Topo

Puxadas por evangélicos, candidaturas de religiosos crescem mais de 15%

Associação de Bolsonaro com evangélicos é uma das explicações para o aumento de candidaturas com nomes de religiosos - Jales Valquer/Framephoto/Framephoto/Estadão Conteúdo
Associação de Bolsonaro com evangélicos é uma das explicações para o aumento de candidaturas com nomes de religiosos Imagem: Jales Valquer/Framephoto/Framephoto/Estadão Conteúdo

Hygino Vasconcellos

Colaboração para o UOL, em Balneário Camboriú (SC)

17/08/2022 14h05

As candidaturas com nomes religiosos cresceram 15,8% neste ano em comparação com 2018. Os evangélicos foram a principal alavanca, com aumento de 17% nos nomes registrados.

O levantamento realizado pelo UOL considera os dados dos candidatos enviados ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até a última segunda-feira (15), prazo final para os registros. Para a análise, foram verificados os cargos informados e os nomes de urna com termos ligados à religião.

Ao todo, foram encontrados 658 candidatos nessa situação —ante 568 em 2018. O número pode ser ainda maior, já que nem todos mencionam a religião no nome de urna. A reportagem selecionou 20 palavras-chaves, como pastor(a), missionário(a), reverendo(a), bispo(a), irmão(ã), frei/freira, padre, capelão, pai de santo/mãe de santo.

A maior parte dos 658 religiosos das eleições deste ano vai concorrer ao cargo de deputado estadual: 399 (60,6%). Na sequência, estão os postulantes a deputado federal: 221 (33,5%).

Há ainda sete que vão disputar o cargo de senador, dois a vice-governador, um a vice-presidente e 13 a deputado distrital. Outros 14 aparecem como 1º e 2º suplentes. O cadastro é de responsabilidade dos partidos.

Também é possível verificar as candidaturas de religiosos no campo "ocupação". Porém, o número de registros por lá é menor. Neste ano, o campo "sacerdote ou membro de ordem ou seita religiosa" foi indicado por 112 candidatos —3,4% menor em relação a 2018, quando ficou em 116.

A reportagem optou por fazer o levantamento com base no nome de urna porque é dessa forma que a maioria dos religiosos se apresenta aos eleitores.

Candidatos evangélicos crescem; católicos têm queda

O número de evangélicos concorrendo a um cargo nas eleições deste ano cresceu 17% em comparação com 2018. De 524 passou para 614, o que equivale a 93,31% de todas as candidaturas com nomes religiosos.

Por outro lado, houve uma leva queda entre os católicos: de 20 para 19. Já entre os candidatos de religiões de matriz africana ocorreu um pequeno aumento. De 24 candidatos em 2018 passou para 25.

Evangélicos reivindicam a religião na política, diz cientista social

A cientista política e professora na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) Silvana Krause entende que o aumento de 15,84% nas candidaturas de religiosos "não é muito significativo", já que em 2018 o índice ficou em 11% —na comparação com 2014.

Porém, para a professora, impressiona o alto índice de candidatos evangélicos.

Isso é uma coisa muito impressionante e fala muito sobre essa onda que a gente tem percebido, da entrada da religião na política com viés específico. O catolicismo como religião tradicional, em um processo secular, separou bem o espaço da política e o espaço da religião. Porém, nos últimos anos, vem se intensificando no Brasil um novo perfil de neopentecostais, evangélicos que querem explicitamente participar das decisões políticas e reivindicam a religião na política. Isso é como se fosse uma regressão, no sentido de política ser separada da religião."
Silvana Krause, cientista política

A situação também reflete a associação de Jair Bolsonaro (PL) aos evangélicos, considerado um de seus públicos-alvos desde as eleições de 2018, lembra Krause. Porém, a cientista política reforça que é preciso cuidado com as generalizações, já que nem todo evangélico é adepto às pautas conservadoras e progressistas —a exemplo de Benedita da Silva (PT) e Marina Silva (Rede).

"O eleitorado evangélico é muito heterogêneo. Está tudo indicando que o desafio de Lula nesta campanha é desinstrumentalizar essa onda de captação de evangélicos do ponto de vista de Bolsonaro, que está demonstrando que tem mais potencial de sensibilizar esse eleitorado."

Segundo a cientista política, a intenção deste ano da "bancada da Bíblia" é atingir os 30% de representação no Congresso nacional. Hoje fica em torno de 22%.

Krause afirma que as igrejas evangélicas ganharam espaço na política pela própria desconfiança das pessoas. "O eleitor não confia nos partidos. No entanto, ele confia muito na igreja, ou seja, o que me parece é que essas igrejas estão ocupando espaços dos partidos."

Para ela, o baixo número de candidatos de religiões de matriz afrodescendente está relacionado à própria dificuldade de mais negros participarem da política.

"As religiões de matriz africana não se propõem em participar do sistema político. Já a religião neopentecostal está aí para salvar o mundo, lutar contra o demônio, entre outras coisas. As religiões africanas não desenvolvem muito essa noção, um projeto maior, coletivo, do Brasil, não são agregadas. Não têm um pêndulo enorme como nas igrejas evangélicas."