motorista de Porsche que matou homem em março, mesmo sem bafômetro. Os policiais não tinha o aparelho no atendimento da ocorrência, mas Tarcísio de Freitas (Republicanos) reconheceu que a identificação da alcoolemia poderia ter feita de outras formas.

Não ficou comprovado que o motorista estava embriagado porque não houve teste ou exame de sangue. Fernando Sastre de Andrade Filho, 24, nega ter ingerido bebida alcóolica naquele dia, mas testemunhas relataram que ele estava alcoolizado e "não conseguia nem sequer parar em pé". Um vídeo também o mostra com a voz arrastada antes da colisão. Ele está preso desde 6 de maio e é réu pelos crimes de lesão corporal gravíssima e homicídio doloso qualificado.

Lei Seca completa 16 anos em junho

Ela recebe esse nome porque estabelece tolerância zero ao consumo de bebidas alcoólicas por motoristas. Porém, uma resolução do Contran (Conselho Nacional de Trânsito) determina que seja descontada uma margem de erro do resultado apresentado pelo bafômetro. Isso acontece porque, por ser um aparelho eletrônico, considera-se que ele pode apresentar falhas.

Com isso, o condutor só será autuado pela Lei Seca se o resultado do seu teste acusar um valor a partir de 0,05 gramas de álcool por litro de ar alveolar. Um copo de chope ou uma taça de vinho já são suficientes para que o aparelho acuse o resultado suficiente para que o motorista seja penalizado.

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Pesquisa identificou queda de 32% nas mortes decorrentes de acidentes de trânsito por uso de álcool entre 2010 e 2021. Segundo dados do Cisa (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool), a taxa de óbitos nesse período passou de sete a cada 100 mil habitantes para cinco. Embora a Lei Seca tenha sido aprovada em 2008, o Cisa analisa dados a partir de 2010, quando a Organização Mundial de Saúde lançou a Estratégia Global para Reduzir o Uso Nocivo de Álcool.

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